Movido pela cautela, diante dos sinais — ainda frágeis — de recuperação da economia, que, mais à frente, pode estimular a inflação, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) reduziu ontem o ritmo de queda da taxa básica de juros (Selic). Em vez do 1,5 ponto percentual registrado em março, ele optou pela redução de um ponto, de 11,25% para 10,25% ao ano, conforme consenso do mercado financeiro. Mesmo assim, a Selic desceu ao menor nível da história e, muito provavelmente, atingirá, em junho, 9,75%, conforme prevê a maioria dos especialistas. O BC, no entanto, não se comprometeu com nenhuma direção para os juros. No comunicado pós-reunião do Comitê, limitou-se a ressaltar que o recuo da taxa tinha como objetivo “ampliar o processo de distensão monetária”.
Logo cedo, em um café da manhã, o presidente do BC, Henrique Meirelles, já havia sinalizado ao presidente Lula que não tinha como a Selic cair para um dígito na reunião de ontem do Copom, como torcia todo o governo. Na conversa, Meirelles traçou um quadro bastante favorável para a economia, que, na sua visão, crescerá a um ritmo de 3% a 4% no fim deste ano. O presidente do BC afirmou ainda que há um amplo espaço para os juros continuarem caindo nos próximos meses, pois o Brasil está avançando muito abaixo de seu potencial, devido aos estragos provocados pela crise mundial.
No últimos anos, as empresas fizeram grandes investimentos, a capacidade de produção aumentou muito, reduzindo as pressões por reajustes de preços num quadro de demanda mais firme. Ou seja, tudo indica que a inflação permanecerá dentro das metas por um bom tempo. “A Selic de um dígito está muito perto. É só agirmos com cuidado, sem pressa”, disse Meirelles, segundo assessores de Lula. Quando assumiu o comando do BC, em janeiro de 2003, em meio a um grave processo inflacionário, Meirelles comandou a alta da Selic para até 26,5% ao ano. “A ordem de Lula foi para não criticarmos o BC”, ressaltou o mesmo assessor.
Para o Palácio do Planalto, o importante é que o Brasil finalmente deixou a liderança mundial do ranking dos juros. A taxa real, que desconta a inflação projetada para os próximos 12 meses, recuou para 5,8%. O país caiu para a terceira posição, sendo superado pela China (6,6%) e pela Hungria (6,4%).
Decepção
Na avaliação da economista-chefe do Banco Fibra, Maristella Ansanelli, o BC optou pela cautela, esperando por sinais mais consistentes de retomada da atividade, o que deve ocorrer em junho. “Mas esse movimento menos agressivo também reflete o temor do BC com o forte aumento dos gastos públicos, um perigo para a inflação quando a produção e o consumo recuperarem o fôlego”, destacou. Para Flávio Serrano, economista do Banco BES Investimento, a tendência é de o Copom promover apenas mais um corte da Selic, de 0,5 ponto, com a taxa se mantendo estável pelo menos até o fim de 2010.
Segundo Tomás Goulart, economista da Modal Asset Management, há espaço para os juros continuarem caindo até julho, para 9,25%. “A Selic poderia ter caído mais do que um ponto, pois a crise mundial afastou quase todos os riscos que rondavam o país, inclusive o de repasse da forte alta do dólar para os preços”, frisou. “Mas 10,25% de taxa ao ano deve ser comemorado. Em outras crises, o Brasil era obrigado a dobrar os juros. Agora, a Selic tem mirado sempre para baixo”, emendou. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, não se entusiasmou muito. “A queda de um ponto foi positiva. Mas era preciso mais, pois os níveis de produção, de emprego e de crédito ainda permanecem abaixo dos níveis pré-crise”, disse.
Para o presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzário, a decisão do Copom foi uma “grande decepção”, porque pouco contribui para a retomada do crescimento. “Não adianta só contar com o varejo (consumo) para manter a economia funcionando”, afirmou. O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, assinalou que a falta de ousadia do BC custará mais empregos e menos produção.
Redução nos bancos
A redução de um ponto percentual na taxa Selic levou os grandes bancos a anunciarem a diminuição nos custos de empréstimos. Na Caixa, o corte alcançou 26 linhas, com destaque para o crédito consignado, com redução de 31% na taxa mensal. “Essa é a quinta queda de juros promovida pela Caixa neste ano”, disse o vice-presidente de Finanças da instituição, Márcio Percival. “Se a Selic continuar caindo, temos condições de baratear mais as nossas operações de empréstimos”, afirmou.
O Banco do Brasil, já sob o comando de Aldemir Bendine, nomeado com a missão de forçar a baixa dos juros, repassou integralmente a queda da Selic para boa parte de suas linhas, como o cheque especial e o cartão de crédito. No Bradesco, a taxa máxima do cheque especial recuou de 8,44% para 8,36% ao mês.