segunda-feira, 16 de junho de 2008

Empresas construíram edifícios de luxo em zonas que deveriam ser ocupadas por moradias populares



Até o final do mês, um megaempreendimento imobiliário para a classe média alta será lançado num terreno de 33 mil m2 da Vila Leopoldina, na zona oeste de São Paulo. Perto dali, em frente à Cidade Universitária, na mesma região, outra área, de tamanho semelhante, será destinada ao mesmo fim: abrigará torres com apartamentos de alto padrão.

Os dois espaços têm outra coisa em comum. No final de 2004, tiveram seu zoneamento alterado pela prefeitura, transformando-se em áreas de interesse social, para que abrigassem moradias populares.

No linguajar legal, são Zeis (Zona Especial de Interesse Social), um dispositivo urbanístico usado pelo poder público para permitir que famílias pobres, ou de classe média baixa, possam morar em áreas centrais e não sejam cada vez mais levadas para a periferia.

Mas, nesses dois casos, as grandes incorporadoras foram rápidas para garantir os bons negócios. Utilizaram o prazo legal para a entrada em vigor do plano estratégico da região, entre o final de 2004 e o início de 2005, protocolaram seus projetos de empreendimento na Secretaria Municipal de Habitação e enterraram os planos públicos de uso e ocupação do solo nos dois terrenos.

Houve polêmica na comunidade. "Existe uma forte pressão do mercado imobiliário e a tendência é que as Zeis desapareçam", diz Ros Mari Zenha, coordenadora do Mover, entidade criada a fim de evitar a "verticalização caótica" da Lapa e região. "Esses terrenos eram uma boa oportunidade de deixar a cidade mais coesa, sem guetos de alta renda."

Para a arquiteta Maria Lucia Ancona, que coordenou na Secretaria de Habitação o processo de implantação das Zeis, não dava para evitar que as incorporadoras se aproveitassem da brecha legal para registrarem seus empreendimentos antes da entrada em vigor da nova lei. "Qualquer lei precisa de um tempo para que haja a acomodação. As incorporadoras estão no papel delas", afirma.
A prefeitura ressalta a legalidade dos negócios, uma vez que os prazos foram respeitados.

Há hoje na Câmara Municipal um projeto de revisão do Plano Diretor. "Existe uma forte tendência para mudanças nas Zeis", diz o ex-vereador Nabil Bonduki (PT), que participou do debate sobre os planos estratégicos em 2004.

Nenhuma mudança, no entanto, deve ocorrer antes das eleições municipais deste ano. A Agra, incorporadora do empreendimento da Vila Leopoldina, conseguiu protocolar seu projeto para a construção de seis torres, com apartamentos de até 210 metros quadrados, sete dias antes da entrada em vigor do plano regional estratégico da Lapa, que transformou o terreno em Zeis. Antes disso, porém, teve de investir pesado para desocupar a área.

O espaço era usado por pessoas que reformavam caixas para serem reutilizadas no Ceagesp, que fica próximo ao local. Muitos moravam ali. A retirada de todas as famílias durou de 2005 até o início deste ano. Alguns caixeiros simplesmente se mudaram para ruas ao redor do Ceagesp. "O terreno tinha grandes dívidas, devido ao atraso no pagamento do IPTU. A Agra assumiu as dívidas e, hoje, a situação está regularizada na prefeitura", diz a incorporadora.

Apesar da pressão da comunidade para que o terreno servisse para a construção de moradias populares, autoridades da prefeitura defenderam o megaempreendimento. "O metro quadrado vale muito por aqui. Não há razão para essa área ser uma Zeis", disse no final de 2007 o então secretário de Assistência Social, Floriano Pesaro, a um jornal de bairro em uma visita à região.

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