Há mais semelhanças entre os programas de governo das candidatas Marina Silva (PV) e Dilma Rousseff (PT) do que pode julgar um desavisado eleitor. Apesar de Marina — ao menos no discurso — se apresentar como alternativa às candidaturas petista e tucana, as diretrizes da segunda versão do programa da senadora licenciada, apresentado ontem, em São Paulo, aproximam-se do programa de Dilma em pontos cruciais, como educação, política econômica, política social e segurança.
Tanto o programa verde quanto o plano petista defendem, por exemplo, o aumento de qualidade na educação básica (leia quadro). Ambos citam textualmente a criação de um sistema nacional, a execução daquilo de chamam de “economia solidária”, com ações que levem em conta a sustentabilidade e o social, e a modernização das Forças Armadas. Os textos preveem ainda a construção de políticas para a promoção da igualdade racial.
E se a relação é de proximidade entre as diretrizes verdes e petistas, ao que parece, os dois programas estarão distantes das propostas apresentadas até o momento pela campanha tucana. Em discursos e eventos, José Serra (PSDB) tem defendido pontos mais relacionados a uma política econômica com a queda dos juros reais, a revisão de tributos e maior investimento governamental. Na educação, Serra tem colocado o ensino técnico como prioridade. O programa tucano está em construção e deve ser divulgado aos poucos, no site do candidato.
O único ponto de convergência entre os três textos é o Bolsa Família, principal programa social do governo Lula e um dos responsáveis pelos altos índices de popularidade do presidente. Dilma, candidata do governo e pupila de Lula, prometeu o reforço do ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, pasta que coordena o programa. Marina anunciou a manutenção do Bolsa Família e seu aprimoramento para o que chamou de programas de terceira geração. Serra garantiu que, caso eleito, dobraria o número de famílias beneficiadas pelo recurso.
Polêmica
Depois de ter se manifestado contra a atitude de seus adversários em relação aos programas de governo, Marina apresentou ontem a segunda versão de suas diretrizes de governo no lugar de um plano propriamente dito, conforme havia anunciado. A senadora chegou a criticar Dilma por ter apresentado três versões do programa petista e Serra por ter divulgado uma coletânea de discursos como projeto tucano.
Segundo o coordenador da campanha verde, João Paulo Capobianco, “a ideia é ter, no início de setembro, estratégias consolidadas”. Ele ainda acrescentou que o programa não está pronto, pois é necessário que haja contribuições da sociedade. “Marina explicitou um compromisso da campanha de manter, de fato, essa porta aberta na busca da contribuição”.
Ele está aprendendo essas coisas com os índios. Índio não joga conversa fora. Aliás, depende do índio. Tem índio aí que joga. Quando é índio autêntico, não joga”
Marina, sobre discurso do aliado Beto Ricardo e em referência ao vice de José Serra
Reunião com setor de cana
Marina Silva reuniu-se ontem com o conselho administrativo da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica). A entidade representa 60% dos produtores de cana do país, setor apontado por especialistas como um dos principais responsáveis pelo desmatamento e por casos de trabalho escravo.
Segundo a senadora licenciada, houve convergência em alguns pontos de reivindicação dos produtores, como o uso de etanol no transporte coletivo. “Recuperamos uma agenda que foi inviabilizada por setores mais conservadores”, disse, em relação a questões ambientais discutidas no período em que foi ministra do Meio Ambiente, entre elas a questão do zoneamento do plantio de cana-de-açúcar.
Marina reconheceu que não houve avanços sobre um consenso em relação à nova proposta do Código Florestal, que tramita no Congresso. O ponto de discórdia é a questão da recomposição de mata original em 20% das áreas cultivadas. A Unica defende que a recomposição não seja necessariamente em cada propriedade de cultivo, mas em outras áreas. (DA)
Similaridades
Confira algumas semelhanças entre pontos do programa de Marina com o de Dilma e o de Serra
EDUCAÇÃO
Marina: Construção do Sistema Nacional de Educação — Promover maior articulação entre União, estados e municípios para superar as disparidades na distribuição de recursos entre as regiões.
Dilma: Construir o Sistema Nacional Articulado de Educação de modo a redesenhar o pacto federativo e os mecanismos de gestão
ECONOMIA
Marina: Fortalecer a economia solidária aprofundando laços com a sustentabilidade e a inserção dos empreendimentos da economia solidária no mercado justo e sua articulação com os movimentos e redes de consumo consciente e sustentável.
Dilma: Estímulo ao cooperativismo e outras formas de economia solidária.
POLÍTICAS SOCIAIS
Marina: Institucionalizar programas que alcançaram bons resultados, tais como o Bolsa Família.
Dilma: Reforço institucional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome como espaço integrador de políticas sociais, consolidando os sistemas articulados com o Bolsa Família
Serra: Duplicação do Bolsa Família
IGUALDADE RACIAL
Marina: Políticas de igualdade racial, inclusive a manutenção das cotas para negros, serão reforçadas, como parte de um processo de restauração de equilíbrio aos desequilíbrios históricos contra as minorias
Dilma: Ampliar as Políticas de Promoção da Igualdade Racia. Do Correio