Polícia Federal apura esquema de pagamento para políticos e caixa 2 em campanha de deputado estadual. Informações constam de agenda esquecida em uma mesa de restaurante da cidade de Salinas
Salinas -Esquecida na mesa de um restaurante de Salinas, a 661 quilômetros de Belo Horizonte, a agenda particular de Jefferson Soares Lucas, ex-chefe de gabinete do deputado estadual Deiró Moreira Marra (PR), tornou-se a principal peça de inquérito aberto pela Polícia Federal para investigar esquema de compra de votos e caixa 2 de campanha nas eleições de 2006, no norte de Minas .
A agenda, que também está sob investigação do Ministério Público Federal, mostra com detalhes como Deiró Moreira, empresário da área de transporte em Brasília e Patrocínio, no Alto Paranaíba, pagou cerca de R$ 800 mil, em 2006, a um grupo de políticos, em troca dos votos de eleitores pobres e analfabetos do estado. A bolada da compra de votos é bem superior aos gastos de campanha, de R$ 218 mil, declarados pelo deputado ao Tribunal Regional Eleitoral de Minas (TRE).
A agenda de Jefferson é uma bomba que começa a jogar estilhaços, mesmo antes de ser divulgada. Um dia depois de ser procurado em seu gabinete pelo Estado de Minas, em 29 de abril, Deiró exonerou Jefferson do cargo de assessor parlamentar da Assembléia Legislativa.
O voto de cabresto dos eleitores do norte de Minas, até hoje manipulado por coronéis da política, foi fundamental para a eleição do deputado. Desconhecido na região, Deiró, que nunca havia disputado uma eleição, conseguiu em menos de um mês 7,3 mil votos no norte de Minas, que correspondem a 33% dos 22 mil que obteve em todo o estado. De acordo com anotações na agenda do assessor, o deputado pagou de R$ 15 a R$ 40 por voto a políticos da região.
Segundo a agenda, em Rio Pardo de Minas, por exemplo, Deiró teria pago R$ 120 mil ao ex-prefeito Edson Paulino (PSDB) e ao filho, Bruno Paulino, por 3 mil votos, em duas parcelas: R$ 60 mil em 4 de setembro e a outra metade no dia 15 do mesmo mês.
Otimista com o poder de fogo do ex-prefeito, o assessor do deputado chegou a esboçar em sua agenda uma segunda proposta de compra de votos em Rio Pardo de Minas. Anotou o assessor em sua agenda: “ 7 mil votos. R$ 30 mais, excedente com valor de deságio, acertar”.
Também desconhecido em Rio Pardo de Minas, Deiró conseguiu obter, com ajuda do prefeito, 1.547 dos 15 mil votos válidos do município. “Como o acerto de dinheiro era de R$ 120 mil por 3 mil votos e depois da eleição só apareceram 1,5 mil, parentes do Deiró iniciaram briga pública verbal com a turma de Edson Paulino, em frente a um hotel da cidade. O desentendimento só terminou quando chegou a notícia de que os votos haviam ajudado a eleger o deputado”, afirmou o empresário Sérgio Lima, que garante ter presenciado a discussão.
De acordo com documentos obtidos pelo Estado de Minas, o assessor do deputado também se meteu em confusão no dia das eleições. Jefferson Soares foi preso em flagrante pela polícia de Rio Pardo, quando transportava em seu carro particular eleitores cooptados por Edson Paulino. A Justiça do município enviou o caso à Polícia Federal de Montes Claros, que instaurou inquérito contra Jefferson, por crime eleitoral.
Foragido
Investigado pela Polícia Federal por fraude na liberação de verbas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Edson Paulino contou que ele e outros políticos da região foram apresentados a Jefferson e Deiró pelo ex-prefeito de Taobeiras, Joel da Cruz dos Santos, que está foragido. A Justiça decretou a prisão preventiva do ex-prefeito, por aliciamento de meninas de 12 anos e tentativa de homicídio do ex- integrante do Conselho Tutelar de Taobeiras Ronaldo Silveira Saturnino.
“Foi o Joel que chegou com o Deiró na região. O deputado pode ter ensaiado ter me dado o dinheiro, mas não recebi nada. Se levarmos em conta a pobreza da região, teria obtido uma votação muito superior para o Deiró caso recebesse toda essa grana”, afirmou.
A compra de votos do eleitorado de Joel Santos também está detalhada na agenda. Jefferson diz ter comprado 600 votos do ex-prefeito por R$ 60 mil. A metade do dinheiro foi entregue a Joel em 2 e 15 de setembro de 2006, em duas parcelas. Informa a agenda: “R$ 15 mil no ato – 2 setembro. Pago. R$ 15 mil em 15 setembro”.
Segundo a agenda do assessor, um acordo semelhante teria sido fechado com o ex-prefeito de Salinas Oswaldo Fernandez (PSDB). Identificado várias vezes na agenda apenas como Rubens, um assessor do deputado federal Aracely de Paula (PR-MG) teria recebido bolada maior: R$ 15 mil em 2 de setembro e R$ 110 mil quatro dias depois.
Natural de Itaobeiras, e amigo de Joel da Cruz, Rubens foi um dos articuladores da dobradinha de Aracely de Paula com Deiró. Vale lembrar: Aracely de Paula é aquele deputado cujo assessor Emílio de Paula foi preso pela Polícia Rodoviária Federal com R$ 79 mil em dinheiro, no município Luziânia, a 70 quilômetros de Brasília.(Correio Braziliense)