A parceria de tucanos e democratas na oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva está cada vez mais arranhada. O estopim de discussões internas nos dois partidos é a estratégia de atuação no Congresso para enfrentar a cúpula do governo.
Nos últimos embates, parlamentares do DEM se esforçam para emplacar uma postura mais agressiva na linha de tiro dos oposicionistas. O PSDB, por outro lado, aposta na sutileza. A falta de sintonia, no entanto, deixa entre líderes dos dois partidos a suspeita de que a aliança pode não resistir até a sucessão presidencial de 2010.
A avaliação da cúpula tucana, depois de investir em artilharia pesada, é que para atingir o Palácio do Planalto é preciso buscar uma pauta impositiva de matérias de desinteresse dos governistas. A proposta teria sido costurada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e discutida com velhos caciques do DEM, como presidente de honra da legenda, Jorge Bornhausen.
A tentativa de afinar o discurso na prática não tem surtido efeito. Um dos exemplos é a negociação para a votação na Câmara do projeto que acaba com o fator previdenciário como cálculo das aposentadorias concedidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). DEM não aceita nem discutir o teor da matéria, enquanto do PSDB diz que é preciso chegar a um entendimento para a manutenção da responsabilidade fiscal.
Outro palco de intensos atritos da oposição é a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Cartões. Democratas acusam os tucanos de certa paralisia nas investigações para evitar a descoberta de que servidores do ex-governo Fernando Henrique possam ter cometido irregularidades. Parlamentares do DEM, inclusive, criticam a participação do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) no episódio do vazamento do dossiê com gastos sigilosos do casal Fernando Henrique.
Os tucanos também demonstram insatisfação com seus parceiros de oposição na CPMI. Acreditam que há uma sede para constranger o governo que acaba levando a sérias derrapagens no enfrentamento que acabam favorecendo os governistas. "Acredito que há sim um desencanto das duas partes, mas o importante é buscarmos afinar os discursos e as ações porque um racha não vai favorecer nenhuma parte", diz o líder da minoria de oposição no Senado, Mário Couto (PSDB-PA).
Para o líder do DEM na Câmara, Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), há divergências, mas também existe a preocupação, da parte dos dois partidos, para buscar uma oposição responsável contra a cúpula do governo.
"Não acredito em diferenças ideológicas, nós temos um programa político parecido", argumenta ACM Neto.
Quando a aliança entre os dois partidos se transporta para o campo eleitoral, o cenário que está sendo costurado para a corrida municipal também representa o descompasso.
Das 14 capitais em que o DEM pretende lançar candidatos, até este primeiro momento, o PSDB não demonstra pretensão de apoiar nenhum nome.
A principal separação ocorre em São Paulo. De um lado o DEM carimbou a reeleição do prefeito Gilberto Kassab. Os tucanos, mesmo sob a pressão do grupo do governador José Serra pró-Kassab, deram aval para Geraldo Alckmin disputar a cadeira. A idéia da cúpula do DEM era que Alckmin disputasse a sucessão de Serra no governo, enquanto o governador buscaria a Presidência. Alckmin ponderou o esquecimento do eleitorado.
"Não há nenhum problema, não houve nenhuma rebeldia contra o DEM, mas também temos que optar por nosso espaço", justifica o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE).
Entre as capitais que os democratas esperavam, mas não encontraram apoio tucano estão: Rio de Janeiro, em Porto Alegre, Florianópolis, Salvador, Aracaju, Recife, Fortaleza, Manaus, Belém, Palmas, Rio Branco, Boa Vista e Macapá. O que também chama mais atenção do DEM é que há casos de municípios em que o PSDB não tem um concorrente, mas também não pretende dividir o palanque com eles. Os democratas também ficaram incomodados com o fato de a direção do PSDB ter liberado a alianças com inimigos em plano nacional. Expectativa é de que o PT e PSDB vão tentar se coligar em cerca de 200 cidades do país nas eleições de outubro.
"É uma situação curiosa, mas cabe a cada partido, de acordo com seu plano político, com seu cenário local, definir isto", desconversa o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN).
Apesar de tratarem o tema com descrição para não acirrar os ânimos publicamente, líderes democratas reconhecem nos bastidores uma possível candidatura própria em 2010.
"Os tucanos não cedem espaço. Serra e Aécio (Neves, governador de Minas Gerais), já estão no páreo, então não há porque não partir para um vôo solo. E isso já é uma discussão real no partido", diz um integrante da Executiva do DEM que pediu para não ser identificado.
O presidente do PSDB acredita que é precipitado falar em 2010 e minimiza as críticas sustentando que a disputa eleitoral de outubro não terá reflexos nem no Congresso nem na sucessão do presidente Lula.
"As eleições municipais fazem parte de um sistema independente ao cenário de 2010. É preciso saber diferenciar isto. O DEM é e será o nosso principal aliado e não há porque criar tamanha rivalidade. Acredito que todos vão saber diferenciar estas duas realidades dos partidos no País", destaca Guerra.