segunda-feira, 6 de abril de 2009

Assembleia de SP ignora crise, cria cargos e mantém regalias


Em tempos de crise econômica e de debate nacional sobre o inchaço dos Legislativos, os deputados estaduais de São Paulo parecem seguir alheios ao combate do desperdício de dinheiro público. Nos últimos dois meses, a maior Assembleia do País promulgou atos que aumentaram cargos na Mesa Diretora e mantiveram antigas regalias para deputados, como gabinetes especiais para ex-presidente, ex-primeiro-secretário e ex-segundo-secretário, com carro oficial e cargos de confiança.

No Palácio 9 de Julho, os parlamentares que ocupam a vaga de membros titulares no comando da Casa (presidente, primeiro-secretário e segundo-secretário) não voltam à "vala comum" dos deputados quando seu mandato na Mesa termina. Eles têm direito ao gabinete de "ex" pelos dois anos seguintes. O benefício existe desde 2003 e não exige que se abra mão da antiga sala de deputado "comum". Os parlamentares acumulam as duas estruturas e as respectivas regalias.

Para o funcionamento da sala de "ex", cada deputado pode nomear até cinco assessores, no caso do ex-presidente, e até quatro, no caso dos ex-secretários. É obrigatório que apenas um funcionário seja concursado.

No apagar das luzes de 2008, em 29 de dezembro, a Casa, em uma única canetada, mais que dobrou esse quadro de funcionários. No último dia 26, uma nova publicação recuou aos patamares anteriores.

Os três ex-dirigentes também têm à disposição um veículo oficial, além do que já é concedido a todos os 94 deputados, e cotas de material, xerox, correspondência e telefone.

O custo desses gabinetes é mantido em sigilo. O Estado apurou que apenas o gasto com os funcionários é de, ao menos, R$ 11,5 mil para cada sala. Em 2008, a Assembleia custou aos contribuintes R$ 569,9 milhões, sendo R$ 471,1 milhões gastos com pessoal.

O curioso é que nem sempre os gabinetes são ocupados por essas três ex-autoridades. No último ano, quem despachou na sala de ex-presidente foi o deputado Eli Correa Filho (DEM). Ele recebeu a sala do ex-presidente Rodrigo Garcia (DEM), que assumiu uma pasta na Prefeitura de São Paulo. Os antigos (Eli, Fausto Figueira e Geraldo Vinholi) e atuais beneficiários (Vaz de Lima, Donisete Braga e Edmir Chedid) dessas estruturas foram procurados, mas nenhum deles atendeu aos pedidos da reportagem.

O acúmulo de gabinetes para ex-integrantes da Mesa é uma invenção paulista. Nem o Senado e a Câmara Federal, que estão no epicentro da polêmica sobre o descontrole de gastos públicos pelos Legislativos, adotam essa prática.

VICE-PRESIDÊNCIA

O retrato do desperdício não para por aí. Em fevereiro, a Assembleia decidiu engordar os cargos da Mesa Diretora. Foram criados dois gabinetes para vice-presidentes, apesar de já existirem outros dois. Na época, o então presidente, Vaz de Lima, alegou que era preciso mais substitutos para casos de ausência do presidente.

Neste mês, a nova Mesa Diretora, sob o comando de Barros Munhoz (PSDB), deu o passo seguinte na criação dessas estruturas. Definiu as cotas de correspondências, telefonia, materiais e xerox e criou os seus respectivos cargos, usando aqueles remanescente das salas dos "ex". As vagas existiam no quadro da Casa, mas não estavam preenchidas. Por isso, a incorporação delas às vice-presidências resultará, inevitavelmente, em aumento de despesas.

Munhoz não considera as medidas um desperdício. "Claro que temos defeitos, mas eles são tão pequenos perto das aberrações que vemos na imprensa sobre o Congresso."

Outra regalia, mas esta ao alcance também dos funcionários, é a comodidade de ter um consultório de cardiologia na Casa, além do ambulatório médico de clínica-geral. Ele atende não só casos de emergência, mas faz consultas e alguns exames. Foi criado inicialmente para atender apenas deputados e está estrategicamente alocado ao lado do plenário, palco das discussões políticas. Há alguns anos, por causa da baixa demanda, o serviço foi estendido a todos. A Assembleia não oferece plano de saúde aos servidores.

Também saltam aos olhos as cifras com despesas comuns, como correspondências e xerox. Um único contrato da Assembleia com os Correios, no valor de R$ 18,5 milhões, autoriza o envio de até 3,54 milhões de cartas simples por ano. Isso representa uma média de 9.698 unidades por dia. Além disso, cada deputado pode pagar e pedir reembolso via verba indenizatória por despesas com correios. Apenas em fevereiro - último lançamento de despesas feito pela Casa - eles solicitaram ressarcimento de R$ 48 mil para esse tipo de despesa.

Isso sem falar nos gastos com xerox, cópias de documentos e material gráfico, que totalizaram reembolsos a deputados de R$ 240,5 mil no mesmo período, apesar de todos os gabinetes terem copiadoras e a Casa ter um departamento exclusivo para xerox, administrado por um diretor - a Assembleia tem 67 diretores, média de 2 para cada 3 parlamentares.

LAPTOP

Os deputados paulistas recebem um laptop quando assumem o mandato. Só precisam devolver o equipamento se deixarem o cargo. O mesmo vale para os veículos oficiais. Um caso curioso chamou a atenção no início do ano. Um dos veículos apareceu no estacionamento com as rodas originais substituídas por outras de estilo mais esportivo. O veículo, modelo Corolla, ano 2009, foi comprado no fim do ano passado pela Casa por R$ 48 mil. Foram gastos R$ 7,2 milhões com a nova frota.

"Uma das rodas trincou ao cair num buraco. Ela foi consertada e todas estão guardadas. Quando tiver de devolver, eu coloco novamente. Comprei as rodas com meu dinheiro e não há nada errado nisso", disse o deputado Luciano Batista (PSB). Segundo o Departamento de Transportes, nada proíbe os deputados de mudarem acessórios desde que permitidos por lei. A exigência é que o carro, ao ser devolvido, tenha a configuração original.

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