sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

Aldo sai com mágoas e feridas


Até a última hora, Aldo Rebelo (PCdoB-SP) acreditou que tinha chances de vencer o segundo turno e reeleger-se presidente da Câmara. Mal terminou o primeiro turno ele foi para o gabinete reunir-se com os coordenadores de campanha. Começou um intenso movimento para reverter a vantagem de Chinaglia. Telefonou para vários governadores, incluindo os tucanos José Serra (SP) e Aécio Neves (MG). Não deu. Quando o resultado saiu, faltaram 18 votos. Aldo voltou ao gabinete da Presidência pela última vez. Consolou seus aliados e esfriou a cabeça antes de dar a primeira entrevista. Quando falou, adotou o tom moderado e quase monocórdio de sempre, mas não escondeu a mágoa e as feridas deixadas pela disputa na base aliada. “Quem teve a votação que eu tive não pode sentir-se abandonado”, disse. “Tive muito apoio dos deputados, mas não tive e nem pedi apoio do governo.” Ele considerou o resultado democrático, mas advertiu: “Disputei a eleição contra Arlindo Chinaglia porque tínhamos idéias diferentes sobre o país e sobre a Câmara. Essas idéias continuam”.

Quem explicitou melhor a crise foi o deputado eleito Ciro Gomes. “Essa fissura na base governista simboliza o que eu chamei de marcha da insensatez”, avaliou. “Duas bandas da sustentação do governo se enfrentaram e deram ao PSDB o protagonismo de decidir a eleição na Câmara”. O deputado previu que os próximos dias serão cheios de declarações diplomáticas e juras de pacificação, mas não acredita nelas. “Essa crise deixa seqüelas gravíssimas. Elas não serão confessadas de público, mas existem.”

Ciro é um dos personagens centrais nessa divisão. A união do PSB, PCdoB e PDT em torno da candidatura de Aldo Rebelo vai muito além da eleição na Câmara. Os três partidos organizaram um bloco partidário e querem se manter juntos. Pretendem formar uma terceira força dentro da coalizão governista, até aqui dominada pelo PMDB e PT. O bloco é o embrião do esquema político de sustentação da provável candidatura à Presidência da República em 2010. O deputado Ciro Gomes (PSB-CE) e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) têm pretensões de concorrer ao Planalto na sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A disputa pela hegemonia dentro da coalizão e pela eleição de 2010 já existia, mas tornou-se mais dura com a eleição da Câmara. Os líderes do PSB e PCdoB acusaram o PT de jogar pesado demais para eleger Chinaglia, negociando cargos no governo e liberando emendas de parlamentares ao orçamento em troca de votos. Ontem, o clima de suspeita era tão grande que Aldo e seus aliados mantiveram uma equipe de assessores conectados durante todo o dia ao Siafi, o sistema de dados que registra todos os gastos do governo. O objetivo era rastrear qualquer liberação suspeita de verbas.

Desabafo
No discurso que fez em plenário, Aldo deixou escapar um tom de desabafo e lembrou os sacrifícios que fez em apoio ao governo Lula. “Fui companheiro do presidente Lula em oito campanhas presidenciais”, recordou. Falando de sua gestão, marcada pelos escândalos do mensalão e dos sanguessugas, disse que “mais presidi a crise que a Casa, mas não fugi. Enfrentando momentos difíceis, a cada quarta-feira julgando cassações de colegas, enfrentando grupos desesperados que invadiram a instituição. Mas em nenhum momento fugi”. No discurso, citou a figura símbolo de sua campanha, o corneteiro de Pirajá, que afugentou as tropas portuguesas ao tocar o hino de “Avançar” em vez do toque de recolher durante uma das batalhas pela independência. Seus apoiadores usaram ontem um pingente com uma corneta dourada.

Fruet: “Não adiantou”


Candidato derrotado na disputa pela Presidência da Câmara, o tucano Gustavo Fruet (PR) preferiu desconversar quando foi questionado sobre o tamanho da dissidência dentro do PSDB, movimento que deu ao petista Arlindo Chinaglia (SP) a vitória no segundo turno da eleição. “Isso vai ser objeto de discussão no partido. Ainda não dá para avaliar se o Chinaglia venceu com votos do PSDB”, disse o parlamentar. Mais cedo, antes ainda da votação, o tucano chegou a afirmar que a responsabilidade por eventual traição não seria apenas dos líderes tucanos na Cãmara, mas também de governadores.

Fruet recomendou o voto em Aldo Rebelo no segundo turno. “Não adiantou nada. Foram os ecos do acordo”, alfinetou um representante do PPS na Câmara e um dos principais articuladores do lançamento do paranaense como candidato da terceira via. Referia-se ao anunciado apoio do PSDB a Arlindo Chinaglia (PT-SP) articulado por Jutahy Júnior (BA), com o aval do governador de São Paulo, José Serra. A adesão rachou o PSDB que voltou a se unificar apenas na aparência.

Além das fissuras tucanas, Gustavo Fruet se disse preocupado com o futuro da Câmara na próxima legislatura por causa do “racha” da base aliada. “A Câmara não pode sair dividida desse processo. Não pode haver fissura”, disse. E aproveitou para criticar a frente parlamentar formada pelos partidos da base governista: “A vitória de Chinaglia se deveu ao ‘rolo compressor’ da base”, numa referência ao blocão formado pelas legendas PMDB, PT, PP, PR, PTB, PSC, PTC e PT do B.

Fruet discursou na tribuna por 40 minutos para pedir votos e defendeu sua candidatura afirmando que a considerava vitoriosa por “ter conseguido alterar o debate em torno de temas como a autonomia da Câmara e o reajuste salarial dos deputados”. Mas deixou transparecer que esperava a derrota. “A minha obrigação não é com a vitória. É não ser omisso neste momento do Brasil. Quero marcar a minha trajetória procurando contestar métodos que o Brasil não mais aceita”, afirmou.

Após o primeiro turno, Fruet reafirmou que sua candidatura representou a mudança. “Os dois (Aldo Rebelo e Arlindo Chinaglia) estavam no grupo dos responsáveis pela crise. Eu, não”, comentou. O paranaense sai da eleição com mais cacife para disputar um cargo no Executivo. Ontem, ele negou que tenha intenção de concorrer à Prefeitura de Curitiba, hoje administrada por Beto Richa. O tucano poderá sair, no entanto, para disputar o governo ao Paraná em 2010. Em outubro passado, foi o deputado mais vogado pelo Paraná.



Resultado racha oposição



A oposição saiu dividida e em crise de identidade da eleição para as presidências da Câmara e do Senado. Foi um dia de desencontros e traições. Pela manhã, no Senado, parte da bancada do PSDB abandonou o candidato da oposição, senador José Agripino (PFL-RN), e votou no governista Renan Calheiros (PMDB-AL). À noite, os votos do PSDB foram responsáveis diretos pela eleição do petista Arlindo Chinaglia para a Presidência da Câmara. No fim do dia, era impossível disfarçar o desconforto. “Quem sai mal é o PSDB e não a oposição”, declarou o líder do PFL, Rodrigo Maia (RJ). “Se eles não têm palavra, nós temos.”

Rodrigo Maia coordenou os esforços do PFL para eleger Aldo Rebelo. O PFL apostou em Aldo por avaliar que, apesar de ex-ministro do presidente Lula, ele seria mais independente em relação ao Planalto que Arlindo Chinaglia. Ontem, assim que a votação do segundo turno terminou, ele dirigiu-se ao gabinete de Aldo. Juntos, conferiram os votos de cada bancada. Concluíram que o PFL votou unido e que as defecções foram no PSDB.

Duas bancadas
O raciocínio foi simples. No primeiro turno, Gustavo Fruet (PSDB) fez 98 votos. A grande maioria deles veio das bancadas do PSDB e PPS, que fecharam com ele. No segundo turno, as duas bancadas decidiram a eleição. A grande maioria dos eleitores de Fruet optou por Aldo no segundo turno. Ele ganhou 68 votos entre as duas votações. Arlindo teve só 25, mas foi o suficiente para garantir sua vitória.

O ex-líder do PSDB Jutahy Magalhães Júnior reconheceu que a ala liderada por ele e vinculada ao governador de São Paulo, José Serra, despejou votos em Chinaglia no segundo turno. Pelas contas das campanhas de Aldo e Chinaglia, esses votos foram suficientes para garantir a vitória do petista.

“A maioria do PSDB votou em Fruet no primeiro turno e em Aldo no segundo”, diz o deputado Paulo Renato Souza (PSDB-SP). “Um grupo pequeno decidiu a eleição em favor de Chinaglia e terá de assumir a responsabilidade política por isso. Haverá conseqüências políticas internas.” Há algumas semanas, quando Jutahy anunciou pela primeira vez a intenção de apoiar o petista, Paulo Renato foi um dos líderes da rebelião interna contra a decisão.

Protestos
“Esta eleição mostrou que o governo não tem tanto apoio quanto pensa na Câmara. Chinaglia só venceu porque teve o apoio equivocado do PSDB”, diz o deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA). Para ele, a oposição mostrou desarticulação, especialmente na Câmara. “Não conseguimos sequer nos unir em torno de um candidato viável”, diz.

No Senado, o quadro de desunião também ficou claro. José Agripino foi para a disputa contando obter entre 32 e 38 votos. Teve apenas 28 e quatro deles vieram de dissidentes do PMDB, um dos partidos da base governista. Para o comando do PFL, não há dúvida que a maioria das defecções aconteceu na bancada tucana.

O relacionamento entre PSDB e PFL não vem bem desde a eleição presidencial. Os pefelistas queriam que os tucanos tivessem lançado José Serra ao Palácio do Planalto em vez de Geraldo Alckmin. Durante a campanha, os dirigentes dos dois partidos chocaram-se mais de uma vez. Depois da reeleição de Lula, as duas legendas não conseguiram se entender sobre a maneira de fazer oposição. Enquanto o PFL buscou uma linha mais dura, boa parte do PSDB optou por uma linha de convivência mais amena. Essa postura é defendida especialmente pelos dois governadores mais influentes do partido, José Serra e Aécio Neves.

Na última hora, antes da eleição da Câmara, o PFL uniu-se ao bloco parlamentar formado pelo PSDB e PPS. Foi uma união de conveniência, para assegurar um posto na Mesa Diretora. O bloco será desfeito nos próximos dias.

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