quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

A serviço da impunidade

O ano na Câmara dos Deputados terminará com um saldo positivo para os parlamentares suspeitos de corrupção e alvos de processos na Corregedoria da Casa. Apesar das dezenas de escândalos sobre mau uso do dinheiro público que assombraram os contribuintes, a lista da impunidade é longa. De pouco mais de 30 procedimentos abertos pelo corregedor Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA) em 2009, apenas dois recomendaram a cassação dos colegas. Nenhum resultou em punições. Outros dois foram arquivados pela Mesa Diretora por recomendação da Corregedoria. Além disso, pelos menos dois processos estão parados nas comissões de sindicância criadas para apurar as denúncias.

Ao quadro de atos ilegais sem punições ainda se somam cerca de duas dezenas de processos que investigam supostas irregularidades na aplicação da verba indenizatória por parlamentares e o envolvimento das excelências em fraudes com as cotas de passagens aéreas. Denúncias cuja investigação ficaram para o próximo ano. Um dos dois casos em que o corregedor recomendou a perda de mandato de um colega esbarra na artimanha de outro deputado para a protelação. Acusado de embolsar os salários de servidores fantasmas do seu gabinete, o deputado Paulo Roberto Pereira (PTB-RS) perdeu a batalha na Corregedoria, mas ganhou o apoio do quarto-secretário da Casa, Nelson Marquezelli (PTB-SP).

Companheiro de legenda, Marquezelli pediu vista do relatório do corregedor que recomendava a cassação de Pereira e conseguiu jogar para o próximo ano a discussão do caso pela Mesa Diretora. “Eu vou levar na próxima reunião. Como não vai haver este mês, vou devolver o relatório nas primeiras reuniões que tivermos em 2010”, diz Marquezelli. A ideia do petebista segue a linha dos outros parlamentares que de alguma forma trabalharam para livrar os colegas de punição. Todos acreditam no adiamento das discussões como a melhor saída a fim de tentar acalmar os ânimos, diminuir as pressões e aumentar as chances de um arquivamento sem muito desgaste para as próprias imagens.

Foi assim no caso do deputado Edmar Moreira (sem partido-MG). Do inicio das denúncias ao relatório do corregedor encaminhando o caso ao Conselho de Ética da Câmara, passaram-se quase dois meses. No conselho, antes de engavetar a lista de acusações contra o mineiro, os parlamentares seguraram o caso por mais quatro meses. Depois de adiar ao máximo o julgamento, o veredicto da impunidade: por nove votos a três, os integrantes do colegiado entenderam que o crime de usar a verba indenizatória nas próprias empresas era tão comum que não merecia ser tratado como irregular.

Gaveta

Não é só de arquivamentos praticados pelo conselho que vive a lista de impunidade na Câmara. Por recomendação do corregedor-geral foram engavetados este ano outros três processos de destaque. Em agosto, a Mesa Diretora da Casa acolheu o relatório de ACM Neto e mandou para o arquivo as denúncias contra os deputados Chico Alencar (PSol-RJ) — acusado de ter contratado, com dinheiro público, a empresa de consultoria de um amigo — e Arnaldo Vianna (PDT-RJ), suspeito por crime de evasão de divisas.

No mês passado, foi a vez de Eugênio Rabelo (PP-CE) ser inocentado. Ele era acusado de envolvimento na venda de passagens aéreas da cota parlamentar a qual tinha direito. Para ACM Neto, foi provada a venda das passagens fornecidas pela Câmara, mas não a participação direta do deputado. Outros 30 parlamentares estão sendo investigados pela mesma acusação.

Entre os que se beneficiam da burocracia e benevolência da Casa e devem terminar os mandatos sem receber qualquer punição estão também João Magalhães ((PMDB-MG) e Ademir Camilo (PDT-MG). Ambos são citados na Operação João de Barro e acusados de serem beneficiados por fraudes em obras públicas. Os processos dormem nas comissões de sindicâncias porque seus relatores alegam que precisam de informações do Judiciário que não são repassadas.

Culpa da burocracia

O quadro de impunidade e de arquivamento de processos contra parlamentares não representa um saldo negativo para a Câmara, segundo o corregedor-geral da Casa, Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA). Para o deputado, o trabalho de apuração do órgão que dirige sofre limitações burocráticas que muitas vezes resultam na morosidade dos julgamentos. “Pedimos duas cassações. Uma já foi arquivada. A outra está aguardando o pedido de vista que foi feito. Também vale lembrar que cassamos o deputado Juvenil Alves”, disse o democrata.

“No entanto, a Corregedoria não quebra sigilos, não tem poder de convocar ninguém. Isso dificulta o nosso trabalho. Mesmo assim, dentro do possível, conseguimos algumas coisas”, acrescentou o corregedor. ACM Neto garantiu que não colocou de lado casos com denúncias relevantes e nega que o ano tenha sido de vantagens para parlamentares acusados de corrupção. “Não há tendência de arquivamentos. Estamos fazendo o que é possível. Vale lembrar que ainda temos comissões de sindicâncias trabalhando e em breve vão apresentar pareceres sobre casos como o das passagens aéreas”, disse. Nas contas do corregedor, ficam como pendências para o próximo ano apenas três procedimentos e a análise das denúncias sobre mau uso da verba indenizatória. (IT)


1- Carona

O caso do mineiro Juvenil Alves contabilizado como cassação resultante da atuação da Corregedoria tem peculiaridades, e a responsabilidade maior pela punição partiu do Judiciário. Depois de meses de briga judicial, o parlamentar perdeu seu mandato em primeira instância e a decisão foi confirmada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A cassação foi decretada somente depois que a Corte encaminhou para a Câmara a confirmação da perda do mandato e pediu o cumprimento imediato do acórdão que determinou a cassação. Foi o TSE também que determinou a convocação imediata do suplente.

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