segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

De volta ao trabalho


Reeleito sob o slogan “deixa o homem trabalhar”, o presidente Lula retorna esta semana a Brasília com a missão de desatar, de imediato, três nós para dar início, na prática, ao segundo mandato. Depois de dez dias de descanso no Forte dos Andradas, unidade militar do Exército localizada no Guarujá (SP), Lula terá de fechar o novo pacote econômico, contornar o racha da base aliada por conta da eleição na Câmara e definir a futura equipe ministerial.



O presidente participa hoje (15) da solenidade de posse do novo presidente do Equador, Rafael Correa, e amanhã já terá agenda em Brasília. As ações iniciais de Lula são consideradas fundamentais para definir o caminho que o segundo mandato tomará.



O Palácio do Planalto já fixou a próxima segunda-feira (22) como data para o anúncio das medidas econômicas com as quais o governo Lula espera levar o país a crescer mais de 5% ao ano. No primeiro mandato, a economia não cresceu mais 2,6% por ano. As iniciativas da equipe economia para o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) ainda aguardam o aval do presidente.



A expectativa é de que sejam anunciados investimentos em infra-estrutura e incentivos fiscais para os setores de habitação e informática, além de mudanças na lei que rege as aplicações dos fundos de pensão, estimadas em R$ 80 bilhões, para que eles possam financiar grandes obras.



Jogo cruzado



Como a adoção dessas medidas dependerá em grande parte da aprovação do Congresso, evitar traumas na disputa pela presidência da Câmara e do Senado será fundamental para garantir o sucesso das ações iniciais do segundo mandato.



Ao adiar o anúncio da nova equipe ministerial, Lula abriu margem para que as peças do quebra-cabeça da Esplanada se misturassem com as da sucessão no Congresso. Se, por um lado, a combinação pode agradar aos aliados, por outro, a demora desperta insegurança entre os investidores.



“Até que o time de ministros seja anunciado, não há sensação de que o governo está funcionando”, diz o cientista político Rogério Schmitt, da Tendências Consultoria. Para ele, o anúncio da nova equipe tem de ser a prioridade de Lula a “curtíssimo prazo”. Apenas com a definição dos auxiliares, o presidente poderá encontrar maneiras para reverter a estagnação da economia e elevar o crescimento, acredita Schmitt.



“A necessidade de aumentar o crescimento foi destacada na campanha eleitoral e o presidente se comprometeu a reverter o baixo crescimento do PIB”, destaca o cientista político. “A curtíssimo prazo, entretanto, acredito que o presidente precisa definir quem será sua nova equipe ministerial”.



Primeiro, o pacote



Mas, a julgar pelas declarações do ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, a ordem dos fatores será outra. Segundo o ministro, o anúncio da equipe ministerial só deverá acontecer após o lançamento do PAC, sob o argumento de que somente após delinear as metas, Lula escolherá quem terá condições de colocá-las em prática.



Na análise do cientista político Octaciano Nogueira, professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), focar nas propostas para o cumprimento dos compromissos assumidos durante a campanha é o melhor que Lula tem a fazer: “Para a presidência da Câmara disputam dois aliados de Lula e mesmo que seja eleito outro deputado, o presidente terá que governar. Estão chovendo no molhado e fazendo um cavalo de batalha com relação a essa eleição que não dá para entender o porquê”, avalia.



Disputa entre aliados



A avaliação de Octaciano não é consenso entre os analistas políticos. Muitos acreditam que, independentemente do resultado das eleições na Câmara, Lula não sairá dela vitorioso. Isso porque sua intenção era que a disputa tivesse a candidatura única de um parlamentar da base governista.



Apesar dos apelos do presidente da República, nem o atual presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), nem o líder do governo na Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), se comprometeram a desistir da disputa pelo terceiro cargo na linha sucessória presidencial.



“O presidente tem como prioridade encaminhar a questão da presidência da Câmara e do Senado. Ele deixou Tarso Genro [ministro das Relações Institucionais] com a missão de tentar a conciliação, mas como o ministro não conseguiu, Lula vai ter que intervir”, acredita o analista político Murillo de Aragão, presidente da empresa de consultoria Arko Advice.



No Senado, há duas candidaturas postas até o momento. O favorito Renan Calheiros (PMDB-AL), candidato à reeleição, conta com o apoio do Planalto e até de senadores da oposição para se garantir por mais dois anos no comando da Casa. De férias na Europa, o líder do PFL, José Agripino (RN), avisou que não desistirá da disputa. Mas não tem conseguido empolgar sequer pefelistas e tucanos.



Um cenário que nada lembra o da Câmara. Embora encabecem a base aliada de Lula, Aldo e Chinaglia não se mostraram sensíveis ao apelo do Planalto para o lançamento de uma única candidatura governista.



Veias abertas



Os movimentos feitos pelo PT na semana passada em favor de Chinaglia se mostraram bem-sucedidos até agora. Mas devem trazer um custo político ao presidente, que teme não magoar Aldo, que se mostrou um companheiro leal na liderança do governo, no Ministério da Coordenação Política e na presidência da Câmara.



Entre os governistas, Aldo tem apenas o apoio declarado do PSB e do PCdoB e, ainda, corre atrás dos dissidentes do PMDB. O comunista garante que não desistirá da disputa e diz contar com votos do PFL e do dividido PSDB.



Para Murillo, por mais que a situação pareça hoje favorável a Chinaglia, a eleição na Câmara não está decidida e pode render surpresas de última hora.



“A votação secreta sem dúvida é um risco para o governo porque muitas agendas pessoais são manifestadas nesse momento. Então, se não tiver uma forma de controle dos parlamentares, fica difícil para o PT vencer a eleição. O partido concentra a insatisfação dos parlamentares com o tratamento que recebem do governo e desperta a antipatia dentro do Congresso”, argumenta o cientista político.



Lula indeciso



A nomeação de ministros é uma decisão privativa do presidente da República, mas, a exemplo do que fez em 2002, Lula optou por estender a discussão sobre a composição da nova equipe aos partidos. Antes de viajar, o presidente reuniu-se com ministros e representantes das legendas para tentar encontrar um equilíbrio de forças e facilitar a tão sonhada coalizão a partir da negociação de cargos importantes no governo.



“Quando ele chama os partidos para conversar é porque está em dúvida”, diz Octaciano Nogueira. Para ele, a indecisão foi uma das principais marcas do presidente Lula em seu primeiro mandato. “Certa vez Lula declarou que governa por intuição, mas ministério não se faz por intuição e sim por pressão. Então Lula não governa por intuição, mas por indecisão”, considera o cientista político.



Na avaliação do professor, o adiamento do anúncio dos novos auxiliares indica que essa marca se repetirá nos próximos quatro anos. “Isso é da agenda privada dos ministérios, mas Lula faz o cavalo de batalha para ver se anda sozinho”, diz Octaciano. “Uma das ‘travas’ do país é justamente a indecisão do presidente”, afirma.



Pacote sob desconfiança



Para o cientista político, Lula deveria ouvir os novos auxiliares antes de anunciar o pacote econômico com o qual pretende estimular a retomada do crescimento da economia.



O sucesso do Plano de Aceleração Econômica é visto com desconfiança por alguns especialistas. “Acredito que esse pacote não atingirá completamente seus objetivos. Acho que o governo acertou ao identificar a prioridade, que é fazer crescer, mas não acertou no caminho para aumentar o crescimento”, diz o consultor Rogério Schmitt.



Segundo ele, a desoneração apenas de alguns setores da economia e a timidez no que diz respeito à reforma econômica e à abertura da economia não estão entre os caminhos recomendáveis.



Com o PAC, o governo prevê investimentos de, no mínimo, R$ 20 bilhões a cada ano de governo. O desafio será grande. No primeiro mandato o máximo de investimento atingido foi de R$ 15,2 bilhões, e justamente no ano passado, às vésperas das eleições.



A estagnação da economia foi motivada pela estratégia adotada para conter a inflação, mas a meta de crescimento continuou abaixo da esperada.



Ação continuada



Durante esta semana, o presidente se reunirá com a equipe econômica para definir as obras prioritárias. O governo pretende destacar cerca de 50 projetos e designar um gestor responsável por cada um deles.



Para evitar a paralisação das obras por falta de verba, o PAC vai propor a criação do Orçamento Plurianual, o que exigirá modificações na Constituição. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que deve ser mantido no cargo, explicou, em entrevista recente ao jornal O Estado de S. Paulo, que a proposta pretende incluir no Orçamento da União um espaço para projetos que duram mais que um ano.



“A legislação prevê só o Orçamento anual, que em alguns casos cria dificuldade para o investimento que leva mais de um ano para ficar pronto. Às vezes o projeto começa a ser feito, pára e precisa esperar para ser retomado”, ressaltou o ministro.



“Eu aposto mais na continuidade do que na mudança. Acho que o segundo governo não será muito diferente do primeiro. A coalizão é semelhante e é pouco provável que aconteçam mudanças drásticas na política econômica, que tem por base inflação baixa, câmbio flutuante e superávit primário”, avalia Rogério Schmitt.

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