domingo, 30 de abril de 2006

Alckmin, um candidato à procura de um discurso


Alerta Vermelho

Além de problemas no PSDB e na aliança com o PFL, Geraldo Alckmin não consegue apresentar projetos que não sejam variantes do que o governo Lula já implementa. Em baixa nas pesquisas, não sensibiliza novos aliados.

Gilberto Maringoni - Carta Maior

Se acontecesse num partido de esquerda, as manchetes seriam: “Racha”, “Dissidência”, ou “Cisão”. Como trata-se do PSDB, a imprensa pisa em ovos.

A candidatura Alckmin enfrenta uma séria crise. Não apenas por não conseguir índices mais encorpados nas pesquisas eleitorais, mas por enfrentar um preocupante bater de cabeças entre aliados, apoiadores e simpatizantes.

Pela ordem. Primeiro, a base de apoio do governo tucano-pefelista em São Paulo, que lhe garantiu invulnerabilidade diante de denúncias variadas, trincou claramente. Segundo, os descontentamentos dentro do PSDB, com a derrota interna de José Serra, geraram feridas difíceis de cicatrizar. Terceiro, o aliado preferencial, o PFL, que não brinca em serviço, resolveu retardar ao máximo a escolha de um candidato a vice na chapa nacional.

Como pano de fundo, duas das mais importantes lideranças peessedebistas, Fernando Henrique Cardoso e José Serra, saíram de cena há três semanas. Da parte do ex-prefeito paulistano, o motivo anunciado foi uma cirurgia de urgência. Da parte do ex-presidente da República, não há explicação convincente.

MOTIVOS MAIS PROFUNDOS

Nada indica que sejam apenas essas as causas dos problemas. Se fossem, a solução, embora difícil, seria encontrada em pouco tempo. Os motivos são um tanto mais profundos e dizem respeito ao próprio funcionamento da institucionalidade brasileira recente.

O caso remonta às negociações entre o governo FHC e os candidatos à sua sucessão, no início do segundo semestre de 2002. Diante de uma gravíssima crise cambial e de fuga acelerada de capitais, a gestão tucana tratou de administrar o prejuízo de duas formas. A primeira foi obter uma linha de crédito de US$ 41 bilhões ao Fundo Monetário Internacional. A segunda foi fechar um acordo para que os candidatos Lula (PT), Garotinho (PSB), Serra (PSDB) e Ciro Gomes (PPS): caso eleitos, poderiam fazer o que quisessem, menos tocar no essencial, o modelo econômico neoliberal.

No âmbito petista, o acerto materializou-se na Carta aos Brasileiros. Obtida a adesão, o tucanato deve ter se achado muito esperto, pois eternizaria a política de altos juros, superávits primários, arrocho fiscal e financeirização da economia. Só que a manobra teve um preço: perderam a franquia de uma orientação cujo copyright, na verdade, não lhes pertencia. Agora não têm discurso original de campanha. Tudo o que falam ou planejam parece uma variação do programa que o governo Lula materializa. O senador Aluízio Mercadante chegou a dizer recentemente que o PSDB não apresenta projeto para o país. É verdade, a orientação agora está em outras mãos.

PROBLEMAS CONCRETOS

Na Assembléia Legislativa de São Paulo, Alckmin vive a situação de um ex-super-herói das elites que encontrou sua kryptonita. A invulnerabilidade ética se dissolveu na última semana, através de dois depoimentos na Comissão de Finanças e Orçamento. Convidados a depor, graças a um cochilo da bancada do PSDB, aliado à insatisfação de setores do PFL, do PMDB, além da oposição do PT, o atual presidente do Banco Nossa Caixa, Carlos Eduardo Monteiro, e o ex-gerente de Marketing, Jaime de Castro Júnior, expuseram as fragilidades dos ocupantes do palácio dos Bandeirantes. O caso envolve a manutenção de contas de publicidade sem contrato, suspeitas de favorecimento e uso da caixa 2. Castro Jr. acusa a direção do banco de violação de seu sigilo bancário e de montagem de esquema através das contas de propaganda.

O depoimento, na quarta feira, 26, foi tão contundente, que o líder do PFL, Edir Chedid, e o deputado Romeu Tuma Jr. (PMDB) insistem agora na convocação de uma CPI para examinar o caso. Com isso, Alckmin corre não apenas o risco de perder a aura de guardião dos bons costumes na área dos bens públicos, como aparece como maior responsável por varrer vestígios incômodos para baixo do tapete.

Nas negociações com o PFL, a coligação sofreu abalos. As costuras para os palanques regionais – especialmente na Bahia e no Rio de Janeiro – fizeram com que o prefeito do Rio de Janeiro literalmente chutasse o balde, e dissesse, na segunda-feira, 24, que talvez a aliança não fosse interessante. Aparentemente a crise amainou, mas o partido jogou para adiante a escolha do vice da chapa, esperando a conjuntura eleitoral ficar mais clara. Entenda-se por isso a melhoria de Alckmin nas pesquisas.

EM BUSCA DA “LINHA JUSTA”

O ex-governador paulista, por sua vez, não consegue encontrar a “linha justa” de campanha, como diriam antigos esquerdistas. Sua campanha ora critica o governo Lula por ser frouxo no ajuste fiscal e de adotar uma excessiva “gastança” de recursos necessários á estabilidade econômica, ora procura costurar um incerto programa “desenvolvimentista. O jornal “O Estado de S. Paulo”, claramente inclinado pela postulação do ex-prefeito de Pindamonhangaba, afirmou, em 19 de abril: “O programa econômico do pré-candidato (...) será um forte ajuste fiscal, com expressiva elevação do superávit primário, como ocorreu em 2003, e centrado nos gastos correntes do governo”. Ou seja, anunciou que vai administrar pacotes de maldade, numa conjuntura em que prefeitos e governadores se debatem para obter mais recursos do governo federal visando fechar suas contas.

DE REPENTE, O DESENVOLVIMENTISMO

Na semana seguinte, dia 24, o governo Lula anunciou a liberação de R$ 550 milhões para as administrações municipais investirem em merenda escolar e investimentos gerais. Apesar de pequena, em relação ao tamanho do país, a sinalização foi na direção oposta ao pregado pelo PSDB. Alckmin correu atrás e, em discurso a prefeitos de todo o país durante a 9ª Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, propôs aumentar de 22,5% para 23,5% o reparte do Fundo de Participação dos Municípios.

No mesmo dia, o economista Yoshiaki Nakano, possível coordenador do programa de governo tucano, acentuou a necessidade de se apontar uma política de investimentos para o próximo governo. "Precisamos recompor o Estado desenvolvimentista. Não precisamos mais ter vergonha de ser desenvolvimentista. Até pouco tempo, quando se falava em desenvolvimentismo, você era pichado de toda forma. Agora, já tenho até coragem de falar que precisamos de um Estado desenvolvimentista", declarou ele à Folha de S. Paulo. Embora seu caminho rumo ao desenvolvimento passe pela redução da proporção da dívida pública com o PIB dos atuais 50% para 30% através da adoção do déficit nominal zero – um aumento do arrocho fiscal -, é nítido o discurso que se tenta a partir de agora. Investimento, desenvolvimento são palavras banidas do Ministério da fazenda há uma década e meia. Há espaço vago na conjuntura para um discurso dessa natureza. Mas é duvidoso que o PSDB, marcado pelas políticas contracionistas, de juros altos e de privatizações, que consagrou a média anual de crescimento do PIB ao redor de 2,3%, nos anos FHC, consiga convencer a opinião pública de seu novo mote.

Sem discurso definido e com dificuldades internas, a candidatura Geraldo Alckmin enfrenta turbulências na decolagem. Um dos problemas mais sérios é o fato de José Serra ser, aos olhos do empresariado, mais identificado com essa orientação desenvolvimentista. E foi derrotado.

O ex-prefeito paulistano reapareceu publicamente na quinta-feira, 27. Foi a um jantar destinado a arrecadar fundos para a campanha de seu adversário interno. Os convites foram negociados a R$ 2 mil por cabeça. Chegou e não encontrou Geraldo Alckmin. Esperou meia hora e se retirou, deixando o cheque. O esforço agora é que encontrem pelo menos uma diretriz comum de campanha.

Da Agencia Carta Maior

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