Na véspera de o trecho sul do Rodoanel ser inaugurado pelo governador José Serra (PSDB), o trabalho prosseguiu dia e noite na maior obra viária da gestão do governador, que se despede extraoficialmente do cargo hoje para disputar a Presidência da República.
Entre segunda e ontem, o auxiliar de obra Márcio, 23, não dormiu. Viu o sol nascer, se pôr e nascer de novo, trajando o macacão amarelo da empreiteira que lhe paga pouco menos de R$ 800 para trabalhar na obra, um corredor de 61,4 km que custou R$ 3,24 bilhões.
"Hoje a gente só acaba quando terminar", disse o operário à Folha por volta da 1h de ontem, durante uma pausa para comer um sanduíche de queijo, quando já completava 19 horas de trabalho em meio ao cheiro de asfalto quente que era despejado na pista do lote 5 do Rodoanel, na altura de Embu, o mais atrasado de todos.
No intervalo de uma semana, diz, era a terceira vez que encarava uma rotina tão puxada. Não era uma exceção. Márcio, que não informou seu sobrenome, é um dos soldados num exército de cerca de 250 homens que se espalhavam em sete frentes de trabalho ao longo de 42 km do trecho sul do Rodoanel percorridos na madrugada de ontem pela Folha, que conseguiu acesso ao local.
Dar conotação militar ao grupo de operários não é exagero. O cenário, iluminado por potentes holofotes que quebravam a escuridão, parecia mesmo com o de um teatro de operações de guerra. No caso do Rodoanel, uma batalha contra o relógio, para respeitar o tempo político de inaugurações.
Segundo operários e engenheiros ouvidos entre rolos compressores e caminhões, a determinação, passada pela Dersa, empresa estatal responsável pela obra, para os consórcios, era clara: trabalhar a pleno vapor para garantir a passagem de veículos pelo local no misto de vistoria e inauguração feito por Serra ontem, e a liberação do tráfego até amanhã.
Procurada, a Dersa não havia comentado o caso até a conclusão desta edição.
"De manhã já pintaremos a pista", disse um dos engenheiros, em meio aos mais de 60 caminhões carregados de asfalto que, só naquele trecho, aguardavam para despejar o produto nas máquinas ruidosas que faziam a estrada acontecer.
À primeira vista, para quem entra no trecho sul pela Régis Bittencourt, tudo parece pronto, apesar da completa ausência de carros na pista, que faz os cinco primeiros quilômetros parecerem um autódromo.
Apesar de a maioria do trecho percorrido pela Folha estar com acabamento completo, em vários momentos eram notadas faltas de proteção lateral e de pintura no asfalto. Uma ponte ainda carecia de concretagem e duas praças de pedágio ainda seguiam em obras.
Segundo um dos engenheiros, as construtoras OAS e Carioca Engenharia, que integram o consórcio responsável pela construção do lote 5, chegaram a interromper obras tocadas por ela em outros pontos de São Paulo. O objetivo, disse, era deslocar asfalto para suprir a demanda do Rodoanel.
Segundo o engenheiro, só na segunda-feira chegaram 3 mil toneladas de asfalto ao ponto mais atrasado da obra, o suficiente para 2 km de estrada.
Procuradas, as empresas citadas pelo engenheiro não retornaram os contatos.