sábado, 9 de janeiro de 2010

Empresários e elite preferem Lula ao PSDB, diz Alencar

Em entrevista ao Jornal do Brasil, o vice-presidente da República, José Alencar, falou sobre eleições, economia, sua luta contra o câncer, a possibilidade de se candidatar a senador e se emocionou, com a homenagem de uma procuradora aposentada de São Paulo. Segundo Alencar, hoje os empresários são a favor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na quinta-feira, depois de praticamente duas horas de conversa num gabinete amplo e silencioso anexo ao Palácio do Planalto, o vice-presidente lia uma carta recém-recebida: uma crônica de uma procuradora aposentada de São Paulo, que dizia quão ele era merecedor de bênçãos por ser forte diante do câncer. Alencar tirou os óculos, perdeu a fala e chorou. Pediu a um dos repórteres que continuasse a leitura.

Alencar diz estar otimista quanto à cura de seu câncer, e isso não tem mudado sua rotina. "Eu? Não tenho férias", disse. O vice-presidente desconversou sobre o melhor vice para a chapa de Dilma Rousseff, pré-candidata do PT. Disse que o jeito durão da aliada é virtude, e a comparou a Margareth Thatcher. Disse que Lula tem "verdadeiro pavor da inflação", e por isso sabe conduzir bem a economia, embora a política monetária seja um "equívoco" - nesse contexto, voltou ao discurso que o consagrou: crítica ferrenha aos juros altos.

Confira a entrevista:

Jornal do Brasil -Entramos na reta final do governo Lula. O que mais marcou o senhor nesses sete anos de vice-presidência?

José Alencar - É aquela história: comigo aconteceu um fato interessante, porque muita gente não entendeu bem a aliança que foi feita com o Lula em 2002. E não entendeu porque não podia admitir que uma liderança sindical representativa dos trabalhadores fizesse uma aliança com uma liderança representativa dos empregadores (Alencar foi presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais - Fiemg). A minha liderança no campo das entidades representativas das classes produtoras é longa, uma participação antiga. Porém, nas reuniões, e mesmo fora delas, a conversa da gente sempre tinha uma predominância de consertar o Brasil. Então aquela aliança deu muito certo. Posso dizer que praticamente tudo que eu esperava do Lula ele fez. Só há uma coisa que ele me surpreendeu. Foi o fato de que ele vai passar para a História como o presidente que maior serviço prestou ao Brasil no campo dos negócios externos. E o Lula não tinha, pelo menos aparentemente, perfil para isso. Ninguém pode imaginar como a gente hoje é recebido em qualquer parte do mundo, mesmo no extremo Oriente. O Brasil hoje é conhecido como um País presente, sério. E é o Lula.

JB - O senhor acredita que hoje o empresariado brasileiro, que tinha aversão a Lula, sabe reconhecer o mérito dessas conquistas, e as atribui ao governo?

Alencar - Eu digo que o prestígio do presidente Lula junto às classes produtores sérias do Brasil é muito grande. Eu digo que eles hoje são intransigentes a favor do Lula.

JB - Eles preferem o governo do PT a um eventual governo do José Serra, do PSDB?

Alencar - Sim, porque se eles querem a continuidade do trabalho feito pelo presidente Lula, é natural que eles deem força ao candidato apoiado por ele.

JB - O PSDB é tido como um partido das elites. O que foi decisivo para que houvesse essa inversão?

Alencar - Você coloca a questão meio ideológica. É aquela história, depois que o Den Xiaoping pronunciou aquela metáfora importante, acabou criando um regime na China sui generis: "não importa a cor do gato, o que importa é que ele cace o rato". Então os cientistas políticos traduziram o que ele queria dizer: "não importa a coloração ideológica, o que importa é o bem comum". Aquela resistência que antes poderia haver nas classes produtoras em relação ao Lula, considerando que ele era um líder sindical, isso acabou, porque hoje ele prestigia quem trabalha e quem produz.

JB - Tem alguma conquista da política externa que o senhor destacaria?

Alencar - Destaco esse fato de fazer crescer o prestígio do Brasil no conceito das nações. Hoje o Brasil senta à mesa. Essa luta para entrar como membro permanente no Conselho de Segurança da ONU, isso vai acontecer porque a respeitabilidade conquistada pelo Brasil é muito grande.

JB - O senhor fala das conquistas no cenário exterior, mas a balança comercial não foi boa em 2009.

Alencar - Aí já é um problema da economia. Estamos convivendo com uma política monetária, na minha opinião, equivocada. Não estou falando da política econômica como um todo, estou falando da política monetária. Refiro-me à taxa de juros, ao custo a que nos leva à rubrica representativa dos juros com que nós rolamos nossa dívida. Nós vamos gastar, em oito anos, coisa parecida como R$ 1,3 trilhão de juros, quando nós podíamos gastar a metade, e teríamos economizado R$ 600 bilhões. Se considerar a parcela do governo federal do PAC, que é de R$ 60 bilhões, seriam 10 PACs.

JB - Então a taxa de juros custou ao Brasil 10 PACs?

Alencar - Se considerar a parcela do governo central, porque o PAC tem empresas privadas que participam dos investimentos.

JB - O senhor foi crítico persistente da política de juros. Por que não foi possível criar uma articulação para redirecionar essa diretriz da política de juros?
Alencar - O Lula tem o estilo dele, mas a responsabilidade maior é dele, porque ele é que é o presidente. E o Lula tem um modo de ser que eu até respeito. Ele, por exemplo, é muito bem orientado pela equipe de assessores que ele tem. Ele sabe que o José Alencar não é economista. Ele também não é, então ele tem que se valer da orientação daqueles que estão em condições do ponto de vista acadêmico, do ponto de vista de conhecimento teórico ou mesmo prático da economia. Então o que estou falando é que aceito contestação, mas é preciso que tenha contestação capaz de me convencer e por enquanto não houve. Pois bem: a taxa de juros alta inibe também os investimentos, porque você não vai investir numa atividade produtiva, se essa atividade não remunera o custo de capital. O capital é apenas um dos fatores de produção. Então eu vejo o Lula dizendo: "vamos comprar, vamos gerar emprego, vamos investir". E a política monetária agindo diametralmente de forma oposta.

JB - Diante da crise, o estímulo ao consumo por meio de desonerações como a do IPI...

Alencar - Aí já são medidas pontuais. Eu não gosto muito dessas medidas porque elas acabam levando a uma dose de subjetividade. Você pega, por exemplo, e diz: "vamos reduzir o IPI da indústria automobilística". Então vem o outro e diz: "vamos reduzir também da indústria de bicicleta".

JB - E vai durar até quando?

Alencar - Acho que precisamos é de uma reforma tributária capaz de corrigir todas essas discrepâncias que prejudicam alguma coisa da economia.

JB - O senhor atribui, então, a lentidão na redução da taxa de juros a uma confiança do presidente Lula na diretriz do Henrique Meirelles?

Alencar - O Brasil conviveu, durante muitos anos, com uma inflação muito alta. Houve determinados governos em que a inflação chegou a coisa de 80% ao mês. Isso é uma coisa despropositada, uma coisa terrível. Então, o Lula é muito sensível à questão de orçamento, especialmente do pessoal menos favorecido, o pessoal de salário fixo. Eu não entendo disso porque não sou técnico. Acho que a inflação brasileira, esse saldo de inflação que tem aí, tem duas razões básicas, na minha opinião. A primeira delas é a força inercial de uma inflação por longo tempo no Brasil. O outro fator é que aquela inflação trouxe a chamada correção monetária, que foi um desastre, porque ainda que ela corrigisse, ela nos ensinou a conviver com inflação e nós convivemos uma vida com inflação que foi danosa para a economia brasileira graças à correção monetária.

JB - O senhor falou da importância de uma reforma tributária. E a reforma política?

Alencar - Essa é a primeira que precisa ser feita. Veja bem, é aquela história, no regime democrático as coisas demoram um pouco porque você sabe que nós temos três poderes independentes. Não adianta, tem que ser através do Legislativo. Então a reforma tributária é feita através de emendas, até constitucional, assim como a reforma política. Então depende do Congresso Nacional.

JB - Há proposta de uma PEC para eleger uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva para a reforma.

Sou favorável, sim, ela é absolutamente essencial para o Brasil. A reforma política é a reforma das reformas.

JB - O senhor é a favor da reeleição e a favor do suplente virar senador, sem voto?
Alencar - Isso aí também faz parte de itens que podem ser tratados numa reforma política. A gente não pode falar isoladamente sobre isso. Eu, por exemplo, sou vice-presidente graças à eleição do Lula, porque ninguém vota no vice, vota no titular. Agora no caso do Senado ainda é pior, porque não há nem mesmo a figura do suplente, o seu suplente vai automaticamente.

JB - Nesse caso o senhor é a favor do fim do suplente?

Alencar - Eu sou a favor, desde que haja necessidade de suplência. Se há, porque trata-se de uma eleição majoritária, que seja um suplente e que seja eleito.

JB - E reeleição?

Alencar - Não sou contra a reeleição. Mas é aquela história: cada país tem a sua cultura. Os cinco anos sem reeleição deram ao Juscelino tempo para fazer um excelente governo, um governo de grandes realizações. Então talvez um governo de cinco anos sem reeleição fosse melhor do que com reeleição. O Lula tem procurado evitar que isso faça qualquer perturbação na vida administrativa, mas de qualquer maneira isso não é bom. Talvez o ideal fosse cinco anos sem reeleição.

JB - Especula-se que o presidente Lula poderia ter preferência pelo nome de Henrique Meirelles como o vice de Dilma.

Alencar - O meu partido é o Partido Republicano Brasileiro (PRB). Tem aquela história da não-intervenção e autodeterminação em relação aos povos. Vou adotar esse mesmo critério em relação aos partidos. Acho que isso é questão de autodeterminação partidária e eu não pertenço ao PT.

JB - Quem seria o vice ideal para a Dilma?

Alencar - Só ela sabe, porque o candidato titular é que tem a maior credencial para indicar o vice ideal porque isso depende de uma convivência, uma confiança. Você sabe, eu já assumi a Presidência por mais de 400 dias e o Lula faz questão de dizer que nunca perdeu nenhum minuto de sono - ele fala - enquanto está viajando, porque sabe que estou aqui.

JB - O senhor acredita que o Michel Temer é de confiança da Dilma?

Alencar - Isso é uma pergunta que eu não tenho como responder, porque isso é uma coisa muito pessoal. Só ela pode dizer. Eu tenho pelo presidente da Câmara, deputado Michel Temer, o maior apreço. Eu já pertenci ao PMDB.

JB - O senhor representou em 2002 a adesão de parte do empresariado à candidatura de Lula. Acredita que a indicação de Meirelles para vice de Dilma poderia exercer papel semelhante oito anos depois?

Alencar - Naturalmente que isso vai envolver também a questão partidária, porque isso pressupõe um acordo partidário. Gosto muito do PMDB, fui membro do PMDB, mas eu não posso entrar nisso. Isso é um assunto que não me cabe.

JB - Uma eventual vitória de José Serra, candidato do PSDB, poderia descontinuar as políticas atuais?

Alencar - Tenho o maior respeito pelos candidatos. Sou muito amigo do governador José Serra, tenho por ele muito boa referência, é um homem público de muito valor. Assim como a senadora Marina Silva (PV), que também é candidata. Gosto demais dela. Hoje, temos o Ciro Gomes (PSB), que é outro bom candidato. Ele pode ter o temperamento dele, bravo, mas é um camarada de valor e muito correto. Da mesma forma diria em relação à Dilma Rousseff (PT), que é uma mulher rara. Muita gente fala: 'ah, a Dilma é muito durona'. Todo mundo sabe que a Margareth Thatcher se consagrou pelo fato de ser a Dama de Ferro. A Dilma é brava, mas é dedicada e muito correta. As decisões que ela toma são absolutamente estudadas, é de uma responsabilidade incomum. Então pode estar certo, essa braveza dela é valor, que acrescenta a todos os outros valores que ela tem. Então nós temos, hoje, candidatos que poderão levar o Brasil a muito bom termo. Agora, um candidato que tem, obviamente, um maior compromisso de continuidade é o candidato apoiado pelo presidente.

JB - O senhor vai se candidatar ao Senado?

Alencar - Se Deus me curar, eu posso ser candidato a alguma coisa. O que eu não posso fazer e não farei é levar o meu nome se eu não estiver em condições de exercer o mandato. E nós estamos curando o câncer. Nós estamos num processo de cura que graças a Deus está indo muito bem e vamos vencer. Mas é preciso que haja, primeiro, essa vitória.

JB - Para o Senado Minas já terá Aécio Neves, talvez também Itamar Franco e um nome do PT. O senhor vai conversar com eles?

Alencar - Só poderei ser candidato se o meu partido me der a legenda. E se eu sentir também que as lideranças e as pessoas querem que eu seja candidato. Isso aí eu posso aceitar. Mas eu sou desprendido. Por exemplo, uma das coisas que nós queremos que aconteça é uma unidade em Minas. A base de apoio que eu falo são os partidos como o meu, por exemplo, o PRB, o PT, o PMDB, o PCdoB, o PTB, e vai por aí.

JB - O senhor ainda sonha ser governador de Minas?

Alencar - Agora eu prefiro um cargo para o Legislativo. Outra coisa, se por ventura, para obter essa unidade da base em Minas, para que haja um palanque que o povo entenda aquele palanque, que não embaralhe a cabeça do eleitor, um palanque limpo, eu abro mão de qualquer candidatura. Se me disserem: você não pode ser candidato ao Senado porque nós precisamos do lugar, eu abro mão. Então me deixa ser candidato a deputado federal? Não pode. Então eu abro mão.

JB - Qual a sua opinião sobre o polêmico decreto do Programa Nacional de Direitos Humanos que causou a crise entre os militares e o ministro Paulo Vannuchi (Direitos Humanos)? O presidente Lula já conversou com o senhor?

Alencar - Não, não conversamos sobre isso e ele também sabe a minha posição. A minha posição é a seguinte: em 1979 tem a Lei de Anistia, que foi promulgada pelo presidente de então, que era o general Figueiredo. Essa anistia foi considerada ampla e irrestrita e prevalecendo para todos os lados. E eu sou da roça. Lá na roça, os antigos, quando havia um caso assim, parecido, naturalmente respeitadas as proporções, eles falavam assim: "vamos deixar os defuntos em paz, não vamos desenterrar os defuntos".

JB - Então o senhor acha que a Comissão da Verdade não é uma proposta boa.

Alencar - Acho que os arquivos devem ser postos - como estão - à disposição. Agora, a modificação da Lei da Anistia eu sou contra. Acho que ela foi muito bem lançada na época e pôs término àquele período.

JB - A Comissão da Verdade pretende investigar possíveis torturadores...

Alencar - A investigação é sempre boa. Quando há uma denúncia, deve haver uma investigação rigorosa. É claro que o investigado no processo tem direito de defesa. Isso é para todos.

JB - Mas e a anistia ampla?

Alencar - Depende, porque eu não tenho condição de falar com absoluta precisão em relação ao que a anistia alcançaria em relação a essa investigação, de um determinado fato isolado.

JB - A questão virou caso para o STF...

Alencar - Isso tem que ver como é, porque se pode haver a verificação de caso a caso, sou a favor, sem problema nenhum. Agora, tem os dois lados, porque quando vem o processo, vem também o direito de defesa daquele que está sendo acusado e ele poderá acusar o outro que o está acusando. Não é brincadeira. De 1979 para hoje são 30 anos. O tempo também vai embora. Mas sou a favor de que se construa um País que não jogue fora suas memórias, porque é preciso que nos utilizemos delas para construir nossa história. A nossa história depende disso, mas isso não significa derrubar a Lei da Anistia. Acho que não há razão para isso.

JB - Qual a opinião do senhor sobre a proposta do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre uma nova política antidrogas, e sobre o governador Sérgio Cabral, do Rio, que defende a liberalização do uso de drogas?

Alencar - O Brasil precisa acabar com a impunidade, porque a impunidade encoraja o crime. Então há muitas leis mas não são observadas, porque o País ganhou uma cultura da impunidade. As pessoas dão um jeito e fogem da lei. E fora da lei não há salvação. Então tem-se que acabar com a impunidade no Brasil, claro, sem tirar o direito de defesa. Tem que haver punição para as coisas erradas, não pode continuar assim, não. Esse negócio de liberação de droga, eu lembro, por exemplo, quando houve na Suíça. Digo para você que foi um inferno, eles voltaram atrás. Eu me lembro como ficaram as praças.

JB - Não vai dar certo?

Alencar - Não, isso aí tem que haver um trabalho coercitivo e um trabalho educativo, paralelamente, porque nós temos também que procurar educar os filhos.

JB - O presidente Lula, desde que se tornou presidente, costuma elogiar um pouco a imprensa, mas critica mais ainda. O senhor concorda com ele? A imprensa às vezes exagera?

Alencar - A imprensa tem que ser livre. A liberdade de imprensa é um dos instrumentos mais importantes para o fortalecimento da democracia. Não pode haver democracia sem a imprensa livre. Você não pode cercear o direito à liberdade de imprensa.

1 Comentários:

  • domingo, 10 janeiro, 2010

    gostei muito do seu blog e das sua opiniões,parabéns!
    gostaria que você me seguisse no meu blog novo,que também fala sobre política:
    http://ratodocongresso.blogspot.com/
    abraços!

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