quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Chantagem da oposição


Em mais uma jogada política, a oposição protocolou ontem um pedido de criação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) somente no Senado para investigar o uso dos cartões corporativos do governo. O tiro tem alvo certo: obrigar o Palácio do Planalto a ceder a presidência da CPI mista (deputados e senadores), protocolada na semana passada pela própria oposição. Essa briga já dura duas semanas e, por enquanto, a investigação está só no papel.

Pressionado, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), avisou a DEM e PSDB que pretende conversar hoje com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre o assunto. O líder quer carta branca para dividir os cargos da comissão mista com a oposição. Jucá confirmou que há uma negociação com o PSDB para nomear um tucano à presidência dessa CPI, conforme revelou ontem o Correio. “Estou tentando um entendimento, e é possível entregar a presidência ao PSDB”, afirmou.

Jucá se irritou com a postura da oposição de pedir uma CPI no Senado porque solicitou a tucanos e democratas que esperassem a conversa dele com Lula marcada para hoje. O encontro era para ter ocorrido na noite de segunda-feira, mas, por problemas na agenda do presidente, foi adiado.

Ontem pela manhã, Jucá passou no gabinete do presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), onde estavam outros tucanos. “Estou tentando resolver”, afirmou aos senadores. O mesmo recado fora dado, por telefone, ao líder do DEM, José Agripino (RN), pouco antes. Mas a oposição perdeu a confiança no líder governista. Alega que Jucá fez a mesma promessa na semana passada e, até agora, não deu qualquer sinal de que será cumprida.

Disposto a aumentar a pressão sobre o governo, Agripino procurou, à tarde, Guerra e o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), dentro do plenário do Senado. Os convenceu de que era preciso, pelo menos, coletar as assinaturas para uma CPI exclusiva no Senado. Ao atingir 30, três acima que o mínimo exigido, a oposição decidiu protocolar ontem mesmo o requerimento. Isso porque pode retirá-lo a qualquer momento, caso haja acordo com o governo em torno da CPI mista. “Para que adianta essa investigação? Para justificar uma eventual farsa? E nós serviríamos de bucha de canhão? Estamos agindo em legítima defesa”, argumentou Agripino.

Requisitos
O regimento não impede duas CPIs sobre o mesmo assunto, mesmo que uma delas seja mista. Antes de protocolar a do Senado, o líder do DEM levantou esse questionamento, esclarecido pelo presidente da Casa, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN). “Não há fundamento constitucional para negar seguimento a eventual requerimento de criação de CPI, desde que atendidos os requisitos estipulados pela Constituição Federal”, disse Garibaldi, que lerá hoje em plenário o documento que pede investigação por senadores e deputados.

Tucanos e democratas usam a CPI do Senado como arma porque o governo seria obrigado a dividir a presidência e a relatoria, já que o DEM tem a segunda maior bancada da Casa. Na mista, o PMDB, líder de cadeiras no Senado, fica com a presidência. O líder do partido, Valdir Raupp (RO), por exemplo, já indicou Neuto de Conto (PMDB-SC) para o cargo.

Por ser também a maior bancada na Câmara, o PMDB tem que passar a relatoria dessa CPI ao PT, segunda força na Casa. Os petistas escolheram Luiz Sérgio (PT-RJ) para a vaga. Como a margem no Senado em relação ao governo é mais apertada, a oposição diz que tem o direito político de ficar com a presidência para evitar uma CPI governista. Pelo acordo entre DEM e PSDB, o indicado, em caso de entendimento com o Palácio do Planalto, seria um senador tucano.

Clima bélico
Desde o fim de semana, Jucá tem dialogado com a oposição para chegar a um acordo. O líder conta com o apoio do ministro de Relações Institucionais, José Múcio Monteiro. O argumento deles é o de que pouca coisa mudará na CPI com a entrega de sua presidência ao PSDB. Pelo contrário, apostam que diminuirá o clima bélico da investigação sobre o uso dos cartões. Será esse o argumento usado na conversa que deve ocorrer hoje com Lula. Se depender de Jucá e Múcio, o acordo com o PSDB incluiria um senador tucano moderado, sem “estardalhaço”. Sérgio Guerra já ofereceu os nomes de Marconi Perillo (GO) e Marisa Serrano (MS), mas o governo prefere alguém com menos expressão e aceitaria mais fácil a indicação, por exemplo, de Cícero Lucena (PB) ou João Tenório (AL).

Jucá, no entanto, esbarra dentro da própria base do governo para convencer Lula. O PT não concorda com essa negociação. O partido, que não esconde a insatisfação com a atuação do líder no Senado, defende a manutenção da presidência da CPI mista com o PMDB. “O presidente Lula tem muito serviço. Para investigar uma mesa de bilhar não precisa consultá-lo. Desafio o PSDB a parar de lutar pela presidência e assinar a CPI para investigar os saques em São Paulo”, disse o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS).

análise da notícia
O jogo não terminou

O Congresso respira um jogo político diário. Até semana passada, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), comemorava o placar de “2 a 0” que dizia ter imposto à oposição. O primeiro gol foi quando se antecipou a democratas e tucanos e protocolou um pedido de CPI só no Senado. O segundo ocorreu, segundo ele, no acordo com o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) para desistir da investigação pelos senadores para topar uma mista.

A oposição admitiu a derrota parcial e decidiu revidar. Ontem, diminui o placar ao ressuscitar a idéia de uma CPI exclusiva dos senadores. Agora, aposta que vai empatar a partida se o governo topar entregar a presidência da CPI mista ao PSDB em troca da morte da comissão do Senado.

Enquanto a bola rola nesse campo, o Congresso começa a inserir outros temas em sua pauta de discussão e a crise dos cartões corporativos esfria a cada dia entre os parlamentares. Governo e oposição negam, mas o jogo até agora só contribuiu para atrapalhar qualquer investigação.


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