segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

‘Deslogando’ do prefeito Cesar Maia


Encerrando um ciclo de 16 anos à frente dos assuntos do município, Cesar Maia passa à memória política dos cariocas como um prefeito diferente. É aquele que foi, sem quase ter sido. Cesar foi o alcaide que preparou a cidade para os jogos Pan- Americanos, mas a deixou à mercê do Aedes aegypti. Também foi o dirigente de dezenas de medidas de alto impacto e realização duvidosa, como o anúncio da licitação de mais de 400 linhas de ônibus, porém também elegeu a invisibilidade digital como um escudo contra as críticas à demora e ao oportunismo de lançar-se em tal aventura quando sua candidata à sucessão nadava de braçadas rumo à derrota nas eleições de outubro. Quem acompanhou a administração nesse longo período percebeu claramente que o município não teve dificuldades econômicas na mesma proporção de outros, só que não entende como se pode deixar de aplicar verbas carimbadas que melhorariam o Índice de Desenvolvimento Humano. Levantamentos do Jornal do Brasil mostram que a prefeitura deixou de aproveitar em torno de R$ 1,7 bilhão em repasses da União. O Cesar digital, que respondia a todos os e-mails que lhe eram endereçados, não foi capaz de transformar esse dinheiro em hospitais melhores, ou mais bem administrados.

Uma cientista política de renome definiu o atual alcaide como um personagem que sonhava em ter uma dimensão nacional e se viu confinado ao papel de síndico de um prédio no qual os condôminos gostariam de um sopro de renovação mas dariam mais um crédito de confiança a um administrador competente. Pode ser, a psiquê reage de formas impensáveis de indivíduo para indivíduo; o desencanto com a falta de caminhos ascendentes para enriquecer a biografia refletiu-se no recolhimento à segurança da introspecção virtual. E o gerente eficiente desistiu de sua principal característica.

Para muita gente, o melhor legado de um bom administrador público é a boa aplicação dos impostos tanto locais quanto estaduais e federais. Pereira Passos, por exemplo, entrou para a história por ter sido o alcaide que transformou o Centro do Rio em um ambiente urbanisticamente melhorado, mudando a própria noção de cidadania no início do século 20. Cesar teve lá seus arroubos, criando e implantando programas como o Rio Cidade – o do Leblon, hoje desgastado, chegou a receber prêmios de arquitetura. Mas esqueceu-se de que a reforma não deve se concentrar apenas na sala de estar. Escolas, postos de saúde e hospitais deveriam ter recebido maior atenção do gestor.

Não tiveram, e por uma razão que o emocional explica. Todo político quer deixar sua marca. Cesar sonhou com um museu Guggenheim no Cais do Porto. O projeto, ousado, desprezou o talento dos criadores locais em nome de uma grife capaz de atrair milhares de turistas. Bloqueado pela fragilidade da sustentação técnica da proposta, voltou-se para um devaneio ainda maior, a Cidade da Música. Obra faraônica até para os padrões de municípios mais ricos, o gigantesco conjunto de salas de espetáculos ocupou a fórceps uma área de lazer subaproveitada na Barra da Tijuca. Fato consumado, estabelece a forma como Maia quer ser lembrado. Infelizmente. Ao cidadão que desejava melhor destino para seus impostos, resta apenas usar a mesma simbologia que marcou toda a parte final do mandato: é hora de "deslogar-se" desse conjunto de expectativas jamais concretizadas. E torcer por síndicos mais responsáveis.Jornal do Brasil

''Nós estamos superando o assistencialismo''


Patrus Ananias: Ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; ministro rejeita tese de que o Bolsa-Família tem caráter eleitoreiro, mas reconhece que programa pode render votos
O ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, reconhece que programas como o Bolsa-Família, que atende a 11 milhões de famílias e distribui cerca de R$ 11 bilhões por ano aos beneficiários, tem influência no resultado das eleições. "Bons programas rendem bons votos", diz o ministro. Ao mesmo tempo, porém, ele rechaça as insinuações feitas por partidos de oposição de que o programa tem caráter eleitoreiro.


Quem entra ou sai do programa, ressalta Patrus, o faz com base em critérios objetivos e transparentes, livres de qualquer interferência de natureza político-eleitoral. E o Ministério Público, diz ele, fiscaliza não apenas o Bolsa-Família, mas todos os programas sociais do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O ministro argumenta que, se antes o País enfrentava o coronelismo, agora o Estado concede um benefício "para as pessoas para que elas votem em quem e como quiserem". E assegura que nunca o governo fez nenhum contato político ou encaminhou uma única carta a qualquer dos beneficiários do programa.

O petista garantiu que a crise financeira internacional não vai prejudicar os investimentos do governo no Bolsa-Família. Mais do que isso, ele diz ver no programa uma ferramenta para enfrentar e superar essa turbulência, por contribuir para a formação de um "mercado interno de consumo forte".

Patrus revela ainda que, no País, persiste uma situação que contraria o conceito de cidadania, que é a da existência de 4 milhões a 5 milhões de pessoas que não têm a certidão de registro civil, o que significa dizer que legalmente não existem. "Essas pessoas não estão contabilizadas, não existem oficialmente", afirma o ministro.

Por não possuírem documento, elas não podem participar do Bolsa-Família. O governo sairá atrás delas.

Os partidos de oposição dizem que o Bolsa-Família reelegeu o presidente Lula, deu força à base, nas eleições de outubro, e certamente fortalecerá o candidato governista na eleição presidencial de 2010. O Bolsa-Família é eleitoreiro?

Claro que um governo que cumpre compromissos, que demonstra seriedade, competência, que melhora a vida dos pobres e, ao mesmo tempo, estimula, como fazemos, as atividades empresariais, tende a ter um reconhecimento da população mesmo. Vamos ser claros quanto a isso.

Então o senhor admite que o Bolsa-Família rende votos?

Qualquer coisa que você faça tem repercussão. Faz parte do processo democrático. Bons governos tendem a ser bem avaliados, receber bons votos. Mas não tem nada de eleitoreiro. A rede de proteção e de promoção social, a assistência social, a segurança alimentar e nutricional, a transferência de renda e a política de geração de trabalho e de renda e qualificação profissional colocam-se no campo das políticas públicas dos direitos. Estamos superando no Brasil o assistencialismo, o clientelismo, os pobres de cada um, o quem indica. Isso sim, é eleitoreiro. A imprensa divulgou logo depois das eleições que o Bolsa-Família não influenciou em nada na eleição de quem quer que seja. É um fato. As pessoas não entram nem saem do programa porque apóiam o governo. Elas entram e saem do programa segundo critérios juridicamente normatizados, objetivos, transparentes. Temos parceria com o Ministério Público para que a fiscalização ocorra em todos os municípios brasileiros em relação aos nossos programas, principalmente o Bolsa-Família. Há ações da Controladoria Geral da União e dos tribunais, trabalhamos com as prefeituras e governos estaduais, de todos os partidos. Nós estamos é avançando em relação à tradição no Brasil que conhecemos bem, que é a do voto de cabresto, do coronelismo, da troca de favores. Agora não, é o Estado dando benefício para as pessoas para que elas votem em quem e como quiserem. Nós nunca mandamos uma carta para um beneficiário do Bolsa-Família e nunca fizemos qualquer tipo de contato político. Os contatos são absolutamente legais com relação aos direitos e deveres do programa.

A crise econômica global pode afetar o Bolsa-Família?

Não. A rede de proteção e promoção social que estamos implantando no Brasil é importante para enfrentarmos e superarmos a crise. Porque, através dela, nós estamos ampliando no Brasil um mercado interno de consumo forte. Por intermédio de programas como o Bolsa-Família e outros é possível injetar recursos nas classes mais pobres, para pessoas que nunca compraram, ou compraram muito pouco. Elas estão consumindo bem em serviços básicos e, com isso, estimulando muito as economias locais, regionais, o comércio local, pequenas indústrias, arranjos produtivos locais, gerando empregos. Chama a atenção o fato de que acabaram as vendinhas do interior, elas foram substituídas por pequenos supermercados de periferia. As pessoas estão comprando mais material escolar, medicamentos, melhorando suas casas, condições de vida, comprando bens básicos, fogões, geladeiras, instrumentos necessários para garantir a segurança alimentar e nutricional. Nesse sentido, a rede de proteção social, além de suas dimensões éticas e humanas, que pressupõem o direito à alimentação com regularidade, tem também um efeito econômico e prático, que garante a sustentabilidade e o crescimento econômico do País.

Quantas pessoas são hoje atendidas pelo Bolsa-Família? E quanto é pago?

Atendemos em torno de 11 milhões de famílias. Ao todo, com todos os programas, 60 milhões de pessoas. Mensalmente, são R$ 915 milhões; anualmente, R$ 11 bilhões.

O Bolsa-Família já está universalizado?

Em linhas gerais, sim. Mas temos ainda algumas margens. Hoje temos um problema sério, que é o número significativo de pessoas que não têm registro civil. Elas não existem civilmente. Portanto, não recebem benefícios a que teriam direito.

Quantos são?

Alguns falam em 4 milhões, 5 milhões de pessoas. É um cálculo aproximado. Estas pessoas não estão contabilizadas. Não existem oficialmente.

E como será resolvida a situação dessas pessoas?

Estamos trabalhando com a Secretaria dos Direitos Humanos para levar o registro a todas as pessoas. É uma ação integrada, com a participação dos ministérios da Justiça, da Saúde, da Educação, da Defesa, porque estamos envolvendo o Exército, para ver se a gente consegue descobrir onde estão e quem são essas pessoas que ainda vivem nessa situação. Além disso, há pessoas que têm todos os documentos, mas o acesso a elas é difícil. Na Amazônia, por exemplo.

Há críticas quanto ao fato de o Bolsa-Família não ter uma proposta clara para que os beneficiários possam melhorar a renda e sair do programa.

Uma de nossas prioridades é a política de geração de emprego e renda. Fazer com que as pessoas que estamos atendendo, às vezes comunidades inteiras, como os quilombolas, possam ir ganhando gradativamente a sua autonomia.

E o que tem sido feito?

Estamos trabalhando em conjunto com a Câmara Brasileira da Construção Civil para capacitar 185 mil beneficiários do Bolsa-Família para as oportunidades que estão sendo geradas pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Vão trabalhar nas capitais, nas regiões metropolitanas. Hoje, com nosso cadastro único, temos o mapeamento da pobreza no Brasil. Atualizamos constantemente esse cadastro. Estamos desenvolvendo, no cadastro, as características das famílias, como escolaridade, condições de moradia, o maior número possível de dados. Isso nos possibilita identificar, pelo cadastro, quais as pessoas que, acionadas, podem aproveitar o mais rapidamente possível as oportunidades que estão surgindo com o PAC. Também vamos fazer convênios com grandes empresas para capacitar pessoas. Já temos convênio com a Norberto Odebrecht para capacitar famílias que vão trabalhar na hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira, em Rondônia. Ela vai custear a capacitação. E não vai exigir que as pessoas sejam vinculadas à empresa. Capacitará pessoas que possam eventualmente trabalhar em outras empresas também. Também trabalhamos para a formação de micro e pequenos empreendedores, integração das pessoas com as atividades vinculadas às cadeias produtivas locais e regionais.


Quem é:
Patrus Ananias

Professor de Direito, mestre em Direito Processual pela PUC-MG e doutorando em Filosofia pela Universidade Complutense
de Madrid

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Lula vai discutir crise com estados


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá realizar no início de janeiro uma reunião com alguns governadores para discutir medidas coordenadas entre governo federal e governos estaduais para enfrentar os sinais mais evidentes da crise sobre a economia real no Brasil. É o que informou na última terça feira o governador mineiro Aécio Neves, durante o evento que reuniu os presidentes do Brasil e França, Nicolas Sarkosy, no Rio de Janeiro.


"O presidente da República me disse agora pouco que pretende conversar já em janeiro com um grupo de 4 a 6 governadores de estados talvez das economias que estejam sentindo mais os impactos da crise para examinarmos algumas medidas conjuntas", afirmou Aécio Neves. Ele destacou que as medidas incluiriam questões do âmbito fiscal, envolvendo tanto as esferas federal como estaduais.

"O presidente conversou comigo, com certeza com o governador Sérgio Cabral e, acredito, com os governadores dos estados que tenham maior participação no PIB brasileiro", informou o governador, acrescentando que o convite poderá se estender, num segundo momento, a todos os governadores. Para ele, a iniciativa é positiva. "Nós queremos conjugar os esforços", afirmou.

De acordo com o dirigente mineiro, Lula estaria preocupado com setores específicos, como o comércio de carros usados, onde o crédito teria "desaparecido". Na reunião com os governadores, seria possível examinar medidas que possam ser tomadas no campo fiscal conjuntamente por estados e pelo governo federal.

Segundo Aécio, Minas foi o primeiro estado a tomar medidas de alongamento de pagamento de ICMS e aberto linhas de crédito para os setores mais atingidos pela crise que agora atinge a economia real, principalmente os ligados à cadeia do setor siderúrgico. "Quando o setor mineral sofre, a siderurgia e o setor automotivo também sofrem", exemplificou. A situação do estado, que concentra boa parte das demissões anunciadas recentemente pela Vale, foi agravada, ainda, pelas recentes chuvas. "Estamos analisando algumas medidas que eu pretendo formatar – e que vou anunciar nesta quarta-feira – que possam dar um pouco de alívio a 43 municípios do estado que estão hoje em situação de emergência", comprometeu-se o governador de Minas Gerais.

Aécio contou que o presidente Lula a se prontificar a ajudar Minas Gerais. "Nesse primeiro momento, (a ajuda) não será necessária", afirmou. "Mas, se for o caso, nós acionaremos o governo federal", disse.

Brasil ganha espaço na estratégia da EADS


Após assinar o contrato do pedido de 50 helicópteros feito pelo governo brasileiro, a francesa EADS, controladora da Eurocopter e da Airbus, tem planos de voar mais alto a partir do Brasil. Segundo o presidente da companhia, Louis Gallois, a estrutura vai crescer no país, o que vai abrir espaço para novos projetos e contratos. "Temos um cliente muito importante da Airbus no Brasil, que é a TAM e agora um contrato grande com o governo na Eurocopter, o país é um dos cinco prioritários no mundo para nós atualmente", disse Gallois. "A idéia é que possamos, com essa nova estrutura, fazer mais coisas a partir do Brasil

Gallois, que esteve no país para selar os entendimentos da Eurocopter com o Ministério da Defesa, explicou que o projeto dá uma nova dimensão à operação local. "Com essa base no Brasil, teremos facilidade de buscar mais mercado na América Latina", disse Gallois A parceria para a construção dos helicópteros faz parte de um pacote de acordos entre Brasil e França referendados pelos presidentes dos dois países, Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolas Sarkozy, no início da semana.


A Eurocopter, braço de fabricação de helicópteros da holding, está no Brasil há 30 anos por meio de uma participação de 45% no capital da Helibrás, que tem uma unidade industrial em Itajubá (MG). Com a encomenda de 50 unidades do modelo EC725 feita pelo governo, que vai envolver um montante total de ? 1,9 bilhões em 20 anos, a Helibrás vai ganhar uma musculatura maior. Só o investimento direto da EADS na empreitada é de US$ 300 milhões.


De acordo com Marson Ferreira, diretor-geral da empresa no Brasil, dos 270 funcionários atuais, deve haver um salto para 800 num prazo de quatro anos e a probabilidade é que se chegue a mil funcionários quando o projeto estiver atingindo a maturidade. Além disso, há muitos empregos indiretos envolvidos, já que uma rede de parceiros será montada, pois a expectativa é contratar diferentes fornecedores locais para cada componente. Muitos desses contratados devem ser empresas que fazem parte da rede de fornecedores da Embraer.


"A partir desse crescimento, vamos poder nos mobilizar para ganhar mais mercado na região. Mas não é só na parte de helicópteros que queremos crescer no Brasil, e sim em todas as que atuamos, como defesa e espacial", disse Gallois.


A idéia da EADS é crescer no país em todos os nichos em que atua. "Sabemos que o Brasil planeja construir uma indústria da defesa local e já manifestamos ao ministro nosso desejo de nos tornarmos parceiros nisso", disse Gallois. A operação com os helicópteros pôde ser concretizada, entre outros motivos, porque a companhia francesa foi uma das que aceitou a condição de fazer a construção dos modelos dentro do país, com a chamada transferência de tecnologia.


O presidente da EADS diz que uma das coisas que torna mais viável a produção local é a existência da Embraer, que formou toda uma rede de profissionais e fornecedores locais que será útil ao projeto. Gallois diz que acompanha a Embraer há 20 anos e que manteve, nos últimos meses, algumas conversas com os executivos da companhia, com o intuito de tentar formar futuras parcerias. "A Embraer é realmente uma empresa impressionante e a vemos como uma potencial parceira em projetos locais e globais."


De acordo com o executivo, o Brasil, China e Índia estão entre os cinco ou seis países que representam grande prioridade para a empresa nos próximos anos. No plano estratégico de longo prazo da EADS, a expansão pelo mundo é um grande foco. "Ser uma empresa global é uma parte importante da nossa estratégia", diz. "Queremos imprimir nossas pegadas pelo mundo e claramente o Brasil é uma das principais áreas."

Investimento da União foi 44% maior até novembro



O ano de 2008 deverá fechar com um substancial aumento dos investimentos federais no âmbito do orçamento fiscal e da seguridade social (exclui empresas estatais não-dependentes do Tesouro Nacional), sob o ponto de vista dos valores efetivamente pagos. Por esse critério, só até fim de novembro, os três poderes da União investiram R$ 22,9 bilhões, 44,5% a mais do que em igual período de 2007 (R$ 15,8 bilhões). Desse total, apenas R$ 7,07 bilhões foram gastos com base no orçamento do próprio ano. A maior parte, por coincidência também de R$ 15,8 bilhões, foi consequência da execução de restos a pagar de despesas autorizadas no orçamento de 2007.

Obras contratadas pelo setor público só podem ser pagas na medida em que as etapas previstas ficam prontas, lembra o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. É por isso que, no caso dos investimentos, a ocorrência dos chamados restos a pagar é mais comum do que em outros tipos de gasto. Desde que o respectivo empenho (bloqueio do recurso sob o ponto de vista contábil) ocorra dentro do próprio ano, a legislação permite que o pagamento seja feito em ano posterior.


Entre os orgãos federais do Poder Executivo, o Ministério dos Transportes foi o que mais investiu de janeiro a novembro de 2008. Somando a execução de empenhos do ano e de restos a pagar de anos anteriores, o ministério gastou, nos onze meses, R$ 5,02 bilhões, cerca de 17% a mais do que em igual período de 2007. Também fizeram investimentos de valor expressivo os ministérios das Cidades, da Integração Nacional, da Defesa, da Saúde e da Educação.


Mesmo com forte elevação dos gastos com investimento, o governo federal deverá fechar o ano com excesso de superávit fiscal primário (exclui receitas e despesas financeiras, a exemplo dos juros da dívida pública) em relação ao mínimo exigido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias da União (LDO) - R$ 63,4 bilhões no acumulado de janeiro a dezembro. Até novembro o valor estava em R$ 91,5 bilhões.


Um parcela desse superávit será consumida antes do próximo dia 31, com a transferência de R$ 14,2 bilhões ao Fundo Soberano do Brasil (FSB), cuja lei foi sancionada anteontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além disso, como acontece todos os anos nessa época, em dezembro, o governo federal deverá registrar déficit e não superávit primário. Ainda assim, a expectativa é de que a meta da LDO seja cumprida com folga.


Diferente do que ocorreu em igual mês de 2007, quando houve superávit de R$ 4,5 bilhões, em novembro passado, o resultado fiscal primário do governo central já foi deficitário, em R$ 4,3 bilhões. Comparativamente a outubro, mês em que também houve superávit (R$ 14,86 bilhões), as receitas da Previdência Social ficaram estáveis, mas as do Tesouro Nacional caíram R$ 10,1 bilhões.


Na comparação dos valores acumulados em 2007 e 2008 até novembro, a evolução das receitas foi positiva e mais forte do que a das despesas. Enquanto os gastos subiram 11,62%, as receitas cresceram 17,32%. Considerada só a receita que fica com o governo central (parte é transferida a Estados e municípios), a alta foi de 15,5%.


O gasto primário como um todo subiu bem menos do que subiu a parcela relativa aos investimentos (44,5%), mesmo com as concessões de reajuste salarial ao funcionalismo público, cujos impactos serão mais evidentes a partir de 2009. Em 2008, a despesa com pessoal cresceu 11,48%. (Valor Econômico)

Estados estão com o caixa cheio


Com as receitas prejudicadas pela crise apenas nos dois últimos meses, os principais Estados encerram 2008 com superávits primários elevados, mantendo planos de investimentos altos para 2009.

A perspectiva de manutenção dos investimentos também é ajudada pelos recursos de terceiros, especialmente via financiamentos novos, caso de Minas Gerais, que receberá no próximo ano boa parte do financiamento de US$ 1 bilhão liberado em 2008. Em São Paulo também está programado aumento de investimentos de R$ 12,12 bilhões em 2008 para R$ 18,5 bilhões em 2009. Parte dos R$ 6,7 bilhões adicionais estão assegurados com base em financiamentos cujos recursos entrarão efetivamente em 2009. No Rio Grande do Sul, um empréstimo de US$ 1,1 bilhão firmado em setembro com o Banco Mundial permitiu um pagamento extraordinário da dívida estadual, o que aliviou as contas e permite manter planos de investimento para 2009.


Outra ajuda para os investimentos virá das estatais da administração indireta. É o caso de Minas Gerais, onde as estatais (como Cemig, de energia, e Copasa, de água) deverão participar com R$ 5 bilhões, metade do programado para 2009, segundo Simão Cirineu, secretário da Fazenda. Deste total, US$ 1 bilhão virá do Bird. Em São Paulo, projetos em conjunto com a iniciativa privada também garantem injeção extra de recursos. O governo paulista conta com cerca de R$ 3,3 bilhões adicionais relativos a outorgas de concessões.


Os investimentos privados também devem fazer diferença em Pernambuco, onde o governo mantém expectativa de crescimento de receita e permanecem de pé projetos de infra-estrutura. Para o orçamento do próximo ano, está previsto um investimento de R$ 1,9 bilhão, de acordo com a Secretaria de Planejamento, quase o dobro do realizado neste ano. A maior parte dos recursos - R$ 1,6 bilhão - vai para a infra-estrutura da região do porto de Suape. A área está recebendo diversos projetos privados de grande porte, como a refinaria Abreu e Lima, da Petrobras, e o estaleiro Atlântico Sul, que tem entre seus sócios a Camargo Corrêa e a Queiroz Galvão.


A Sadia e a Perdigão também estão investindo em fábricas no Estado. "Talvez Pernambuco esteja em uma posição privilegiada em relação a outros Estados", diz o secretário de Fazenda, Djalma Leão. Pernambuco deve encerrar 2008 com um superávit primário de R$ 610 milhões - cerca de 10% inferior ao registrado em 2007. A redução, segundo Leão, deve-se ao maior volume de investimentos em 2008. O montante deve atingir R$ 1 bilhão, ante R$ 700 milhões em 2007.


No Rio de Janeiro e no Paraná, há planos específicos para o superávit de 2008. O secretário de Fazenda do Rio, Joaquim Levy, estima fechar o ano com o superávit primário próximo a R$ 4 bilhões e diz que a economia será destinada ao Rio Previdência, fundo de pensão dos servidores alimentado, por lei, pelos recursos do royalties do petróleo. "Precisamos substituir porque os royalties vão cair", diz. A estimativa é de redução de cerca de 20% no volume de recursos de royalties e participações especiais sobre os R$ 6,5 bilhões inicialmente previstos para 2008. No Paraná, além dos investimentos, o superávit primário deverá ser usado para abater a dívida com a União.


Amir Khair, especialista em contas públicas, explica que boa parte dos recursos dos Estados para 2009 se sustentam no bom desempenho da economia nos últimos anos Com isso, diz, vários Estados se enquadraram no limite de endividamento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e conseguiram recursos extras por meio de financiamentos novos.


"Há também as estatais que tiveram bons resultados até 2008 e que estão com fôlego para investir. Elas deverão fazer diferença em 2009." Em São Paulo, lembra, a venda de ativos como a Nossa Caixa e os leilões deverão trazer receitas extras ao Estado. São Paulo não divulgou projeções de receita para 2008. Pelos dados do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), até outubro o Estado recolheu R$ 63,13 bilhões - 22% de alta sobre 2007, em termos nominais.


O Rio Grande do Sul é um dos Estados no qual o acerto das contas deverá fazer diferença. Em 2008 o Estado ficou pela primeira vez no limite de endividamento previsto pela LRF. O superávit primário gaúcho deve chegar a R$ 1,9 bilhão em 2008, bem acima dos R$ 954 milhões do ano passado.


De acordo com o secretário da Fazenda gaúcha, Aod Cunha de Moraes Jr., mesmo que a crise seja mais profunda 2009, com crescimento de Produto Interno Bruto (PIB) abaixo de 2,5%, ainda será possível manter integralmente os investimentos. "Fizemos uma projeção modesta de crescimento do ICMS para 2009, de apenas 6% (nominais", disse. O programa gaúcho de investimentos alcança R$ 1,25 bilhão, ante os R$ 450 milhões deste ano. Entre os planos principais estão obras em estradas (R$ 306 milhões), reforma e construção de presídios (R$ 118 milhões), saneamento (R$ 75 milhões) e ampliação de escolas (R$ 41 milhões).


Minas Gerais deve encerrar 2008 com receita de ICMS em torno de R$ 22,5 bilhões, aumento de 18,6% nominais em relação ao ano passado. Em Minas Gerais, o superávit primário deve fechar o ano em R$ 1,7 bilhão, praticamente o mesmo do ano passado. Para 2009 a previsão da arrecadação de ICMS é de um total de R$ 23 bilhões, crescimento de 5,5%, "adaptado à crise", diz o secretário Cirineu Simão. Mesmo com previsão menor de receitas, ele considera assegurados os investimentos totais de R$ 11 bilhões. Em 2008, eles devem somar entre R$ 4,5 e R$ 5 bilhões.


No Rio de Janeiro o orçamento para 2009, de R$ 46,7 bilhões, é 17% superior ao de 2008, mas pode sofrer cortes. A previsão é de que a freada estimada no PIB trará efeitos negativos não só sobre a arrecadação do ICMS. A queda da cotação do barril de petróleo deve causar retração de R$ 1 bilhão a R$ 1,3 bilhão nos recursos referentes a royalties e participações especiais.


No Paraná, que até novembro registrava superávit de R$ 1,9 bilhão, a economia servirá para abater a dívida com a União, além dos investimentos. O recurso deverá "ajudar a amortizar os efeitos da crise", diz o secretário do Planejamento, Ênio Verri. O orçamento de 2009 prevê receitas de R$ 23,6 bilhões - R$ 3,7 bilhões a mais do que em 2008. Verri explicou que esse valor não conta com ajustes por conta da crise.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

No apagar das luzes os ratos fizeram a festa


Projeto que aumenta vagas de vereadores abre crise no Legislativo e vai para o Supremo

Chinaglia anuncia que Casa não promulgará emenda que aumenta número de vereadores

Em meio à crise econômica, o Senado aprovou ontem de madrugada, a toque de caixa, um pacote de projetos que implica aumento de gastos para o país. Entre eles, o mais grave é a polêmica proposta de emenda constitucional que recria 7.343 vagas de vereadores. A PEC só não foi promulgada ontem mesmo porque a Câmara se rebelou contra os senadores, por causa da retirada de um artigo que reduzia os gastos das câmaras municipais. A decisão abriu uma crise entre os presidentes do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), e da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). Garibaldi anunciou que recorrerá hoje ao Supremo Tribunal Federal (STF), com um mandado de segurança contra a Câmara. O Senado também aprovou a criação de uma nova estrutura para administrar os museus brasileiros, com mais 800 cargos públicos, e a criação de aposentadoria especial para o extrativista vegetal. Foram autorizados empréstimos externos para estados e municípios.

O Congresso Nacional encerra o ano com uma guerra aberta entre os presidentes do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), e da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), por causa da polêmica proposta de emenda constitucional que recria 7.343 vagas de vereadores em todo o país. Na madrugada de ontem, os senadores aprovaram a emenda desfigurando o texto aprovado pelos deputados, ao retirar o artigo que tratava da redução de gastos das câmaras municipais. Chinaglia anunciou que a Câmara não promulgaria a emenda. Em reação, Garibaldi disse que recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF), com um mandado de segurança, questionando a decisão.

Além dessa emenda, o Senado votou, em mais de 15 horas de sessão, outras 31 propostas, sendo que algumas delas acarretam aumento de gastos. Como o projeto sobre uma nova estrutura para administrar os museus brasileiros, com a abertura de quase 800 cargos públicos e impacto de R$22 milhões no Orçamento de 2009. Na lista de votações estão a criação do Fundo Soberano, a emenda que regulamenta a criação de 57 municípios ameaçados de extinção, medidas provisórias anticrise, recursos para Santa Catarina, leis de regulamentação da pesca, de museus, aposentadoria especial para extrativistas vegetais, e autorização de empréstimos externos para municípios e estados.

Inconformado com a mudança na emenda dos vereadores e pressionado pelos deputados, Chinaglia, sem comunicação prévia a Garibaldi, alegou que a alteração obrigava a uma nova votação na Câmara e se negou a promulgar o texto. O presidente do Senado se sentiu atropelado e, também pressionado pelos colegas e pelos vereadores que permaneceram em Brasília, partiu para o contra-ataque.

Ontem, ao fim de uma sessão em que senadores se revezaram para atacar Chinaglia, chamado de déspota e tresloucado, Garibaldi justificou:

- Tomei essa decisão levando em consideração os precedentes do próprio STF e deste Congresso por ocasião das reformas do Judiciário e da Previdência. Considerar que a Mesa de qualquer das Casas possa se recusar a promulgar emenda constitucional validamente aprovada é conceder um verdadeiro poder de veto não previsto constitucionalmente.

- Divergências podem existir, o que não pode é o confronto, a falta de diálogo - lamentou Garibaldi, alegando que a mudança de um artigo não era motivo para não promulgar.

"Todos são cientes dos seus papéis"

A decisão unânime da Mesa da Câmara de enfrentar o Senado veio logo cedo. Mas Chinaglia, embora Garibaldi diga que tenha mandado procurá-lo para um entendimento, não foi conversar. Chinaglia nega que tenha sido procurado e disse que "todos são cientes de seus papéis":

- Houve primeiro a decisão política de preservar a decisão do plenário da Câmara. E também houve uma questão auxiliar que foi a questão jurídica, levantada pela assessoria, de que não havia segurança de que aquilo (fatiamento da emenda) poderia ser feito - afirmou.

O ato de promulgação de uma emenda constitucional deve passar pelas Mesas da Câmara e do Senado. Chinaglia questionou as expectativas dos suplentes de vereador e de parte dos senadores de, confirmada a promulgação, os novos legisladores assumirem já em fevereiro, junto com os eleitos nas vagas originais.

- Não acredito que a população aceitaria de bom grado a decisão de colocar mais gente do que estava previsto - alfinetou Chinaglia. - Não houve veto à decisão do Senado. Mas a decisão do Senado não foi a da Câmara.

Mercadante e Suplicy encaminham contra. E votam a favor


Mercadante e Suplicy atacam proposta, mas mudam na votação

Ao microfone, os senadores Aloizio Mercadante e Eduardo Suplicy, ambos do PT de São Paulo, protestaram contra a criação das vagas de vereadores, sem redução de despesas. Mas, depois, votaram a favor da medida.

Com apoio quase unânime de governistas e da oposição, o Senado confirmou na madrugada de ontem, com larga margem de votos, a recriação de 7.343 vagas de vereadores para mais de 2 mil municípios brasileiros. A líder do PT, Ideli Salvatti (SC), foi a única que não encaminhou explicitamente pela aprovação da emenda, mas acabou votando a favor. Comportamento repetido pelos petistas Aloizio Mercadante (SP) e Eduardo Suplicy (SP), que protestaram contra a retirada do artigo que reduzia os orçamentos das câmaras de vereadores, mas também votaram a favor, alegando que agiram diante da promessa de que o corte de despesas seria votado em fevereiro. A sessão ficou tensa quando Mercadante foi à tribuna e pediu o adiamento da votação, até que se pudesse votar simultaneamente a proposta que limitava os gastos:

- Como vamos aumentar a despesa no Legislativo em momento de corte orçamentário, de corte de despesa e de capacidade de arrecadação do Estado? Não vejo como. Não acho que esse é o bom caminho nem para o Senado nem para os vereadores que estão aqui e para aqueles que disputaram a eleição. O Senado tem que resolver essa questão hoje.

Mercadante discursava quando houve um burburinho no plenário e entre os suplentes de vereador que estavam nas galerias. Ele reagiu:

- E vão ter que me ouvir em silêncio e com respeito! Se vocês (suplentes) não voltarem para a câmara de vereadores com legitimidade, apoio e respeito da opinião pública, não será bom para vocês, para o Senado, para os municípios nem para a democracia. Então, me escutem, porque amanhã os jornais e as emissoras de televisão dirão muito mais do que eu estou dizendo neste momento, contra vocês e contra esta Casa.

O relator da proposta, senador Cesar Borges (PR-BA), rebateu:

- Não vejo a mesma indignação com os gastos do Congresso, que são justos. Mas a democracia é cara, é o preço da liberdade.

Mercadante aceitou votar a favor com a promessa de que a proposta para cortar gastos seria um dos primeiros itens da pauta de fevereiro.

O texto de Borges permite que mais de 7 mil suplentes que não foram eleitos em outubro passado possam assumir como titulares em fevereiro, junto com os eleitos. Esses suplentes já queriam tomar posse em fevereiro, mas o TSE já se posicionou sobre a impossibilidade da retroatividade para a posse e diz que só valeria para a eleição de 2012.

Com galerias lotadas de suplentes, votações tiveram rito sumário

Com o plenário lotado de suplentes de vereadores, numa sessão-relâmpago e em rito sumário, com um acordo de líderes para pular os prazos regimentais de oito sessões entre o primeiro e o segundo turnos, os senadores aprovaram, perto das duas horas da madrugada de ontem, a polêmica emenda constitucional. Para liquidar a votação do primeiro e do segundo turnos no mesmo dia, e cumprir a exigência de oito sessões, o presidente Garibaldi Alves (PMDB-RN) abria e encerrava as sessões.

O placar do primeiro turno de votação da proposta de emenda constitucional foi de 54 votos sim, 5 não e uma abstenção, que depois foi mudada por Gilvam Borges (PMDB-AP) para sim. No segundo turno, foi ainda maior a vantagem: 58 sim e 5 não. Eram necessários 49 votos.

O relator retirou o parágrafo 2ª do texto aprovado na Câmara, que condicionava o aumento do número de vereadores à redução dos percentuais de repasse de recursos para as câmaras municipais. Com o aumento de 14,1% no número de vereadores, eles passam de 51.924 para 59.267 em todo país. Desde 2004, quando o TSE cortou 8 mil cargos, mesmo com os cortes, as câmaras tiveram os números de vereadores reduzidos, mas mantiveram o mesmo repasse de recursos feito pelas prefeituras.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Relator aumenta superávit de estatais


Duas mudanças acertadas com o governo - uma na noite de terça-feira, outra ontem - permitiram ao relator-geral do projeto de Orçamento da União para 2009, senador Delcídio Amaral (PT-MS), recompor cerca de R$ 4,12 bilhões em despesas primárias (não financeiras) que haviam sido cortadas para atendimento de gastos indicados por emendas parlamentares. Ambas foram tomadas depois de uma gritaria dos ministérios setoriais contra o pesado corte (de quase

R$ 9,7 bilhões) que recaiu sobre as dotações originais para custeio.

Ainda que não devolvam recursos integralmente ao mesmo conjunto de projetos e atividades atingidos pelo corte, as duas medidas são suficientes para neutralizar com folga a redução líquida de R$ 2,07 bilhões implícita na primeira versão do relatório de Delcídio sobre o volume de despesas primárias dos orgãos federais. Desconsideradas transferências obrigatórias por repartição de receita a Estados e municípios, o volume de gastos primários (exclui juros) poderão subir comparativamente ao projeto original do governo, pelo menos no âmbito fiscal e da seguridade social, parte do Orçamento que exclui estatais não dependentes do Tesouro.


As empresas estatais, por outro lado, terão que fazer um esforço maior para economizar em 2009, pois uma das medidas que viabilizaram a recomposição de gastos dos ministérios foi um aumento de R$ 1,578 bilhão na meta de superávit primário dessas empresas, para permitir mais despesas no orçamento da seguridade social, sem afetar o superávit da União. A recomposição também foi viabilizada por uma mensagem do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, ao Congresso, pedindo a inclusão de R$ 2,55 bilhões na previsão de receitas primárias do próximo ano. Na carta, o ministro explica que o montante refere-se ao que o governo espera arrecadar com a venda de imóveis da antiga Rede Ferroviária Federal, estatal em processo de extinção. Segundo ele, essa receita não constou no projeto original de 2009 porque a expectativa inicial era obtê-la ainda em 2008.


O envio da carta foi acertado em reunião entre Delcídio e Paulo Bernardo, na sede do Ministério do Planejamento, ontem. O próprio governo sugeriu a solução para contornar a inconformidade dos ministérios setoriais com o corte sobre dotações originais de custeio. Os ministérios da Ciência e Tecnologia e da Educação foram os que mais se mobilizaram para reverter a situação, pois haviam perdido, respectivamente,

R$ 1,27 bilhão e R$ 1,55 bilhão.


O aumento de superávit das estatais, por sua vez foi decidido depois que vice-líder do governo no Congresso, deputado Gilmar Machado (PT-MG) decidiu obstruir a votação de destaques ao texto base do relatório, àquela altura já aprovado. Para que o governo possa fazer um superávit menor e gastar mais, Delcídio decidiu, então, transferir para as estatais parte da meta de superávit primário inicialmente atribuída ao orçamento fiscal e da seguridade. Em vez de 2,2% do PIB, o superávit exigido do governo central caiu para 2,15% do PIB. Em contrapartida, , as estatais terão que fazer superávit de 0,7% em vez de 0,65% do PIB.


Só com essa medida, o relator conseguiu cerca de R$ 1,578 bilhão para colocar de novo em ações orçamentárias atingidas pelo corte, em especial o custeio da Previdência. Se, de um lado, tinham reforçado seus investimentos em R$ 83 milhões, as emendas parlamentares tinham tirado da Previdência R$ 1,8 bilhão em recursos para custeio.

Grupo Louis Dreyfus faz planos para elevar produção de etanol


A crise financeira global, que agravou a situação de algumas usinas de açúcar e álcool do país, abriu oportunidades para outras companhias mais capitalizadas do setor sucroalcooleiro. Neste seleto grupo está a francesa Louis Dreyfus Commodities (LDC), que prospecta investimentos para expandir seus tentáculos neste segmento nos próximos anos.

"O setor oferece agora um número grande de oportunidades. Estamos de olho", afirma Bruno Melcher, presidente do conselho da LDC Bioenergia ao jornal Valor Econômico.


Discreta, a companhia fez sua estréia no setor em 2000, com a compra da usina Cresciumal, de Leme (SP). Depois, adquiriu outras duas usinas, a São Carlos, instalada na cidade que leva o mesmo nome, e a Luciânia, em Lagoa da Prata (MG). No início do ano passado, comprou de uma só tacada os ativos do grupo Tavares de Melo, com cinco unidades produtoras, o que tornou a companhia uma das maiores do setor.


Para 2009/10, o grupo deverá expandir a moagem de cana em 30%, saindo dos 15 milhões de toneladas nesta atual safra para quase 20 milhões de toneladas, afirma Melcher. Essa expansão vai ocorrer com o aumento da capacidade das atuais oito usinas do grupo. "Temos avançado. No ano passado, inauguramos a unidade de Rio Brilhante (MS)", diz.


Com faturamento de US$ 3 bilhões no Brasil e US$ 27 bilhões no mundo (base 2007), a LD Commodities planeja investir até 2010 quase US$ 1 bilhão no país, dos quais uma boa parte será destinado ao setor sucroalcooleiro. Nos últimos quatro anos, o grupo fez aportes de US$ 1,125 bilhão no país para expandir seus negócios agrícolas.


No mercado, circulavam informações de que a Louis Dreyfus poderia se desfazer de seus ativos em açúcar e álcool. Melcher diz que a informação não faz o menor sentido e afirma que a Dreyfus está comprometida com o setor sucroalcooleiro.


A empresa francesa está entre as interessadas em fazer sociedade com o grupo Nova América, que está à procura de um parceiro para levar seus negócios adiante. Segundo Melcher, o grupo não descarta fazer parcerias para elevar os negócios no setor.


No ano passado, o grupo entrou com pedido para abertura de capital na bolsa, mas recuou no início deste ano por conta da situação adversa do mercado. "Ajustamos o timing." E quando o mercado der sinais de melhora o grupo vai retomar os seus planos de ir à Bovespa.


Com sede em São Paulo, a gigante também opera quatro fábricas processadoras de oleaginosas, três fábricas de suco de laranja, dois terminais portuários (Paranaguá e Santos), mais de 50 armazéns graneleiros, e administra de mais de 200 mil hectares de terras, entre pomares de laranja e canaviais.


Fundado em 1851, em Paris, na França, o grupo Louis Dreyfus iniciou suas atividades no comércio de grãos, comprando a produção de fazendeiros franceses para vender na Suíça. Dez anos depois, a empresa já tinha escritórios na França, Alemanha e Rússia e no final do século XIX, já havia iniciado as operações de trading.


No Brasil desde 1905, o grupo atuava apenas no comércio de algodão e trigo. Após adquirir a Comércio e Indústrias Brasileiras Coinbra S/A, em 1942, a companhia expandiu suas atividades também para o comércio de açúcar, produtos cítricos e café. Na década de 90, a empresa ampliou a produção agrícola da área de cítricos e de oleaginosas. No início dos anos 2000, fez sua estréia em açúcar e álcool.

Quem conspira contra o habeas corpus?


O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilberto Mendes, ao discursar na Câmara por ocasião dos 40 anos do malfadado Ato Institucional nº5, um instrumento de força que deu ao regime militar poder de vida e morte sobre os brasileiros, falou contra uma suposta articulação em favor da limitação do habeas corpus, garantia constitucional que o regime ditatorial jogou no lixo. "É fundamental que neste dia em que lembramos do AI-5, ressaltemos a necessidade de preservação do habeas corpus, não a sua limitação. O habeas corpus é a garantia dos direitos judiciais", disse o ministro. Em algum lugar da internet, é possível ler, junto com a "denúncia" de Mendes, a informação de que "no Congresso, parlamentares defenderam silenciosamente a limitação na concessão de habeas corpus depois que Mendes autorizou por duas vezes a libertação do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, durante a Operação Satiagraha".

Vai saber o que é uma "defesa silenciosa" - mas, no final das contas, a "denúncia" de Mendes sugere que se entenda, como se verdade fosse, que ele se insurge contra setores antidemocráticos do Congresso que querem limitar o habeas corpus. Não existe nenhum movimento para reduzir as prerrogativas do STF ou os direitos individuais. O que existe é um grande desconforto em relação às suas "denúncias", decisões, ataques indiscriminados a outros poderes ou mesmo a instâncias inferiores da Justiça e à forma de confrontar autoridades.


Mendes libertou duas vezes o empresário Daniel Dantas, preso por ordem expedida por um juiz de primeira instância, e não pelo poder discricionário de um "estado policial". Antes, com igual eficiência, havia libertado presos das operações Anaconda, Hurricane e Navalha. Soltou os cachorros contra a Polícia Federal e contra o juiz Fausto de Sanctis, da 6Vara Federal Criminal de São Paulo, responsáveis pela prisão de Dantas, em defesa do preso - desqualificou, portanto, o trabalho do juiz e da polícia. Ameaçou punir o juiz. Foi alvo de manifestos nacionais em favor de seu impeachment e de outros tantos protestos contra sua decisão. Daí, muitas decisões depois, todo o mal-estar causado por uma aversão explícita a operações da Polícia Federal que resultaram em prisão de gente mais ou menos graúda é transformado num complô contra o instituto do habeas corpus, e o presidente do Supremo se apresenta como se fosse o único defensor de prerrogativas constitucionais.


Para que não paire qualquer confusão, observe-se o seguinte: setores que se envolveram seriamente na luta pela conquista das liberdades democráticas se insurgiram, sim, contra decisões do ministro Gilmar Mendes, mas por mais que se procure em conversas e arquivos não existe registro de qualquer movimento para reduzir o instituto do habeas corpus, como "denunciou" o presidente do STF. A insurgência foi contra atos seus, não contra o instituto. Não existe uma conspiração contra a democracia. E Mendes está longe de ser o bastião das liberdades democráticas.


Aliás, preocupante é o anúncio do ministro, que também preside o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de que o órgão de controle do Judiciário estuda uma "resolução para fazer o acompanhamento de modo a ter uma retificação eventual dos fundamentos da prisão preventiva". Nesses tempos bicudos, isso não significa apenas mais uma forma de controle do presidente do Supremo sobre as prisões decretadas por juízes de instâncias inferiores. Significa que Mendes investe mais uma vez para controlar decisões dos juízes.


Para registro para a posteridade, vai em seguida uma pequena lista das "denúncias" e "protestos" do ministro: contra o "aparelhamento" do funcionalismo público (referência a uma suposta partidarização da PF); contra o "independentismo" da Justiça (não o seu, certamente, mas o dos juízes de primeira instância); contra a invasão da reitoria da UnB, em abril; contra o excesso de prisões preventivas; contra a opinião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de que a absolvição do fazendeiro que seria o mandante da morte da missionária Dorothy Stang depunha contra o Brasil; contra a "espetacularização" da PF; contra as investigações sigilosas feitas pelo Ministério Público; contra as trocas de partidos por parlamentares; contra a lentidão da Justiça; contra o excesso de edições de medidas provisórias; contra o fato de o ministro da Justiça, Tarso Genro, não ter aprovado a soltura de Dantas ("Ele não tem competência para opinar sobre o assunto", disse); contra o fato de a ministra Dilma Rousseff ter opinado que crime de tortura é imprescritível ("Terrorismo também é imprescritível", afirmou ele, certamente apontando o dedo para a ministra, que militou, na época da ditadura, em um grupo armado); contra o que chamou de "estado policial", comparando-o à KGB; e contra o MST. De outro lado, considerou dentro da normalidade a intervenção do Judiciário em questões onde não houver consenso entre governo e oposição.


A lista de "competências" para opinar que se delega o presidente do Supremo, bem como a sua agressividade, tem colocado os demais poderes na defensiva. Enquanto Executivo e Judiciário recuam diante do presidente do Supremo, este avança sobre assuntos que não são seus. Confia que ninguém vai pagar para ver uma crise institucional.


Que Papai Noel presenteie o Brasil, em 2009, com uma democracia mais equilibrada. Aliás, com mais democracia. Quando um presidente de um poder se julga com mais poder do que tem, isso é subtração de democracia.


Maria Inês Nassif

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

STF blindado contra espionagem


O Supremo Tribunal Federal (STF) quer se proteger dos espiões. A Corte busca no mercado uma empresa que lhe forneça aparelhos capazes de codificar as ligações telefônicas de ministros e servidores — sejam elas por celular ou aparelho fixo. Tecnicamente, a parafernália se chama sistema de criptografia (leia ao lado). A compra, cujo valor ainda é segredo, ocorre após o escândalo do grampo do qual teria sido vítima o presidente do Tribunal, ministro Gilmar Mendes. A suspeita é a de que agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) tenham sido os autores. Há um inquérito na Polícia Federal para investigar o caso.

A própria Abin desenvolve esse tipo de tecnologia de defesa para órgãos do governo federal. O presidente da República, ministros e vários dirigentes de estatais conversam por meio de telefones antigrampos entregues pela agência — mais de 1,2 mil já foram distribuídos. O Supremo, no entanto, busca na iniciativa privada um fornecedor. A abertura das propostas está prevista para hoje, às 14h30.

O equipamento que o Supremo pretende adquirir transforma o que foi dito ao telefone em códigos, que voltam a ser palavras quando passam pelo aparelho de quem está do outro lado da linha. Na hipótese de um grampo, seja ele legal ou clandestino, o autor só ouvirá um chiado. Ele pode até tentar “quebrar” o código, mas, segundo especialistas, não viveria o suficiente para concluir a tarefa.

A vulnerabilidade das conversas de ministros e funcionários da alta Corte passou a ser uma preocupação da direção do Supremo depois da denúncia de que uma conversa entre Gilmar Mendes e o senador Demostenes Torres (DEM-GO) foi alvo de grampo clandestino. O crime teria ocorrido dias depois de o STF conceder, por duas vezes, habeas corpus ao banqueiro Daniel Dantas, dono do grupo Opportunity, alvo da Operação Satiagraha, realizada pela Polícia Federal em 8 de julho.

Uma das linhas de investigação dos delegados encarregados de desvendar a autoria da tal escuta clandestina mira em agentes da Abin que colaboravam com o delegado Protógenes Queiroz, responsável pelo inquérito da Satiagraha. Até agora, passados quatro meses de aberta a investigação, não se tem um desfecho do caso. Mas ele deixou a Corte alarmada e preocupada com a segurança.

Segurança
Procurada ontem pelo Correio, a assessoria de Gilmar Mendes informou que a licitação do sistema de criptografia “foi uma decisão da administração para melhorar a segurança interna e institucional” do Supremo. Alegando razões estratégicas, o STF não repassou mais detalhes.

Desenvolvidos principalmente em Israel, os sistemas de criptografia são encontrados no mercado por preços que variam de R$ 1,2 mil a R$ 8 mil, segundo um revendedor de Brasília consultado pela reportagem. “As conversas estarão blindadas”, afirmou o especialista.

Mas nem tudo está seguro. De acordo com ele, há outras ferramentas disponíveis no mundo da espionagem que permitiriam o acesso a conversas reservadas. É o caso, por exemplo, dos aparelhos de escuta ambiental, espécie de supermicrofones que, adquiridos via internet por apenas R$ 500, conseguem captar diálogos a metros de distância, mesmo que a conversa se passe entre quatro paredes.


Saiba mais


Criptografar é codificar informações em dados aparentemente sem sentido para que pessoas não consigam ter acesso às informações que se deseja cifrar
Há vários usos para a criptografia: proteção a documentos secretos armazenados num pendrive, transmissão de e-mails ou mesmo conversas telefônicas. O sistema que o STF está adquirindo será utilizado no serviço de telefonia
No caso do telefone, a codificação ocorre da seguinte forma: as palavras de quem fala são transformadas em códigos tão logo caem na rede e, assim, são transmitidas ao aparelho do receptor, que decodifica o conteúdo e o transforma de volta em palavras

Se houve um grampo nesse intervalo, o autor da interceptação ouvirá apenas um chiado. Para ter acesso ao diálogo normal, ele precisaria do código
É preciso que a tecnologia esteja disponível de um lado e de outro da linha para que o sistema funcione. Do contrário, a conversa estará acessível como outra qualquer
Especialistas estimam que para alguém conseguir quebrar uma criptografia na base de tentativa e erro levaria cerca de 100 mil anos usando um computador comum
No mercado, predomina tecnologia importada de Israel. O equipamento costuma variar de R$ 1,2 mil a R$ 7,8 mil, segundo um revendedor de Brasília consultado pelo Correio



Sistema contestado

O PPS recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o decreto presidencial que regulamentou o Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin). A lei permite à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) manter em seus quadros funcionários dos órgãos que compõem o sistema. Entre eles, estão Polícia Federal, Receita Federal, Banco Central e as Forças Armadas (Marinha, Exército e Aeronáutica).

Na ação, o partido pede a suspensão do parágrafo que permite aos servidores cedidos à Abin acesso às bases de dados de suas instituições de origem. De acordo com os representantes da legenda, “trata-se de nítida hipótese de ofensa do direito à inviolabilidade da intimidade e do sigilo de dados”. Para o PPS, a legislação confere à Agência “mecanismos que lhe permitem fazer uma verdadeira devassa na vida de qualquer cidadão”.

Devassa
Por isso, pede a inconstitucionalidade de dispositivos do decreto presidencial. O relator da ação no Supremo é o ministro Menezes Direito que, ao reconhecer a relevância do tema, dispensou a análise liminar do pedido para que a ação seja avaliada diretamente no mérito da questão.

O Sisbin tem sido um dos argumentos utilizados pelos defensores da parceria entre a Abin e a Polícia Federal na Operação Satiagraha. A ação policial, coordenada pelo delegado Protógenes Queiroz, contou com a participação de cerca de 100 arapongas que ajudaram a investigar as ações do banco Opportunity. As suspeitas do grampo ilegal no STF recaem justamente sobre esse grupo.

STF determina cassação por troca de partido


A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal determinou ontem, por unanimidade, que a Mesa da Câmara cumpra imediatamente - independentemente de publicação de acórdão - a decisão do Tribunal Superior Eleitoral, de março último, que cassou o mandato do deputado Walter Brito (PB), por ter trocado o DEM pelo PRB, sem justa causa, fora do prazo determinado pelas resoluções 22.610/07 e 22.732/08 do TSE.

A decisão da turma do STF foi tomada no julgamento de um recurso (agravo de instrumento) do parlamentar contra despacho do presidente do TSE, ministro Ayres Britto, que lhe negara o direito de ajuizar recurso extraordinário ao STF contra a decisão do plenário do TSE.

Walter Brito é o primeiro deputado federal a perder o mandato por infidelidade partidária.A defesa do parlamentar alegava a inconstitucionalidade da Resolução 22.610/07 do TSE - que regulamenta o processo de perda de mandato por infidelidade partidária - por considerar que o tribunal não poderia ser órgão julgador desse tipo de processo sem uma lei complementar para essa finalidade.

O ministro-relator do agravo na 2ª Turma do STF, ministro Celso de Mello, seguiu o parecer do procurador-geral da República, no sentido de que, em mais de uma ocasião, o Supremo já se pronunciou sobre o assunto, e validou as resoluções do TSE em causa.

Mello lembrou que, novembro último, por 9 votos a 2, o pleno do Supremo manteve o entendimento de que, em conseqüência do princípio da fidelidade partidária, os mandatos eletivos pertencem aos partidos, e que as resoluções do TSE regulamentando a matéria continuavam em vigor, "em sua integralidade", pelo menos até que o Congresso venha a alterá-la, com a aprovação de lei específica.

Esta decisão foi tomada no julgamento de ações de inconstitucionalidade propostas pela Procuradoria-Geral da República e pelo Partido Social Cristão (PSC) contra a Resolução 22.610/07 do TSE, com base no argumento principal - destacado pelo procurador-geral da República - de que o TSE assumira o papel de "verdadeiro legislador" e violara o artigo 121 da Constituição, que dá à União a competência privativa de legislar sobre matéria eleitoral. Foram votos vencidos, na ocasião, os ministros Eros Grau e Marco Aurélio.

O deputado Walter Brito Neto assumiu o mandato como suplente de seu ex-colega Ronaldo Cunha lima (PSDB-PB), que renunciou ao mandato, cinco dias antes de o STF julgar a ação penal em que era réu por tentativa de homicídio contra o ex-governador da Paraíba Tarcísio Burity.

A briga pelo poder começou


Numa mensagem endereçada ao governador José Serra (PSDB), de São Paulo, o governador Aécio Neves (PSDB) disse ontem em Belo Horizonte que oferecerá o seu apoio e entusiasmo a qualquer candidato que for indicado pelo seu partido para disputar as eleições presidenciais em 2010. Mas caso a preferência dos tucanos recaia sobre o seu nome, ele espera que esse desprendimento não seja apenas de Minas Gerais.

A sua fala, após um café da manhã na Associação Comercial de Belo Horizonte, foi interpretada como uma recusa em sair do partido, caso seja preterido. Mas esclareceu que Minas Gerais, em função do seu número de eleitores e prestígio no cenário político, não ficará de fora das articulações, das discussões políticas que resultarão na definição do candidato do partido e à própria campanha eleitoral. "Pretendo realizar uma agenda de viagens pelo país a partir de janeiro e no segundo semestre vamos, democraticamente, analisar quem é o melhor candidato para disputar as eleições", declarou.

Aécio Neves não se mostrou entusiasmado com a possibilidade de uma chapa puro-sangue do PSDB, só com candidatos tucanos para presidente e vice. O governador disse que o país tem um quadro partidário extremamente plural e que uma aliança deve ser buscada não apenas para vencer as eleições para governar o país. "Soaria de forma pretensiosa a intenção de um só partido indicar a cabeça da chapa e o seu companheiro. Não há necessidade disso para que eu e o Serra estejamos juntos", declarou.

Transferência de votos

O governador mineiro reconhece que o presidente Lula é merecedor da excelente avaliação por parte dos brasileiros, por conta principalmente do bom momento vivido até pouco tempo pela economia mundial. Esclareceu, porém, que essa imagem não resultará necessariamente em transferência de votos para o candidato do PT. "Quem ganhou a presidência da República nos duas últimas eleições não foi o PT mas o presidente Lula. Isso está absolutamente claro", declarou.

Aécio Neves afirmou que a mudança do Partido dos Trabalhadores ao chegar ao poder sugere que não haverá mais grande polarização econômica nas próximas eleições. Segundo Aécio, haverá espaço para novos temas e um dos quais ele pretende trazer ao debate é a gestão pública de qualidade, como melhor instrumento de melhoria das condições sociais do País.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Em debate o aborto


Presidente diz que tema é uma questão de saúde pública e precisa ser discutido "com franqueza"

O presidente Lula defendeu o debate sobre a legalização do aborto, embora tenha afirmado que, pessoalmente, é contra a interrupção da gravidez. Lula disse que o assunto virou um tabu: "Não se trata de ser contra ou a favor. Trata-se de discutirmos com muita franqueza, que é questão de saúde pública."


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender a discussão a respeito da legalização do aborto, embora tenha ressalvado que, pessoalmente, é contrário à prática. Suas declarações se deram durante a abertura da 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, onde um grupo aproveitou para vaiar, em quatro ocasiões, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que, na semana passada, autorizou a instalação de uma CPI para investigar a realização de abortos no país. Lula afirmou que, apesar de a Constituição proibir o preconceito, ele existe no país por ser esta uma questão cultural.

- Uma das coisas mais ofensivas que sinto é a questão do preconceito, o medo de discutir; é a disposição de não querer enfrentar determinados temas porque parecem tabus - discursou Lula, para, em seguida, destacar:

- A questão do aborto, por exemplo. Não se trata de ser contra ou a favor. Trata-se de nós discutirmos com muita franqueza, já que é uma questão de saúde pública. Se perguntarem para mim, eu já disse abertamente: eu sou contra - declarou o presidente.

Lula lembrou ainda as diferenças de classe social para afirmar que mulheres ricas fazem abortos em outros países, enquanto as pobres sofrem.

- Quantas madames vão fazer aborto até em outro país, e as pobres morrem na periferia dos grandes centros urbanos deste país? Essa é uma coisa que temos de debater, e não ter medo de debater - defendeu.

Arlindo Chinaglia, que discursou antes de Lula, procurou justificar sua decisão de mandar instalar a CPI do Aborto. Mas não teve êxito em aplacar os críticos à sua postura.

- O processo legislativo vai além de nossos desejos.

Na conferência, da qual participaram 11 ministros, Lula e o secretário Especial de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, evitaram falar abertamente sobre a polêmica da tortura praticada durante o período militar (1964-1985). Parecer da Advocacia Geral da União (AGU) afirma que o crime de tortura foi prescrito pela Lei da Anistia. O próprio Vannuchi já se posicionou contrariamente ao parecer. Ontem, no entanto, o ministro apenas citou, de forma indireta, o tema.

- Com serenidade, diálogo e compreensão da complexidade, acharemos uma solução a contento - disse Vannuchi.

A única pessoa que tratou efusivamente do assunto foi Deise Benedito, representante da sociedade civil, que foi aplaudida de pé.

- Este governo tem obrigação histórica. Nós repudiamos a posição da AGU, de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), do Ministério da Defesa que, na contramão da história, não quer punir os torturadores - discursou Deise Benedito.

Trem da alegria no senado


Na esperança de passar despercebido, o Senado prepara um trem da alegria de Natal para os funcionários de carreira. Está na pauta da reunião de hoje da Mesa Diretora um ato que estende a gratificação de especialização a quem não se qualificou. Uma espécie de “auxílio-chefia”. Se for aprovada, a medida, a qual o Correio teve acesso, pagará a partir de 2009 um adicional de até R$ 1,6 mil no salário de um servidor com cargo de chefia há mais de um ano, mas que não possui nem certificado de curso superior.

O problema é que esse mesmo servidor já recebe um percentual extra por ter uma função de confiança, que varia de R$ 1,7 mil a R$ 3 mil a mais em salários entre R$ 6,6 mil e R$ 12,7 mil. No total, pelo menos 1,1 mil dos 3,4 mil servidores efetivos recebem um dinheiro extra pelos cargos de chefia — chamados de FCs — e poderão ser beneficiados caso o ato seja aprovado hoje.

A medida foi preparada nos últimos meses pelo Sindicato dos Servidores Legislativos (Sindilegis) em conjunto com a Diretoria-Geral do Senado. Inicialmente, a proposta, que vem sendo debatida há 15 anos, deveria beneficiar apenas quem possui graduação, pós-graduação, mestrado ou doutorado, não podendo ultrapassar R$ 1.923 mensais de bônus. Mas não foi bem assim.

Engavetado desde 2002, o texto saiu do papel este ano e com um agrado ao servidor sem qualificação acadêmica. A distribuição é escalonada. Depende do tempo em que o funcionário está na função de confiança. Se ele ocupa um cargo desse tipo há 10 dez anos, por exemplo, poderá receber até R$ 640 de gratificação por mês. O limite é de 25%, ou R$ 1,6 mil, para quem está há mais de 25 anos na direção de determinada área e não possui especialização.

A medida vai além. O servidor que possui um mestrado e ocupa uma função de chefia há mais de um ano poderá acumular os adicionais referentes à títulação e ao período em que está numa FC, desde que não ultrapasse os R$ 1.923. A direção do Senado estima que o ato aumentará em R$ 70 milhões por ano os gastos com folha de pagamento, mas não revela o quanto será pago aos servidores donos de cargos comissionados sem especialização.


Defesa da experiência

O presidente do Sindilegis, Magno Mello, defende a medida que beneficia os servidores com cargos de chefia e não possuem especialização acadêmica. Para ele, a permanência por vários anos numa determinada função diretiva do Senado já pode ser encarada como uma qualificação. “Isso desenvolve a capacidade de raciocinar, estudar regimento, ninguém fica parado olhando. A gente acredita que a função comissionada leva à qualificação do servidor”, diz.

Mello passou os últimos dias visitando os gabinetes dos sete integrantes da Mesa Diretora para que aprovassem hoje o ato. O texto contém duas páginas e sete artigos. O sindicalista distribuiu aos parlamentares um documento em que justifica a necessidade da medida. Ele ressalta a necessidade de dar uma gratificação a quem se especializou, mas também reforça a ajuda aos servidores que ocupam FCs sem titulação, defendendo esse auxílio-extra.

O ato criou um mal-estar nos corredores do Senado. Servidores que se dedicaram nos últimos anos à qualificação acadêmica não aceitam a recompensa financeira para quem não fez o mesmo. A avaliação é a de que a vinculação dos bônus pode atrasar a ajuda financeira aos funcionários que passaram anos dentro da sala de aula.

A medida, por exemplo, estabelece um percentual maior de bônus para quem tem doutorado, R$ 1,4 mil, podendo chegar aos R$ 1,9 mil com a comprovação das titulações inferiores. No caso da turma sem qualificação, os valores podem ser de 0,5% do rendimento básico de quem ocupa uma FC6, a mais baixa, há mais de um ano, atingindo os 25% para o servidor com cargo de diretor há 25 anos.

Não é a primeira vez que o Senado age na surdina para elevar os gastos com sua folha de pagamento. Em julho, a Mesa Diretora chegou a aprovar a criação de 97 cargos sem a necessidade de concurso público, os chamados CNEs. A decisão foi revogada dias depois pelo presidente da Casa, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), pressionado por um aumento que seria de R$ 1 milhão mensais nos custos internos.

A reunião de hoje deve ser a última da Mesa Diretora em 2008. Dificilmente haverá um novo encontro em janeiro. Ou seja, caso não seja votado hoje, o ato provavelmente será apreciado por uma nova Mesa, a ser eleita em fevereiro do ano que vem. O Sindilegis teme que isso atrase ainda mais a aprovação das gratificações, mas recusa-se a abrir mão do pagamento a quem não tem nenhuma especialização. (LC)


Dinheiro público

R$1,6 mil é o teto da gratificação que o Senado pode conceder a um chefe que não se qualificou

1,1 mil é o número de servidores que deverão ser beneficiados com o ato do Senado

R$70 mil por ano serão gastos com todo o ato, incluindo os pagamentos com quem não se especializou e quem possui algum certificado

Lula tem novo recorde de aprovação


Duas pesquisas - CNI/Ibope e CNT/Sensus - mostram que a crise não abalou a popularidade de Lula. Em ambas, o governo foi classificado como ótimo ou bom por mais de 70% dos entrevistados. Na avaliação pessoal, o presidente bateu recorde no Ibope: 80% de aprovação.


Avaliação positiva do presidente alcança 84%

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva obteve novo recorde de popularidade, segundo pesquisa CNI/Ibope divulgada ontem. De acordo com o levantamento, 73% avaliaram o governo como ótimo ou bom em dezembro, contra 20% que classificam o governo como regular e apenas 6% que entendem ser o governo ruim ou péssimo.

Essa é a melhor avaliação de um governo desde que a pesquisa CNI/Ibope começou a ser feita. O recorde anterior de Lula havia sido obtido em setembro passado, quando o governo obteve 69% de avaliação positiva. Antes disso, o recorde era de setembro de 1986, quando o governo do então presidente José Sarney recebeu 77% de avaliação positiva, no auge do Plano Cruzado.

A avaliação pessoal do presidente Lula também obteve novo recorde e chegou a 84% em dezembro contra apenas 14% de desaprovação. Outros 2% não responderam ou não opinaram.

A pesquisa CNI/Ibope foi realizada entre os dias 5 e 8 de dezembro, em 141 municípios. Foram ouvidas 2.001 pessoas, e a margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou menos.

Mais recordes

Os índices de avaliação positiva do governo e do presidente Lula já haviam registrado desempenho recorde na pesquisa CNT/Sensus, divulgada também na manhã de ontem. Nesta sondagem, o governo Lula recebeu avaliação positiva de 71,1% dos entrevistados, contra apenas 6,4% que avaliaram negativamente o governo. Também foi o melhor desempenho já registrado desde o início da série histórica, no ano de 1988.

De acordo com a pesquisa CNT/Sensus, a avaliação pessoal do presidente Lula obteve o a segunda melhor avaliação desde que a pesquisa começou a ser produzida, subindo de 77,7% em setembro para 80,3% em dezembro.

O aumento da popularidade de Lula foi registrado em quase todos os segmentos da sociedade, com destaque para a faixa de brasileiros que ganha entre cinco e 10 salários mínimos, diz a pesquisa CNI/Ibope. No Nordeste, o saldo de aprovação positiva de Lula chega a 94%.

A pesquisa também mostra que a confiança no presidente cresceu sete pontos percentuais em relação à última edição, divulgada em setembro deste ano. No total, 80% dos brasileiros afirmam confiar no presidente Lula, 18% não confiam e 2% não opinaram ou não quiseram responder.

Segundo mandato

Às vésperas de completar seis anos de mandato, Lula conta com o mesmo índice de confiança dos brasileiros registrado no primeiro ano do seu governo. Numa comparação entre o primeiro e o segundo mandato de Lula, 49% dos entrevistados consideram o segundo governo de Lula melhor que o primeiro, 39% avaliam como semelhante e apenas 11% consideram pior.

A nota média recebida pelo governo Lula também subiu de 7,4, registrada em setembro, para os 7,8 deste mês – também a melhor nota alcançada por um governo desde o início da pesquisa.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Regulamentação de lobby no Congresso e no Executivo pode sair em 2009


O governo pretende encaminhar ao Congresso, no primeiro trimestre do ano que vem, um projeto para regulamentar a atividade do lobby no país. Atividade estigmatizada ao longo dos anos, sempre associada à corrupção e tráfico de influência, o lobby, acostumado a viver nas sombras, receberá um foco de luz com a iniciativa do Executivo. "A questão não é proibir o lobby, mas saber o que as pessoas estão fazendo. E descobrir até que ponto as decisões tomadas representam o interesse público ou os interesses apenas do lobby", afirmou o sub-chefe de Análise e Acompanhamento de políticas governamentais da Casa Civil, Luiz Alberto Santos.

A idéia é criar uma legislação própria, mas inspirada nos Estados Unidos, onde a regulamentação é antiga e passa por constantes atualizações. A mais recente foi após o escândalo envolvendo o lobista Jack Abramoff, em 2006. Bastante próximo dos republicanos, ele teria dado, segundo a assistente da Promotoria Alice Fischer, "coisas de valor para autoridades, incluindo viagens domésticas e para o exterior, contribuições para campanhas, grandes refeições e entretenimentos, todas as vezes com a intenção ciente de que a autoridade pública agiria em seu benefício ou de seus clientes".


Segundo Santos, o espelho é importante, mas as realidades são distintas. Nos Estados Unidos, o Legislativo é bem mais forte que o Executivo. No Brasil, o regime presidencialista praticamente sufoca o Parlamento e, por isso, é fundamental identificar os lobistas que atuam nos dois poderes.


Projeto sobre esta divisão da atividade foi apresentado pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP), aprovado há duas semanas na Comissão de Trabalho e que seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. O próprio Zarattini lembra que travou uma batalha árdua para que o projeto fosse votado - "ele entrava e saía da pauta, eu tinha que insistir sempre".


Quando finalmente conseguiu inverter a pauta e se preparava para aprovar a iniciativa, o Ministério do Planejamento pediu uma análise melhor. "Eles disseram que, por serem responsáveis pela gestão pública, queriam entender melhor o meu projeto", recorda o petista. Acabou convencendo os técnicos do planejamento que o momento era agora e o projeto finalmente foi votado.


O texto de Zarattini propõe que os lobistas que atuem junto ao Executivo sejam credenciados na Controladoria-Geral da União (CGU), enquanto os que atuam junto a senadores e deputados sejam inscritos na primeira-secretaria da Câmara. As agendas das respectivas autoridades terão que explicitar as reuniões com os representantes das empresas, para que todos saibam os interesses envolvidos em cada um do encontros oficiais. "Além disso, os lobistas, as entidades ou empresas pelas quais eles são contratados têm de prestar contas, regularmente, de viagens, hospedagens e jantares ao Tribunal de Contas da União (TCU) ".


Seguir para a CCJ não significa êxito. Vide exemplo de projeto semelhante, apresentado pelo senador Marco Maciel (DEM-PE), em 2 de agosto de 1989. Ele foi aprovado pelo plenário do Senado, seguiu para a Câmara, teve um requerimento de urgência aprovado no plenário da Casa em 2001, mas parou. Ele tinha uma diferença básica em relação ao projeto do petista: restringia a identificação aos lobistas que atuavam no Congresso Nacional.


Segundo Maciel, é extremamente difícil estender a mesma disciplina ao Executivo. "Como estabelecer uma disciplina para o lobby no Executivo? Por que não estendê-la ao Judiciário? Isso não poderia ser interpretado como interferência de um poder sobre o outro"? indagou.


O senador defende que é bom para todos a regulamentação, pois, quanto mais amplos e legítimos os interesses sociais defendidos por essas entidades, mais participativo se torna o processo decisório. "Hoje, quando um parlamentar recebe um lobista, não sabe se é representante de uma entidade ou instituição legal ou representa interesses escusos. Pretender, de antemão, santificar alguns interesses e satanizar outros constitui evidente discriminação".


Do outro lado do debate, torcendo para que a atividade seja regulamentada "para que os ratos saiam à luz", o diretor de relações governamentais da Patri Políticas Públicas, Eduardo Carlos Ricardo, ainda vê com ceticismo essas discussões em torno dos projetos de regulamentação. Lembra que, se depender do governo e do Congresso, "sempre vai ter alguém querendo proteger alguém". Há anos militando na área, com equipe definida e orçamento que diz ser transparente, Eduardo acredita que o debate, "bom para a democracia", está avançando, mas não acredita que a aprovação de uma regulamentação aconteça em breve. "Todo mundo defende regulamentação, mas todo mundo quer ficar de fora dela", afirma.


A aparente contradição escancara a falta de disposição para mudar uma realidade presente na cultura brasileira: o tráfico de influência nos corredores do poder. "Eu quero audiência pública e agenda transparente. O perigo está no elevador privativo, na entrada pela garagem e nos encaixes extra-agenda", complementou Eduardo. E acrescenta que uma regulamentação efetiva deveria envolver não só o Congresso e os Ministérios, mas também autarquias, fundações e estatais.


Outro defensor da regulamentação é o presidente da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), Antônio Marco Umbelino Lobo. Ele gosta do projeto do Zarattini e até se antecipou em um ponto: enquanto não se regulamenta por lei a atividade, a associação que preside instituiu a auto-regulamentação, com código de ética próprio. Mas reclama que prestações de contas mensais podem inviabilizar o trabalho, por torná-lo muito dispendioso. "Eu me lembro de um ministro do governo militar com o qual eu trabalhei que dizia: quem está na penumbra, sempre arruma um jeitinho de fraudar balanços e prestações de contas", disse Antônio Marco.


Ele acredita, no entanto, que o debate é bom, pois os profissionais sérios e os políticos comprometidos acabam ficando constrangidos com a associação da palavra lobby à corrupção ou tráfico de influência. "Mais do que um direito legítimo, é dever do setor privado manter um canal permanente de interlocução com o poder público com o objetivo de contribuir na formulação de políticas públicas. Não somos um Marcos Valério".

Operadoras criam banda 'ultralarga'


Não faz muito tempo, uma conexão de banda larga de 1 megabit por segundo (Mbps) era algo sensacional. Com ela, você conseguia carregar rapidamente uma página da internet e podia baixar uma música em alguns minutos. Mas você - junto com outros milhões de pessoas - resolveu que queria fazer download de vídeos e divulgar suas fotos na web. E, então, provavelmente concluiu que essa velocidade não era tão boa assim.

A demanda aumentou muito, mas a capacidade das redes também. Hoje, a velocidade inicial oferecida pelas operadoras de telefonia e de TV a cabo é de 2 Mbps e as empresas estão começando a vender conexões de até 100 Mbps.


Para isso, as companhias de telecomunicações estão construindo redes de fibra óptica que chegam até a residência de seus clientes. A infra-estrutura convencional de telefonia, de fios de cobre, não dá conta do recado porque sua capacidade é bem mais limitada.


O movimento ainda é incipiente no país, onde a maioria da população sequer tem acesso à internet discada em casa e o número de conexões de banda larga é de quase 10 milhões. Mas as operadoras estão começando a construir redes de altíssima velocidade, ainda que, por enquanto, elas estejam restritas aos bairros mais ricos das cidades mais ricas - onde vivem consumidores potenciais de pacotes que começam na faixa dos R$ 400.


A iniciativa mais recente é da Brasil Telecom (BrT). Na quarta-feira, a operadora vai começar a vender conexões de banda larga com velocidades de 14 Mbps a 100 Mbps nas cidades de Brasília, Curitiba, Goiânia, Porto Alegre e Florianópolis.


A companhia está investindo um valor não-revelado para levar fibra óptica à casa de seus clientes. Hoje, a conexão de internet mais veloz da BrT, na rede convencional de telefonia, é de 8 Mbps. Por enquanto, a nova tecnologia estará disponível para 50 mil domicílios, diz o vice-presidente de operações da Brasil Telecom, Francisco Santiago. O ritmo de ampliação dependerá da oscilação cambial e do planejamento da Oi, que está comprando a BrT.


A Telefônica lançou sua rede de fibra óptica residencial no começo deste ano, no bairro dos Jardins, na capital paulista. Mas, agora, a empresa está na reta final de um projeto de expansão para a Grande São Paulo e o interior do Estado. Em janeiro de 2009, a tecnologia passará a ser oferecida em 370 mil domicílios.


Ainda é pouco, mas esse cenário deve mudar em alguns anos. Marcio Fabbris, diretor de produtos residenciais da Telefônica, avalia que mais da metade dos domicílios do Estado de São Paulo estará coberta por fibra óptica até 2012. Em outras regiões do país, onde a renda per capita é menor, o processo deve demorar mais. Mesmo assim, executivos do setor prevêem uma disseminação razoavelmente rápida.


No Brasil, isso deve acontecer até 2014, diz Foad Shaikhzadeh, presidente da Furukawa, fornecedora de fibra óptica. Segundo ele, a rede convencional de telefonia deve ser substituída aos poucos pela fibra. "O cabo coaxial tende a morrer", afirma.


Ninguém fala em valores, mas isso vai implicar investimentos bilionários. Nos Estados Unidos, a operadora Verizon anunciou, em 2004, que aplicaria US$ 18 bilhões, em seis anos, para levar a tecnologia à metade dos domicílios em sua área de cobertura num prazo de seis anos - frente aos gastos de US$ 4,9 bilhões que teria no período para manter sua rede de cobre. Na época, a Verizon estimou que teria 7 milhões de usuários de internet e 4 milhões de TV utilizando a tecnologia no fim de 2010. Em setembro, o número de clientes era de 2,2 milhões e 1,6 milhão, respectivamente. "O investimento em fibra óptica tem retorno a longo prazo", comenta Júlio Püschel, analista do Yankee Group.


As operadoras de telefonia fixa não estão sozinhas. As empresas de TV a cabo também estão começando a oferecer a chamada banda "ultralarga". Mais do que isso, foram elas que acirraram a competição no mercado de internet, que reduziu preços e aumentou a velocidade das conexões.


Na semana passada, a Net anunciou que terá acessos de 20 Mbps e de 60 Mbps em São Paulo. A empresa já fez o mesmo no Rio de Janeiro. A operadora de TV a cabo não precisa implantar fibra óptica para isso: sua rede já tem capacidade para transmitir dados em velocidade alta.


Nos últimos anos, operadoras de telefonia e de TV por assinatura começaram a competir entre si e a disputar os mesmos clientes - principalmente os de maior renda - com a oferta de pacotes que combinam voz, acesso à internet e vídeos.


Por sinal, vídeo é palavra-chave para compreender o interesse das operadoras nas redes de altíssima velocidade. As empresas estão de olho num novíssimo negócio: a transmissão de TV via internet, ou IPTV (sigla em inglês para televisão sobre protocolo de internet).


Fabbris, da Telefônica, afirma que a companhia vai lançar IPTV até a metade de 2009. Haverá duas opções de serviço: a compra de vídeos sob demanda ou de pacotes como os da TV paga convencional.


A Telefônica pode fazer isso porque controla parte da TVA, que tem licença para atuar como empresa de TV paga. Outras operadoras de telefonia estão à espera de mudanças na regulamentação que lhes permitam atuar como provedoras de televisão por assinatura.


É o caso da BrT. Há mais de dois anos a operadora tem um projeto piloto de IPTV em Brasília, mas como não pode oferecer grade de programação - apenas vídeos sob demanda - a conta não fecha, diz Santiago.


A transmissão de TV em alta definição será o grande atrativo das novas redes, na avaliação do executivo. "Queremos dar, desde já, uma grande velocidade aos nossos clientes como preparativo para oferecermos vídeos em banda larga no futuro", diz.


Segundo Shaikhzadeh, nos Estados Unidos já começa a se experimentar a conexão da fibra diretamente nos televisores - hoje ela é levada até o assinante e o sinal, distribuído por meio de um decodificador. O executivo afirma que esse tipo de produto pode chegar ao Brasil em cinco anos.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Fim do autoritarismo tucano


A Assembléia Legislativa de São Paulo aprovou anteontem à noite, em votação simbólica, o fim de um item do Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado que proíbe o servidor de se manifestar livremente em relação a gestores e atos da administração pública. Apelidado pelos deputados de ?lei da mordaça?, esse dispositivo legal data de 1968, ano do estatuto do funcionalismo estadual, e o projeto de lei complementar que o revoga, do deputado Roberto Felício (PT), foi aprovado em regime de urgência, após acordo entre as lideranças do Legislativo.

O projeto irá à apreciação do governador José Serra, que decidirá pela sanção ou veto, em 15 dias. A restrição aos servidores estaduais consta no primeiro inciso do artigo 242 do estatuto do funcionalismo e proíbe referências depreciativas às autoridades e à administração pública ?em informação, parecer, despacho ou pela imprensa. A livre manifestação do pensamento é garantida pelo artigo 5º da Constituição

SP gastará R$ 600 mi para manter tarifa de ônibus


Uma discussão entre vereadores e representantes da São Paulo Transporte (SPTrans) durante audiência ontem na Câmara Municipal colocou em xeque a manutenção da tarifa do transporte coletivo a R$ 2,30 em 2009, como prometeu o prefeito Gilberto Kassab (DEM) na campanha à reeleição. Pelos cálculos da Comissão de Transportes do Legislativo, com base em informações fornecidas pelo próprio governo, serão necessários R$ 1,1 bilhão de subsídios para viações e cooperativas em 2009 para evitar o reajuste. Kassab, no entanto, previu no orçamento conceder R$ 600 milhões em subsídios, valor já pago este ano e reduzido em R$ 76 milhões com o corte de 7,5% no orçamento de 2009.

Mas, se for levado em conta que a remuneração média recebida por empresários e perueiros por passageiro transportado é hoje de R$ 1,58, e a média anual de viagens é de 2,850 bilhões, o sistema vai custar R$ 4,504 bilhões em 2009. A previsão fornecida pela SPTrans com a arrecadação das viagens no próximo ano, entretanto, é de R$ 3,4 bilhões.

No momento em que os vereadores apresentaram o cálculo e registraram o déficit, os representantes da SPTrans ficaram calados por alguns segundos. Em seguida, após conversa com assessores, o diretor-adjunto de Gestão e Receita da empresa, José Carlos Martinelli, afirmou que no cálculo de R$ 1,58 estava também embutido os repasses previstos às viações com a ?operação em terminais?. No final da audiência, o diretor declarou não reconhecer os números da comissão, mas que ajustes, como corte de gastos, precisam ser feitos para garantir a tarifa a R$ 2,30.

Na rubrica chamada compensações tarifárias entraram novos cálculos nos últimos anos, como a operação dos terminais. (O R$ 1,1 bilhão) É uma conta que não bate. A conta razoável é a de R$ 600 milhões, argumentou Martinelli. Os vereadores, porém, não se convenceram das explicações.

Serra inaugura 1º trem comprado da Alstom em contrato sob investigação


O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), inaugurou ontem o primeiro trem -de um lote de 16- cujo contrato de compra está sob investigação por suspeita de superfaturamento e de burlar a Lei das Licitações. O trem é da Alstom. O conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado) Antonio Roque Citadini diz em despacho de agosto deste ano que o Metrô não conseguiu provar até agora que pagou o menor preço pelos trens.

Segundo auditores do TCE, o Metrô pagou R$ 609,5 milhões pelos 16 trens, quando se inclui o pagamento de ICMS. Pelas contas do tribunal, cada trem custa R$ 38 milhões. O Metrô diz que esse valor não é real porque obteve um desconto de R$ 100 milhões e pagou R$ 499,8 milhões pelo lote. Com o desconto, cada trem custou R$ 31,2 milhões. Na cerimônia de entrega, na estação Itaquera (zona leste), o governador mencionou um outro preço: R$ 27 milhões.

Em uma compra com licitação internacional, feita cinco meses depois da aquisição sem concorrência, o Metrô pagou R$ 28,8 milhões por trem. A Alstom está sendo investigada na Suíça, na França e no Brasil sob suspeita de ter subornado políticos para ganhar contratos. Um dos documentos apreendidos na Suíça diz que a Alstom pagou US$ 6,8 milhões para ganhar um contrato de US$ 45 milhões do Metrô.

Ontem, Serra descartou a possibilidade de haver atraso na entrega de trens por conta das investigações: "Nada a ver". O governador enalteceu a inovação do trem: "Na verdade, o Metrô melhora também não apenas com novas linhas, mas com novos e mais modernos trens. Este daqui, inclusive, tem câmara de segurança".

O trem entregue ontem tem seis carros e capacidade para transportar 2.000 passageiros. Os 15 restantes serão entregues até o final do próximo ano. O prefeito Gilberto Kassab (DEM) e diretores da Alstom participaram da cerimônia. O preço não é o único problema na compra, de acordo com o Tribunal de Contas. Os trens foram comprados da Alstom em 2007, na gestão de Serra, com um contrato que havia sido assinado em 1992.

Pela Lei das Licitações, o contrato de 1992 caducou em 1997. Segundo o voto do conselheiro Citadini, o Metrô deveria ter feito uma nova licitação. Na semana passada, em um caso muito parecido com o dos 16 trens comprados sem uma nova licitação pelo Metrô, o Tribunal de Contas considerou irregular uma compra feita pela CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

A CPTM usou um contrato de 1995 para fazer compras em 2005, no governo de Geraldo Alckmin (PSDB). De acordo com auditores do tribunal, a CPTM gastou R$ 34,6 milhões a mais por não ter feito uma nova concorrência. O julgamento do tribunal sobre a CPTM é definitivo.(Folha assinante)

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Mantega acredita que País escapa da recessão


O Brasil terá um crescimento de 5% a 5,5% em 2008, a despeito do aprofundamento da crise financeira internacional a partir de setembro. A projeção é do ministro da Fazenda, Guido Mantega, feita logo depois de o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmar a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre em 6,8%. Conforme o ministro, os bons resultados acumulados nos três primeiros trimestres compensam, com folga, a desaceleração já dada como certa no último trimestre, fazendo com que a média do ano fique em 5% ou mais.

Para 2009, o ministro aposta em crescimento do PIB de 4%, mas alerta que não é uma simples previsão, mas um objetivo a ser alcançado. "Quatro por cento é meta que temos que trabalhar para alcançar. É uma construção, não uma mera previsão econômica", disse, descartando taxas negativas de crescimento. "Não teremos recessão", enfatizou.

Mantega destacou o crescimento do PIB em 6,8% no terceiro trimestre, ressaltando que o avanço foi mais forte que no primeiro trimestre (6,1%) e no segundo trimestre (6,3%). "É um crescimento muito bom para o País, é um crescimento de qualidade", disse o ministro sobre o resultado do terceiro trimestre. Ele salientou que a formação bruta de capital fixo, em alta de 19,7%, e o crescimento da construção civil, em mais de 10%, são provas da saúde econômica do Brasil. "Significa que estamos nos modernizando, que o parque produtivo brasileiro está recebendo máquinas mais modernas, capacitando o País para uma compe-tição mais forte que haverá depois que essa crise se acalmar", afirmou o ministro.

Dinâmica do PAC

Bem-humorado perante os resultados do PIB divulgados pelo IBGE, o ministro tratou de ressaltar que o crescimento do terceiro trimestre foi "dinamizado" pelas ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançado em maio pelo governo federal, e também pelos programas sociais do governo, que reforçam o poder do mercado interno. "Esse crescimento que tivemos significa que ganhamos musculatura, que acumulamos forças para o período mais difícil que já está acontecendo no mundo e no Brasil", disse Mantega. "Nossa desaceleração será menor que a de outros países, que já estavam com crescimento debilitado desde o primeiro semestre do ano passado", disse o ministro. Para ele, o Brasil está em situação melhor que Rússia, China e Índia, os demais BRICs, o grupo dos principais países emergentes.

Apesar de manter o tom otimista, Mantega abandonou o discurso de que o País estaria blindado perante as turbulências, como ocorria no início da crise. Agora, ele admite que "teremos uma desaceleração que já era esperada. É o resultado das dificuldades que esta crise internacional está trazendo para o Brasil", declarou, ao projetar crescimento de 3% a 3,5% no último trimestre de 2008.

Retomada em 2010

O ministro da Fazenda afirmou, no entanto, que o Brasil retomará os patamares de crescimento do período anterior à crise em 2010, e aproveitou para dizer que o País tem condições para manter tamanhas altas do seu PIB sem comprometer outros indicadores. "Em todos os trimestres o aumento foi superior a 6%. Isso demonstra que a economia brasileira tem condições de crescer de forma equilibrada.

A inflação esteve sob controle. Só subiu por causa do choque das commodities", disse Mantega, mandando um claro recado para o seu companheiro de governo, Henrique Meirelles, do Banco Central, que decide hoje sobre a taxa básica de juros, que é o principal instrumento de controle da inflação.

Embora não tenha arriscado opinar sobre qual será o novo patamar cambial, Mantega disse que o dólar mais caro será benéfico para o Brasil, principalmente por tornar as exportações mais competitivas. "As contas externas serão ajustadas, principalmente pelo novo câmbio", afirmou Mantega.

A nova e a velha mídia bem no meio da crise


Há algo de inédito, dramático, complexo e instigante no acelerado processo de mudança enfrentado pela mídia, do qual a crise instalada em diversos grupos espalhados ao redor do mundo dá conta de só uma parcela da questão. Nesta semana, duas companhias americanas, das mais robustas do planeta, deram exemplos incontestáveis do tamanho das dificuldades em formação no horizonte.

De um lado, o conglomerado Tribune Co. - que publica, entre outros, o Los Angeles Times e o Chicago Tribune - tornou-se a primeira editora a pedir concordata. O grupo tem uma dívida de quase US$ 13 bilhões e vem sofrendo com a retração dos anunciantes. (A concorrência da internet e a crise financeira internacional foram os dois principais motivos apontados para a contabilização das perdas.) Segundo informaram os porta-vozes do conglomerado, os jornais do grupo vão continuar a operar normalmente.

De outro lado, a New York Times Co., que publica o New York Times - o mais respeitado jornal do mundo -, informou que estuda hipotecar sua sede em Manhattan para pagar uma dívida de US$ 400 milhões. A idéia da companhia é conseguir um empréstimo de US$ 225 milhões por meio de uma operação imobiliária, uma vez que, em meio à crise financeira global, as portas do crédito e financiamento parecem cerradas. Como alternativa à espiral descendente em que se viram, acionistas do grupo têm pressionado por um maior investimento em ativos na internet.

Tais sinais, emitidos do epicentro da economia e da mídia, se não produzem uma das mais complexas tarefas a serem cumpridas por profissionais de comunicação, pelo menos antecipam as exigências postas à mesa dos tomadores de decisão desta área. As diversas e profundas janelas abertas pela revolução de tecnologias e costumes impõem à mídia um presente inquietante e um futuro desafiador: nos dois tempos, presente e futuro, a tarefa é adaptar-se a essa revolução conjugando saúde financeira e credibilidade editorial. A esta conquista estão predestinados não necessariamente os mais fortes, mas inegavelmente os mais rápidos.

As mudanças em curso caracterizam-se, por exemplo, pela veloz aproximação entre a chamada mídia jornalística e as novas tecnologias de informação. Assiste-se, com isso, ao desaparecimento progressivo dos desfiladeiros que ainda separam veículos de imprensa escrita, telecomunicações e entretenimento. A segunda mudança substantiva diz respeito ao meio de entrega da informação. Primeiro o jornal competia com outros jornais. Em seguida, com o rádio, a televisão e a internet. Hoje enfrenta a concorrência de prédios, kindles (plataforma de leitura eletrônica de livros, jornais ou busca no Google), elevadores, poltronas de avião, telas de plasma instaladas em táxis, celulares e todos os demais equipamentos capazes de fazer a seleção natural da notícia e do entretenimento.

Outra mudança singular diz respeito à forma de produção de conteúdo, entre as quais os modelos de mídia colaborativa, ou "wiki" (entre outras definições, trata-se da sigla a partir da frase em inglês what I know is...), parecem ser uma das mais notáveis. O mundo wiki constitui a manifestação bem acabada de ferramentas interativas, como os blogs, exemplos de uma forma de jornalismo que ajuda a multiplicar as fontes de acesso a conteúdos diversos - uma trilha que segue muito além da mídia tradicional.

Tais transformações, repita-se, tornam-se ainda mais relevantes e complexas quando expostas a um mundo tisnado por uma crise econômica, com a qual poucos ainda sabem como lidar - ou em que dará. É difícil reconhecer, por exemplo, qual o modelo ideal de negócios que vai imperar daqui para frente. Como toda indústria nascente, diga-se. O fato é que se está diante do que, na língua inglesa, se classifica de turning point, o momento-chave de transformação de uma realidade, de que a mídia é ao mesmo tempo protagonista e porta-voz. No limite, velha e nova mídia interagem numa sucessão de continuidade e ruptura, uma instigante e mordaz combinação na qual os critérios lineares de mensuração de audiência ou circulação também precisam ser revistos.

Se num país como os Estados Unidos esse processo é complicado, imagine-se no Brasil, onde a concorrência é imperfeita, as características oligopolistas predominam e o uso dos mercados acionários como fonte de capitalização ainda se revela incipiente. São dificuldades adicionais constatadas num terreno já antecipadamente movediço. Somadas todas essas evidências, extrai-se uma lição inevitável: a de que, mais do que nunca, criatividade, coragem e inovação representam a bússola para as empresas que desejarem sobreviver e se fortalecer.
 

Consciência Política Copyright © 2011 -- Template created by Consciência Política --