O confronto que deixou dez índios feridos, anteontem, na Reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima, abriu os olhos do governo para os riscos de um conflito generalizado envolvendo índios e arrozeiros. A Polícia Federal (PF) iniciou ontem a primeira ação efetiva para desarmar os seguranças contratados pelos arrozeiros e índios ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR), que anteontem invadiram uma área da Fazenda Depósito, do produtor de arroz e prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero(DEM). Ele foi preso ontem, acusado de formação de quadrilha, porte ilegal de explosivos e tentativa de assassinato.
A polícia também abriu inquérito para apurar a responsabilidade de Quartiero na ação de seus funcionários e identificar os quatro homens encapuzados que pilotavam as motocicletas e dispararam contra os cerca de 100 índios envolvidos na construção de malocas. "Nossa missão é pacificar a região e aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Agora trata-se de uma questão de segurança pública", disse o ministro da Justiça, Tarso Genro.
Ontem pela manhã, Genro comunicou ao ministro Ayres Brito, do STF – autor da liminar que suspendeu a operação de retirada dos não-índio da área – que a Polícia Federal e a Força Nacional de Segurança intensificariam suas ações com a finalidade específica de garantir a ordem pública na região. Mais tarde o ministro almoçou com os dirigentes da Polícia Federal e da Funai na Vila Surumu, município de Pacaraima, um dos principais pontos do conflito.
O efetivo das forças federais, formado atualmente por 200 policiais federais e 100 agentes da Força Nacional de Segurança, será aumentado na região para garantir a segurança na área de 1,7 milhão de hectares e executar a decisão que será anunciada dentro de duas semanas pelo STF sobre o formato da reserva – em "ilhas", preservando as áreas dos arrozeiros, ou em área contínua. Qualquer que seja a decisão do STF, haverá riscos de conflito.
No telefonema a Ayres Brito, Genro procurou afastar especulações sobre eventual descumprimento da ordem de suspensão da operação de retirada dos fazendeiros. Segundo o ministro da Justiça, a Polícia Federal vai investigar a ação dos grupos para responsabilizar criminalmente autores ou eventuais mandantes dos disparos. Executor do decreto do presidente Lula que prevê a reserva em área contínua, Genro não opinou sobre qual dos grupos teria motivado o conflito.
O governador de Roraima, José Anchieta Júnior, disse, no entanto, que os índios ligados ao CIR descumpriram a ordem do STF e chegou a insinuar que a ação teria sido estimulada por organizações não-governamentais (ONGs). "Parece que queriam criar um fato novo no processo", disse o governador, classificando a invasão de "insa-nidade". Autor da ação cautelar que provocou a suspensão da operação de retirada de não-índios.
A Advocacia Geral da União (AGU) e a Funai ajuizaram ontem à tarde no STF pedido de busca e apreensão de armas, munições e explosivos na área que estariam em poder dos fazendeiros que se opõem à decisão do governo.
A AGU e a Funai ressaltam que os índios não tinham a intenção de atacar os empregados da fazenda, e que a prova disso é que não há registro de vítimas entre os não-índios.
O presidente Lula criou a reserva três anos atrás, citando o direito constitucional dos índios de morar nas terras que ocupam há inumeráveis gerações.
Para o governador de Roraima, José Anchieta Júnior, a reserva de 1,7 milhão de hectares é grande demais para os 17 mil índios que morariam dentro dela.