Enquanto a prefeitura reluta em manter os postos de saúde abertos 24 horas, conforme decisão judicial, a CPI da Cidade da Música aberta na Câmara Municipal vai apurar nesta semana, entre outros indícios de superfaturamento, se parte da verba da Secretaria Municipal de Saúde teria sido usada para acelerar a conclusão da obra. Diante da matéria do JB que mostrou o ritmo acelerado da obra faraônica, médicos e moradores da Barra da Tijuca criticaram a postura da prefeitura. Apesar da epidemia, Cesar Maia continua tendo a Cidade da Música como prioridade de seu governo. Ontem, enquanto a obra prosseguia ininterruptamente, quem trabalhou foi a própria população: em menos de uma hora, mais de 10 focos foram encontrados em terrenos do bairro Jardim Oceânico, próximo à construção.
A caçada contra os focos do mosquito foi uma empreitada do presidente da Federação das Associações de Moradores da Barra da Tijuca, Luiz Igrejas, e do presidente da Associação de Moradores Jardim Oceânico, Eric Faria.
Quem deveria estar fazendo isso são os operários da Cidade da Música – reclama Igrejas. – Entendemos os bons fins do projeto, mas o dinheiro poderia ser gasto no combate à dengue e também com as promessas de campanha, como melhoria na infraestrutura e transporte do bairro. Acredito seriamente que o Cesar Maia está cansado de ser prefeito.
O presidente do Sindicato dos Médicos, Jorge Darze, vê ainda um lado positivo em meio à catástrofe.
As máscaras das autoridades caíram, ainda que às custas de quase 70 mortos – opina Darze. – O escândalo da Cidade da Música é uma constatação inequívoca das prioridades do governo. Seria um ótimo marketing para o ano de eleição, se não viesse a epidemia.
Da Saúde para a Cultura
Dos R$ 461,5 milhões gastos na Cidade da Música, parte dos recursos pode ter sido sugado do orçamento da saúde, educação e conservação da cidade. Levantamento feito pela Comissão de Orçamento da Câmara mostra que a Comlurb teria perdido R$ 9,5 milhões para a obra, a Secretaria de Transportes e a CET-Rio teriam contribuído com R$ 5 milhões e a Rioluz com outros R$ 3,3 milhões. Há ainda a suspeita de que a verba da saúde tenha sido usada, mas a informação será checada pela CPI na sexta-feira, quando prestarão depoimento a secretária municipal de Fazenda, Fátima Machado Barros, e o presidente da Rio Urbe, João Luiz Reis.
Esperamos que tudo isso seja explicado a partir dos documentos que deverão ser apresentados na próxima audiência – conta o presidente da CPI, Carlo Caiado (DEM).
Os secretários apresentarão o estudo de viabilidade econômica da obra. A prefeitura, porém, só contratou uma empresa para realizar esse estudo no ano passado, cinco anos depois do início da obra e depois de já ter consumido cerca de R$ 300 milhões. O relatório apontou que as receitas não seriam suficientes para cobrir as despesas.
O vereador Eliomar Coelho (PSOL) acusou a CPI de ser chapa-branca, uma vez que os membros são compostos por políticos do mesmo partido do prefeito. O vereador Carlo Caiado defendeu a Cidade da Música como um dos projetos prioritários para o Rio, embora tenha também defendido os postos 24 horas.
Uma coisa não tem nada a ver com a outra – explica Caiado. – O projeto da Cidade da Música é prioritário para um município da importância do Rio. Mas eu, como vereador, também dou apoio total à abertura dos postos de saúde durante 24 horas.
Desde que a CPI foi criada, os vereadores ouviram o secretário municipal das Culturas, Ricardo Macieira, e o secretário de Obras, Eider Dantas. Segundo eles, o custo inicial de R$ 80 milhões era previsto apenas para a primeira etapa do projeto.