Época num. 0515
31/3/2008
Dilma Rousseff admite vazamento de informações, mas nega que o governo tenha bisbilhotado dados de FHC
ÉPOCA – A senhora diz que não existe dossiê, mas vazamento de informações sigilosas. O que lhe dá segurança para afirmar isso?
Dilma Rousseff – Vocês estão carecas de saber que existe vazamento de informações. Quero entender por que esse vazamento é um dossiê. Falar em dossiê é como dizer que fizemos algo ilegal. Não estamos fazendo nada ilegal. Nós estamos montando um banco de dados com todos os gastos das contas tipo B (usadas para pagar despesas de pequeno valor feitas por funcionários do governo, pelo presidente e sua família). Falar que é dossiê é uma tentativa de politizar.
ÉPOCA – A senhora diz que os documentos reproduzidos vazaram da Casa Civil. Como sabe?
Dilma – Pela forma como os dados estão distribuídos: o empenho, o número do processo etc. É algo que precisa ter aquele formato para poder botar em nosso banco de dados.
ÉPOCA – Quantas pessoas trabalham nessa operação?
Dilma – São dez pessoas, mais ou menos.
ÉPOCA – Todas continuam trabalhando?
Dilma – Continuam.
ÉPOCA – A senhora não interrompeu o trabalho mesmo com a suspeita de que há pessoas ali vazando dados?
Dilma – Não acreditamos que alguém vai vazar novamente. Se alguém foi incauto e vazou antes, o risco de ser descoberto agora é outro. Agora, não suspeitamos só deles, não. O fato de as pessoas trabalharem ali não significa que são suspeitas. É isso que a comissão de sindicância vai ver.
ÉPOCA – Mas é certeza que as informações passaram por essas pessoas...
Dilma – É uma hipótese. Vamos investigar outras possibilidades.
ÉPOCA – Quais?
Dilma – A informação e o documento (que vazaram para a imprensa) não são literais. Tem coisa que não tem nada a ver com aquele relatório. O que mostraram são quatro trechos. Alguns podem ser nossos. Outros, achamos que não são. Por exemplo: a Casa Civil não tem acesso a nenhuma das contas da Abin (Agência Nacional de Informação). Outra coisa: os dados de qualquer ministro de Estado são públicos, não temos nada a ver com isso.
ÉPOCA – Por que não?
Dilma – Porque são dados públicos. O dado do ministro Aloizio Ferreira (despesas com hotel), por exemplo, é dado público. Os fragmentos de dados que dizem respeito a gastos do presidente da República e sua família são dados da Casa Civil. Só podem ter saído dali. Se não saiu do relatório digitado, saiu de dentro do relatório de pagamentos. Estão localizados na Casa Civil, é disso que temos certeza absoluta.
ÉPOCA – Isso não aponta para seus funcionários?
Dilma – Temos um arquivo morto. Alguém pode ter ido ao arquivo morto e formatado aquilo. São 4 mil funcionários.
ÉPOCA – O ex-presidente FHC disse que abre mão do sigilo sobre seus gastos na Presidência. Vocês farão o que ele diz? Dilma – A questão não é uma declaração pessoal de abrir ou fechar. Os dados são relativos ao cargo. É o cargo que tem de ser protegido. Não é uma decisão individual. Ele podia, se fosse presidente da República, enviar uma medida para abrir todos os seus dados sigilosos. Ele não fez na época em que era presidente.
ÉPOCA – Qual é o problema de segurança no fato de o país saber que tipo de vinho o presidente serve? Isso tem de ser sigiloso?
Dilma – Essa restrição é baseada em questões de segurança. É o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência que dá parecer sobre isso naquele documento do TCU (lendo). “Vale destacar também que nem sequer os valores globais das despesas devem ser divulgados, porque o valor global do gasto com munição, alimentação, hospedagem e deslocamento presta-se à mensuração do contingente de homens envolvidos na segurança presidencial”. Se você faz a conta de quanto gastou, sabe quantos agentes de segurança são.
ÉPOCA – A senadora Ideli Salvatti (PT-SC) insinuou que o motivo da confusão seria sua possível candidatura em 2010... Dilma – Pelo amor de Deus. Se alguém tiver segundas intenções, não sei. Não atiro a primeira pedra.
ÉPOCA – Mas a senhora acha que há uma intenção eleitoral nesse caso?
Dilma – Enquanto as pesquisas (de opinião, com bons resultados para o presidente Lula) continuarem assim, vai haver gente inventando dez dossiês por dia. A disputa política é legítima numa democracia. Só não acho legítima a disputa política rebaixada.