De tonto na indústria do petróleo já não há nem os xeques que nos anos 80 compravam pelo triplo do valor castelos na Europa. Depois de falar demais, usurpando do presidente Lula o papel de porta-voz de um megacampo de petróleo — e se não foi isso é porque não havia o que divulgar —, o diretor-geral da ANP, agência de regulação do setor, Haroldo Lima, espera indulgência pelo que fez.
O problema não está no que revelou — avaliações preliminares da Petrobras —, mas ter revelado. Em sua indiscrição, ele afirmou em um seminário no Rio que um campo da área chamada Pão de Açúcar na Bacia de Santos poderia ter potencial de 33 bilhões de barris de petróleo, mais de quatro vezes a estimativa do megacampo de Tupi, que lhe é próximo, anunciada em novembro pela Petrobras. Seria a maior descoberta no mundo em 30 anos.
As possibilidades do lençol petrolífero em águas profundas, na camada de pré-sal da plataforma oceânica do país, são tão vastas, e tão complexas as exigências para viabilizar a sua exploração em termos de tecnologia, investimentos e logística de processamento, dada a distância da costa, além dos desdobramentos geopolíticos, que o assunto funde as cabeças da Petrobras e do governo.
O país tem hoje, incluindo Tupi, cujo potencial está estimado em 5 a 8 bilhões de barris, além de gás, reservas pouco acima de 22 bilhões. A conformação geológica de Tupi se repete em quase toda a costa, o que levou ainda em novembro o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, a falar em reservas potenciais totais de 70 bilhões a 100 bilhões de barris, mais que o estoque a explorar da Nigéria e equivalente ao da Venezuela (100 bilhões).
As estimativas globais, portanto, já eram conhecidas, não tendo o ex-deputado pelo PCdoB da Bahia que se desculpar alegando que os dados que revelou estavam numa revista americana. Ou que “todo mundo está cansado de saber que há um lençol petrolífero que vai de Santa Catarina a Alagoas com trilhões de barris”.
Ninguém está cansado de nada, porque o assunto é sigiloso dentro da estatal e no governo, o que Lima não respeitou. Não se sabe se vai até Alagoas. E a medida é de bilhões de barris, não trilhões.
Mundo turbulento
Um tema dessa grandeza, que insere o Brasil no turbulento mundo da indústria do petróleo, não é para ser discutido em seminários por um funcionário de segundo escalão. Nem gerar o bate-boca a que apelou o diretor da ANP no dia seguinte ao comparecer à Comissão de Economia do Senado para tratar do rateio de royalties em favor de estados e municípios do “novo” petróleo, algo cuja extensão nem sequer é ainda conhecida. Lima não tem delegação para discutir royalties, um tema exclusivo do Executivo e do Congresso, não de agências regulatórias, que cuidam de fiscalizar a aplicação, pelas empresas reguladas, caso da Petrobras, do que foi deliberado.
Muita desinformação
Mas ele se vê como “autoridade” e membro do governo, só faltando aplicar uma carteirada. Por autoridade ele entende imunidade, pois disse não ser “subordinado” à Comissão de Valores Mobiliários, que regula a divulgação de informação relevante de empresas abertas, caso da Petrobras. Por membro do governo, Lima manifesta não ver a ANP como órgão do Estado, por isso ele tem mandato, o que o impede de ser demitido pelo governante da hora. É muita desinformação.
Royalties pelo ralo
Tudo o que o governo não quer é chamar atenção para a riqueza do pré-sal, já que não tem ainda uma estratégia interna e externa ao que fazer com esse petróleo. O mais urgente é a divisão da riqueza no país, que não pode virar royalties e empreguismo em uns poucos municípios. A idéia é que sua aplicação favoreça toda a sociedade, viabilizando problemas como o da Previdência e da expansão da oferta de energia elétrica e logística. Já há quem estude um modelo a ser proposto ao governo. Mas falta precisar o que esconde o pré-sal.
A rigor, a questão do petróleo do pré-sal nas dimensões supostas é problema de Estado maior, que transcende a Petrobras e todas as instâncias de energia e financeiras do governo. Caso exista nas dimensões estimadas pela Petrobras, dinheiro não será problema.
O que países importadores mais querem é diversificar suas fontes de fornecimento e cortar a dependência de fornecedores habituais. A maioria é de governos hostis ou de regiões instáveis. Exemplos: o Golfo Árabe para os EUA, Europa e China; o gás da estatal russa Gazprom para os países europeus — já usado como arma política pelo governo de Vladimir Putin; e a Venezuela de Hugo Chávez em relação aos EUA. Desse complexo jogo de interesses deverá sair o que será melhor para o Brasil. Mas não há fórmula que agrade a todos.
Pesadelo de Chávez
O Brasil com expectativa de exportador de petróleo ameaça o sonho de hegemonia do “socialismo do século XXI” de Chávez na América do Sul. Esse é um dos aspectos. Outro é que o petróleo farto para boa parte dos países agraciados com essa dádiva se converteu num duro pesadelo. Esse é um risco não desprezível. Como também corre risco a expansão dos biocombustíveis. Tais questões estão sem respostas.
Discordo de você, o Haroldo de Lima prestou um grande serviço ao Brasil. Somente quem não conhece a história do Haroldo de Lima pode pensar assim. A bem da verdade, o Haroldo Lima é um grande brasileiro, desses de verdade, além de muito preparado. Ele não falou tolice alguma, nem se precipitou. Sua declaração vem na defesa das riquezas nacionais, tirando o nosso petróleo das garras dos entreguistas da PetrobraX. Viva Haroldo de Lima, o mercado que se dane! Acho melhor você repensar o que disse. Abraços. Pedro Ivo