terça-feira, 13 de setembro de 2005

De Benedita a FHC



Sebastião Nery
Tribuna da Imprensa
11 de novembro, 2003


Carlos Castelo Branco ético e cético, dizia que falar em "ética na política" seria como falar em "estética na política" contra feios na vida pública.
Mas não é por isso que os políticos estariam dispensados da ética. Agora, é oficial.
O mais categorizado porta-voz tucano na imprensa, Merval Pereira, contou domingo no "Globo": "O ex-presidente Fernando Henrique estará em Washington até o fim do ano, com uma bolsa (!) da Biblioteca Nacional (!) para escrever um livro". Está lá desde setembro e só volta em janeiro. Biblioteca Nacional Por causa de R$ 4,5 mil reais de duas passagens oficiais de avião para ir a Buenos Aires participar de uma "oração" em um congresso evangélico, quase a ministra Benedita da Silva ("mulher, negra e favelada") foi apedrejada em praça pública, como se faz na Nigéria. E quem comandou o coro do apedrejamento "ético" foi o PSDB de FHC.
O brilhante e dançante ministro da Cultura, Gilberto Gil, e o bravo e pugiloso líder tucano no Senado, Artur Virgilio, estão no dever de explicar ao País, hoje mesmo (nem um dia a mais), essa história da bolsa de Washington.
Como foi que a Biblioteca Nacional, órgão público do Ministério da Cultura, concedeu uma bolsa de quatro meses para o ex-presidente Fernando Henrique ir para Washington escrever um livro? De quanto é a bolsa? Comitê de ética Não se trata de picuinha política nem de cobrança de fato irrelevante. Saído da Presidência, Fernando Henrique é um cidadão como outro qualquer.
Para receber um polpudo e privilegiado financiamento do governo, é preciso que a decisão oficial esteja calcada na ética e cercada de toda legalidade.
Onde está o diligente Comitê de Ética do Planalto, que, no caso da ministra Benedita, agiu a galope? É ou não é, esse, um caso de ética pública? Houve licitação? Por que a bolsa foi dada a ele e não a outro ou a outros? O PSDB certamente virá dizendo que é "uma honra" para a Biblioteca Nacional e o Ministério da Cultura financiarem o livro de um intelectual do estofo e do prestígio internacional de Fernando Henrique.
ele merece todos os encômios. Mas, para receber dinheiro público, tem que ser na lei.
E qual foi o trâmite burocrático, legal, dessa opípara prebenda? Rico e guloso Não se as razões da bolsa, não sei o valor da bolsa.
Mas se há um brasileiro que, direta ou indiretamente, já embolsa todos os dinheiros públicos possíveis, é Fernando Henrique.
Pagar-lhe a mais uma bolsa é um escárnio. Ele já recebe uma aposentadoria plena por apenas doze anos (de 52 ao golpe de 64) de professor na Universidade de São Paulo.
Recebe mais uma aposentadoria por doze anos (de 82 a 94) de senador
E recebe uma terceira aposentadoria de ex-presidente da República. Todas corretas e legais. Somadas, as três devem ultrapassar o teto máximo constitucional de R$ 17.700 fixado pela reforma da Previdência e, como tal, receberão corte.
Mas isso não é problema para o ex-presidente, que os amigos dizem estar "confortavelmente rico", a ponto de haver comprado, há pouco, o luxuoso apartamento de mais de R$ 1 milhão de um banqueiro de São Paulo.
Como todo ex-presidente, Fernando Henrique tem ainda os motoristas e assessores permanentes, pagos com verbas públicas.
Eram quatro, e antes de deixar o governo ele aumentou para seis, com salários de até R$ 8 mil. Não pode dizer que a Pátria não lhe tem sido generosa.
Santander-Banespa Além de tudo isso, que a Pátria lhe dá, FHC tem a fundação que criou e dirige, com sede portentosa e mais de R$ 10 milhões em doações e contribuições do grande empresariado paulista. Sem falar na fiel e gratificada generosidade do grupo espanhol Santander, a quem ele doou a jóia da coroa paulista, o Banespa, e que agora financia suas palestras pela Europa.
E há mais. A ONU o fez conselheiro especial. Deve pagar-lhe, de algum modo, alguma coisa.
E o Grupo Polanco, dono do jornal espanhol "El Pais", monopolista do livro didático na Europa e Américas e sócio dos bancos Santander e Banespa, também o nomeou membro de seu Conselho Diretor. Sempre pinga mais uma grana. Mas, até aí, embora oblíquas, são as coisas legais. O que é totalmente nebuloso e até agora inexplicado é a deficitária, quase mendiga, Biblioteca Nacional, sem dinheiro sequer para modernizar, informatizar o acesso aos jornais antigos, ainda hoje feito pelo processo medieval de pequenas roldanas manuais, o financiar em Washington.
Mesmo que ele estivesse escrevendo uma nova Bíblia ou um novo "Capital", o governo que massacrou Benedita tem que dizer como é isso

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