quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Cunha Lima sofre desgaste


Na noite em que a Justiça determinou que o governador da Paraíba, Cássio Cunha Lima (PSDB), ficaria no cargo até que os recursos contra a cassação fossem julgados, em vários bairros de Campina Grande, como Alto Branco e Santa Rosa, a festa virou a noite, com direito a fogos de artifício e bandeiras. Enquanto isso, em João Pessoa, houve apenas uma carreata no bairro praiano de Tambaú.

Cidade natal e berço político da família Cunha Lima, Campina Grande acumula rivalidades históricas com a capital João Pessoa. Adversárias no futebol - os torcedores do time da capital, Botafogo, estão inflamados com a subida do Treze de Campina para a série B do Campeonato Brasileiro - e na economia, onde o maior Produto Interno Bruto (PIB) de João Pessoa ainda convive com a heranças da liderança que marcou Campina Grande até a década de 60, em decorrência da cultura do algodão. Até esta época, a capital econômica da Paraíba se contrapunha ao centro administrativo, em João Pessoa. É em Campina Grande, por exemplo, que fica a sede da Federação das Indústrias da Paraíba.

Na política, a distância já foi maior do que os 125 km que separam as duas cidades. A família Cunha Lima já contabiliza um desgaste em seu berço político mal disfarçado pelo volume do foguetório.

Nas últimas duas eleições estaduais, o governador Cássio Cunha Lima (PSDB) perdeu na capital João Pessoa, mas ganhou com folga entre seus conterrâneos campinenses (veja arte ao lado). Agora, a cassação do mandato do governador pelo Tribunal Superior Eleitoral - decisão da qual ele recorre - coloca à prova a fidelidade dos eleitores em sua terra natal.

Mas, apesar de a "Rainha da Borborema" ser o grande reduto cassista do Estado, a decisão judicial chega em um momento em que a hegemonia da família Cunha Lima na cidade vem perdendo força. O clã - que tem como maiores ícones políticos Cássio e Ronaldo (seu pai) - governou Campina Grande por cerca de 20 anos. Porém, nas eleições municipais de 2004, os campinenses optaram por não eleger o candidato do governador, Rômulo Gouveia (PSDB).

Por uma diferença de 791 votos, foi eleito Veneziano Vital do Rego (PMDB), conhecido como Cabeludo e aliado do maior adversário político de Cássio, o senador José Maranhão. Em 2008, os campinenses optaram por reeleger Veneziano, derrotando mais uma vez o candidato do governador, que aparecia quase que diariamente na propaganda eleitoral na televisão.

A interpretação dentro do PSDB é que o fracasso nas urnas faz parte de um movimento natural da população depois de 20 anos sob o comando cassista. Mas, além da ressaca, acredita-se que o eleitorado se frustrou com a atuação de Cássio no governo estadual a partir de 2003. Esperava-se que ele trouxesse mais benfeitorias a seu reduto ao chegar ao Palácio da Redenção.

"Desde as eleições de 2002 ficou evidente que Campina Grande está dividida. Se Cássio vier a perder o cargo, sua situação se complica no Estado, pois não terá a capital, o segundo maior colégio eleitoral e nem o governo estadual", avalia Hermano Nepomuceno, professor de ciência política da Universidade Federal de Campina Grande.

A questão agora é saber se a popularidade de Cássio resistirá caso ele seja definitivamente cassado pela Justiça. Em 1993, quando o então governador Ronaldo Cunha Lima atirou no adversário político e ex-governador Tarcísio Burity dentro de um restaurante em João Pessoa, a fidelidade aos Cunha Lima resistiu, fazendo posteriormente de Ronaldo senador e duas vezes deputado federal.

"Se Ronaldo atirou em Burity, é porque ele mereceu", diz Edileuza Pereira, vendedora de panos de prato na Feira Central de Campina Grande, expondo um raciocínio que pode ter sido seguido por outros eleitores na idolatria aos Cunha Lima.

Entre os empresários, que têm forte peso político no Planalto da Borborema, o governador registra algumas baixas. Francisco Buega Gadelha, presidente da Federação das Indústrias da Paraíba, votou em Cássio na primeira disputa pelo Estado, mas hoje apóia Maranhão. "Não tenho visto o governador empenhado no desenvolvimento do Estado", diz Gadelha.

Nas ruas, alguns fiéis eleitores dos Cunha Lima se mostram ressentidos com o governador. "A decisão do TSE foi justa. Já votei muito, mas não voto mais em Cássio", diz a cabeleireira Nelsa Rodrigues, de 64 anos. A filha Neuma, administradora de 40 anos, também seguirá a decisão da mãe.

Outros mantêm seu voto. "Se ele deu dinheiro, como diz a Justiça, foi para ajudar os pobres. Qual o problema?", defende Maria José Azevedo, 25 anos, vendedora autônoma da Feira Central. "Acho que os políticos estão substituindo a criação de emprego pela distribuição de dinheiro. Isso não está certo, mas, mesmo que Cássio seja considerado culpado, eu voto nele de novo para dar um voto de confiança", explica o vendedor José Genuíno da Silva, de 66 anos.

A preferência de Campina Grande pelos Cunha Lima se acentuou na política paraibana em 1998, quando a família e o senador Maranhão, até então aliados, começaram a brigar pelo poder dentro do PMDB. O ápice da briga aconteceu em 2002, quando os Cunha Lima migraram para o PSDB e lançaram uma candidatura de oposição ao candidato de Maranhão, Roberto Paulino. Na rivalidade histórica que há entre a capital e Campina Grande, os campinenses preferiram dar seu voto a um conterrâneo a apoiar um sertanejo de Araruna, que fez sua carreira política em João Pessoa.

Apesar das rivalidades políticas, na Justiça ambos colecionam processos. Cássio recorre da cassação dada pelo TSE por usar um programa social do governo para se promover eleitoralmente. Maranhão tem oito ações contra si, que incluem compra de votos e uso indevido de meios de comunicação.

Em meio à disputa entre os dois, começa a despontar uma nova figura política no cenário paraibano. É Ricardo Coutinho (PSB), prefeito de João Pessoa, reeleito em primeiro turno com 73,8% dos votos válidos. Vindo de movimentos populares, Coutinho é apoiado por Maranhão, mas consegue manter-se eqüidistante das rixas entre os dois caciques. "Ele vem se firmando como uma opção às oligarquias", afirma Fábio Ribeiro Machado, professor de ciência política da Universidade Federal de Campina Grande. Quando Cássio foi cassado pelo TSE, o prefeito pessoense não emitiu um comentário sobre o assunto. Estava em Johannesburgo.

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