Empresa acusada de fraudar licitação no Senado ganha mais um ano para prestar serviços de condução e manutenção de veículos. Em nota, a Casa diz que renovação é legal e gera economia aos cofres públicos
Na penumbra, o Senado prorrogou até 31 de maio de 2009 um contrato de R$ 5,4 milhões por ano que está sob suspeita de fraude. A Casa renovou com a Conservo Brasília Serviços Técnicos Ltda., que recebe R$ 456 mil por mês desde 2006 para prestar serviços de condução e manutenção de veículos.
No fim de março deste ano, a empresa e três servidores do Senado foram denunciados pelo Ministério Público Federal em Brasília à Justiça Federal por improbidade administrativa. Todos são acusados de fraudar essa e outras licitações na Casa.
A Conservo já responde desde 2007 a uma ação criminal por lesar concorrências na esfera pública. Tudo começou em 2006, quando ela foi alvo da Operação Mão-de-Obra da Polícia Federal, que desmontou uma quadrilha que teria criado um esquema de corrupção nos procedimentos de contratações. Daquela operação, saíram as denúncias do MPF que levaram à abertura da ação criminal e que podem abrir caminho para um processo por improbidade administrativa.
O contrato sob suspeita terminaria no ano passado, mas foi prorrogado até 31 de maio deste ano na gestão de Renan Calheiros (PMDB-AL) no comando do Senado. A Casa, agora presidida por Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), decidiu renovar o contrato por mais 12 meses. A decisão foi publicada no Diário Oficial da União e conta com a assinatura do primeiro-secretário do Senado, Efraim Morais (DEM-PB), e do dono da Conservo, Victor João Cúgula, que passou 22 dias preso na época da operação da PF.
Em março, o Senado já havia renovado até 2009 um contrato de R$ 2,2 milhões com a outra empresa acusada de fraudar as licitações na contratação de mão-de-obra: a Ipanema Serviços Gerais. Segundo o MP, ela e a Conservo corrompiam servidores públicos ligados às concorrências e as demais empresas interessadas nas licitações. A denúncia à Justiça pede a anulação dos contratos e a devolução de R$ 36,8 milhões aos cofres públicos.
Cuidado
A lei de licitações permite a prorrogação desse tipo de contrato por até cinco anos. A renovação é legal, mas, neste caso, pode ser imoral. O procurador da República no Distrito Federal José Alfredo Silva, que participou das investigações em 2006, lembra, por exemplo, que o Senado poderia não renovar com a empresa sob suspeita e abrir nova licitação. “A administração pública tem que ter o cuidado de analisar a situação da empresa e não fechar os olhos. Deveria abrir uma nova concorrência. A lei faculta a prorrogação, mas não a obriga”, explica ele, que fez a denúncia criminal contra os envolvidos. “O que posso dizer é que ficou comprovada a prática de crime por essa empresa”, ressalta.
Procurado, o Senado enviou ao Correio uma nota assinada pelo seu advogado-geral, Alberto Cascais. No documento, ele reafirma que a lei permite a prorrogação do contrato e diz que ainda ninguém foi condenado. Segundo o advogado, a concorrência foi feita dentro da legalidade e a renovação teve como objetivo economizar para os cofres do Senado. Os donos da Conservo e da Ipanema não foram localizados para comentar o assunto.
Ontem, o Correio revelou a suspeita de tráfico de influência em licitações vencidas no Senado pela Construssati Serviços e Construções Ltda. A empresa pertence ao estudante de direito André Scarassati e sua mãe, Maria Regina. Ela e seu marido, José Alcino Scarassati, ex-coordenador político do Ministério das Cidades, já trabalharam no Senado.
Aumento de suplentes
O presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), não esconde o constrangimento com o aumento de suplentes sem voto nas vagas de senadores titulares. Ontem, mais um assumiu o cargo: Casildo Maldaner (PMDB-SC). Por quatro meses, ele ocupará a vaga do titular, Raimundo Colombo (PMDB-SC), que se licenciou para ajudar o partido nas eleições municipais em Santa Catarina.
Abordado sobre o tema, Garibaldi admitiu que o senador titular tem mais “condições” de exercer o mandato. “Os titulares, de fato, têm melhores condições de votar”, afirmou, tentando, logo em seguida, consertar a frase para evitar um mal estar com os colegas. “Mas os suplentes, quando aqui chegam, também estão investidos do mandato. A presença deles não provoca qualquer alteração nas votações”, afirmou.
A legislação eleitoral diz que o candidato ao Senado escolhe seus dois suplentes para compor a chapa. Em caso de licença, cassação ou morte do titular, um deles assume a vaga, mesmo não tendo recebido um só voto para isso.
Com a posse de Casildo Maldaner ontem, já são 18 suplentes no Senado. Esse número pode aumentar se os senadores Fernando Collor (PRB-AL) e Kátia Abreu (DEM-TO) confirmarem a expectativa de deixar o cargo por alguns meses. No ano passado, Collor já havia feito isso. E pode repetir novamente, desta vez para ajudar o PTB em Alagoas.
Desde o ano passado, o Senado vem discutindo alterações na legislação sobre os suplentes. Em abril deste ano, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou proposta que altera as regras vigentes. Relator das emendas constitucionais sobre o tema, o senador Demostenes Torres (DEM-GO) tentou emplacar uma proposta ousada. Ele queria que o senador fosse substituído pelo candidato mais votado depois dele, entre aqueles que concorreram e não foram eleitos. A presença de quase 20 suplentes, porém, acaba inviabilizando mudanças mais drásticas. A pressão foi grande.
A alteração mais significativa aprovada pela CCJ prevê apenas que, em caso de cassação, renúncia ou morte do titular, o substituto assumirá o posto até a escolha de novo político nas eleições seguintes, sejam gerais ou municipais. A definição do reserva, no entanto, continuará a ser feita sem voto, por indicação do titular.
A votação agora precisa passar pelo plenário do Senado e, depois, seguirá para a Câmara. Ou seja, não há, por enquanto, qualquer garantia de que os senadores sem voto continuarão a perambular diariamente pelo Congresso.
Mudanças
Alguns deles, aliás, têm tido papel relevante na Casa, como João Pedro (PT-AM), Valter Pereira (PMDB-MS) e Wellington Salgado (PMDB-MG). O presidente do Senado, porém, pediu agilidade na aprovação das mudanças nas regras. “É preciso acelerar as coisas”, afirmou Garibaldi.
Recentemente, um dos suplentes de maior atuação acabou deixando o Senado. Depois de cinco anos na cadeira de titular, o petista Sibá Machado (AC) teve que devolver a cadeira a quem foi eleito, no caso, Marina Silva (PT). Ela deixou o Ministério do Meio Ambiente e retornou ao Senado. Sibá ficou sem emprego e busca se encaixar em alguma vaga no governo do Acre. (LC)