Sem-terra e sem-teto são proibidos de visitar a Daslu
Militantes do MST e do MTST realizaram neste sábado um protesto em frente ao "maior centro de futilidades de luxo do país", como disseram. Eles tentaram visitar a loja, mas foram proibidos de entrar no prédio. Representação legal acusará empresa por discriminação.
Debaixo de um sol quente, cerca de 300 militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) da Grande São Paulo realizaram um ato contra a concentração de renda no país.
O local escolhido para a manifestação da manhã deste sábado (8) não poderia ser mais propício: o grande e ostentoso edifício da Daslu, localizado na Vila Olímpia, Zona Oeste da capital paulista. "Símbolo das contradições deste modelo de sociedade que não queremos", como definia o material de convocação do ato, a Daslu funcionava normalmente quando os manifestantes chegaram à entrada de funcionários do prédio.
A idéia dos movimentos era visitar a loja. A polícia foi chamada na hora e prontamente compareceu com sete viaturas. Algumas pessoas entraram então no estacionamento da loja, temendo serem agredidas na rua estreita e sem saída que dava para o pátio. Os seguranças fecharam o portão, mas os manifestantes acabaram conseguindo sair. "A polícia militar propôs então que fossemos para a entrada oficial da Daslu negociar com os seguranças pra ver se poderíamos entrar.
Quando chegamos lá, estava coalhado de segurança", conta Márcia Merisse, membro do MST da Grande São Paulo. Os sem-terra e sem-teto pediram então para conhecer o prédio ao menos por fora, mas a segurança alegou que a loja havia sido fechada.
Enquanto isso, os carros dos clientes não pararam de entrar no estacionamento. A reportagem da Carta Maior também conseguiu entrar no estacionamento da Daslu e verificar que a loja estava normalmente aberta - o que foi posteriormente confirmado pela assessoria de imprensa da empresa.
"Não queremos saquear a loja. Só queremos entrar num espaço construído pelo trabalhador, que paga impostos para que lojas como a Daslu continuem os sonegando.
O que acontece aqui é de uma insensatez esmagadora. Alguns têm o direito de ir e vir, outros não. Os pobres da periferia e a juventude não podem entrar na Daslu, mas os ricos podem", afirmou João Batista de Albuquerque, do MTST.
Segundo os participantes do protesto, para comprar duas calças-jeans na Daslu seria necessário um mês inteiro de trabalho de todas as pessoas que moram na comunidade
Coliseu, que fica ao lado da loja. Segundo o Sargento Barros, da Polícia Militar de São Paulo, a loja não permitiu a entrada dos militantes porque eles haviam forçado o outro portão anteriormente.
O chefe da segurança da Daslu chegou a afirmar, inclusive, que os manifestantes tinham pulado o muro, rompido um cadeado e quebrado um vidro do prédio.
Nenhuma dessas versões foi confirmada. No final da tarde deste sábado, a Daslu informou que não houve nenhum prejuízo em função do protesto.
Como não puderam conhecer a loja, MST e MTST decidiram registrar uma queixa na delegacia de polícia mais próxima. A delegada de plantão do 15° Departamento de Polícia, no entanto, se recusou a receber os movimentos, alegando que a loja encontrava-se em área fora da sua jurisdição.
Os policiais presentes informaram os manifestantes que era necessário ir até o 96° DP. Na verdade, o prédio da Daslu é tão grande que a entrada dos funcionários fica sob a jurisdição do 15° DP e a entrada principal da loja é de responsabilidade do 96° DP. "Dissemos que era uma manifestação política e social e que fomos impedidos de entrar na loja, motivo pelo qual estávamos registrando a ocorrência.
Agora, vamos juntar ao boletim todo o material filmado e fotografado e entrarmos com uma representação por discriminação", explica Márcia. "Não tínhamos a ilusão de que entraríamos, mas queríamos protestar contra este símbolo gritante da nossa desigualdade", completou. Além do MST e do MTST, participaram a manifestação estudantes da USP e representantes da Consulta Popular e do Núcleo Caifazes.
A assessoria de imprensa da Daslu disse que a empresa tem total simpatia pela causa daqueles que reivindicam terra e teto, mas que se reserva no direito de, como uma instituição privada, que está aberta para quem vai até lá fazer compras, não permitir manifestações políticas ali dentro.
Solidariedade Na manhã deste domingo (9), as organizações proponentes da manifestação vão participar de um mutirão por doação de sangue no Hospital das Clínicas. "Queremos mostrar qual o caráter da nossa luta.
A sociedade não pode arregalar os olhos pra gente como as pessoas fizeram agora.
A sociedade tem medo de gente pobre. Mas nossa idéia é a da solidariedade", explicou Diogo Castro, do MST. Neste domingo, também acontece um ato cultural e político de solidariedade aos moradores do acampamento Chico Mendes, localizado em Taboão da Serra, onde vive a maioria dos militantes do MTST que participaram do protesto na Daslu.
No acampamento, localizado num terreno endividado - cujo proprietário, segundo o movimento, deve 200 mil reais à prefeitura -, vivem 3.500 famílias ameaçadas de despejo.