Suplentes de deputados empossados no início de janeiro para cumprir apenas 30 dias de mandato-tampão gastam o dinheiro público como se o Parlamento estivesse em pleno funcionamento. Prestação parcial de contas revela que alguns não precisaram de um mês para torrar toda a verba indenizatória de R$ 15 mil a que têm direito. Para trabalhar durante o recesso, os suplentes ganham ainda R$ 12,8 mil de salário, auxílio-moradia de R$ 3 mil e R$ 50 mil para gastar com salários de funcionários, além de oito passagens áreas.
Dos 22 que tomaram posse, nove receberam ressarcimento até ontem. Lavoisier Maia (PSB-RN) usou cada centavo da verba indenizatória com despesas de viagens e combustíveis, segundo informação da Câmara. Só com gasolina, ele pediu para ser ressarcido em R$ 4,5 mil, o equivalente a 1,7 mil litros se considerarmos cada um a R$ 2,65. Desde 1º de janeiro, dia em que o potiguar tomou posse, se passaram 17 dias úteis. Isso significa gasto médio de 100 litros/dia. Se for levado como base um carro que faça 10 quilômetros/litro, o suplente rodou mil quilômetros diários ou 17 mil quilômetros durante o período — uma viagem à China. Talvez, por rodar tanto, é que Lavoisier apresentou documentos referentes a R$ 10,5 mil com despesas com viagem, como alimentação.
Outro campeão de despesas entre os suplentes (veja a lista ao lado) foi Pedro Pedrossian (PP-MS), filho e homônimo do ex-governador do Mato Grosso do Sul. Ele assumiu o posto em 2 de janeiro e conseguiu num prazo de apenas três semanas gastar R$ 14.516 com a divulgação da atividade parlamentar, mesmo com o Congresso fechado para recesso. Nas férias, a Câmara suspende a apresentação de projetos de lei e emendas constitucionais. O plenário não abre para sessões e comissões não funcionam.
Clovis Corrêa (PR) e Carlos Lapa (PSB), ambos de Pernambuco, gastaram mais da metade da verba indenizatória. Lapa acumulou até agora R$ 10.506 em despesas, referentes a combustíveis, viagens e divulgação da atividade parlamentar. Clovis Corrêa foi além: R$ 13.429, empregados em combustíveis, viagens e consultorias. Apenas com as tais consultorias, o suplente declarou à Câmara um total de R$ 10,1 mil. Foi essa também a justificativa de José Rajão, do PSDB do Distrito Federal, para pedir ressarcimento de R$ 7 mil. O deputado, suplente de Alberto Fraga (PFL), foi procurado ontem pelo Correio Braziliense, mas não foi localizado para comentar o assunto. A reportagem ligou três vezes em seu gabinete, mas ninguém atendeu às chamadas.
Críticas
Carlos Lapa afirmou que tem visitado os 11 municípios que compõem sua base eleitoral. “Fico em Brasília de terça a quinta. Nos demais dias, visito minha região para ouvir as reivindicações da comunidade. Estou encaminhado todas as demandas aos órgãos competentes”, justificou ele, a caminho de audiência no Ministério da Ciência e Tecnologia. Para rebater as críticas ao mandato-tampão, Lapa e seu conterrâneo Clovis Corrêa têm sustentado que há muito trabalho para ser feito em Brasília durante o recesso, como o estudo e a apresentação de projetos de lei, mesmo que não possam ser protocolados. “Meus projetos serão apadrinhados pelo Inocêncio Oliveira (PR-PE)”, justificou Corrêa. Lavoisier Maia, do Rio Grande do Norte, não foi localizado em seu gabinete. Pedrossian, do Mato Grosso do Sul, não retornou o recado deixado na secretária eletrônica.
A Constituição exige que a Câmara fique sempre com o quadro de parlamentares completo, para situações políticas emergenciais. Por isso, a convocação dos 22 suplentes para cumprir mandato de apenas um mês no lugar daqueles que se afastam para assumir cargos nos executivos estaduais em 1º de janeiro. No total, a previsão de gastos com o grupo de suplentes chega a R$ 2 milhões. Trata-se de despesa prevista pelo Congresso porque os 513 deputados têm direito, também durante o recesso, aos benefícios mensais que ganham no restante do ano. A crítica que se faz é que ela poderia ser congelada caso não houvesse o mandato-tampão.
Dos 22 suplentes que tomaram posse, 16 não farão parte da próxima legislatura, uma vez que não conquistaram a reeleição. Mesmo assim, receberão o salário de R$ 12,8 mil e ainda têm direito a outros benefícios como o auxílio-moraida, de R$ 3 mil. Apesar do pouco tempo de exercício, os suplentes têm contratado até 25 funcionários para trabalhar durante o recesso. Cada deputado pode gastar até R$ 50 mil para isso. Alguns suplentes fizeram acordos com os antecessores para deixar os funcionários antigos nos cargos, mas outros resolveram contratar novas pessoas, como caso de Lavoisier Maia e José Rajão.