O prefeito do Rio, Cesar Maia, propôs um acordo ao regime militar para deixar o exílio no Chile e voltar ao Brasil com a família, no início dos anos 70. Sua mãe, Dalila Ribeiro Almeida Maia, foi mensageira da proposta, segundo um telegrama diplomático enviado ao Itamaraty pelo embaixador brasileiro no Chile, Antônio Cândido da Câmara Canto.
No documento secreto obtido pela Folha, o diplomata relata uma audiência na embaixada no dia 1º de dezembro de 1972. "A senhora Almeida Maia veio ao Chile para visitar Cesar Maia, que aqui reside há cerca de três anos e meio, como refugiado político", informa Câmara Canto. "Disse-me que seu filho Cesar está "inteiramente desencantado com a política e o esquerdismo" e deseja regressar definitivamente ao Brasil", acrescenta. No relato do embaixador, Dalila afirma que o filho está "em péssima situação psicológica" e "disposto a assinar qualquer tipo de compromisso no sentido de demonstrar seu arrependimento e sua firme intenção de abandonar quaisquer atividades políticas".
A par da situação legal de Maia, que fugira para o Chile aproveitando um habeas corpus, Câmara Canto se dispõe a transmitir à Secretaria de Estado o pedido. Ele ressalta o temor de Dalila sobre a possibilidade de o filho ser preso ao voltar: "Disse-lhe que seria muito difícil que tal não ocorresse".
O embaixador, que ganhou da esquerda o aposto de "Quinto da Junta" -tal a dedicação em perseguir opositores em solo chileno-, não se restringe a relatar o encontro. Utilizando-se de linguajar policial, dá detalhes sobre o roteiro de Dalila. "Deverá regressar na próxima terça-feira e, muito provavelmente, procurará acompanhar, com seu marido, Felinto Epitácio Maia, alto funcionário da empresa Klabin, o andamento do assunto", escreve.
Dalila morreu no dia 4 de março, aos 92 anos. Questionado pela Folha, Cesar Maia disse desconhecer a reunião da mãe com o embaixador. Negou qualquer acordo e estimou que os relatos seriam parte da estratégia do advogado da família, Heleno Fragoso, para sua volta ao Brasil. Fragoso morreu em 1985, aos 59 anos. Em 1973, Maia deixou o Chile rumo a Lisboa, onde ficou por oito meses antes de voltar ao Brasil.
Para além das contradições, a reportagem descobriu que os movimentos de Maia e sua família foram alvo de monitoramento do serviço secreto do Itamaraty. O Centro de Informações do Exterior (Ciex) tinha a ficha completa, com data de nascimento, número de passaporte, endereços no Rio e na capital chilena e os nomes da mulher, dos pais e dos filhos.
O informe 149, de 8 de março de 1972, mostra como o consulado do Brasil em Santiago recusou-se a prorrogar o passaporte do "subversivo". O informe 661 fala de uma outra visita de Dalila em outubro de 1972. "A marginada está hospedada na residência de seu filho, à rua García Pica, número 7214."
Em 2001, Maia denunciou Câmara Canto por apoiar o golpe contra o presidente chileno Salvador Allende, em 1973. A denúncia levou o então presidente, Fernando Henrique, a pedir uma revisão dos arquivos do Itamaraty. O caso foi engavetado. No apagar da luzes de seu governo, FHC assinou decreto ampliando o sigilo de todos os arquivos secretos. Da Folha