A cena mais significativa do debate entre os candidatos a presidente da Câmara não passou na televisão. No intervalo entre o segundo e o terceiro blocos, o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS) levantou-se e chamou o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Quando Aldo olhou para ele, Albuquerque apontou para o candidato do PT, Arlindo Chinaglia (SP) e deu um soco na palma da mão, recomendando agressividade. O discreto Aldo respondeu com um sinal de positivo. Um pouco depois, atacaria pesadamente o PT. “Não creio que, em nome da democracia, do equilíbrio dos poderes do país, se deva dar ainda mais força e mais poder a um único partido. Não julgo prudente, não julgo equilibrado, não julgo bom para a democracia, nem para o país, nem para o próprio Partido dos Trabalhadores, a concentração de tanto poder”. O debate deixou claro o tamanho da divisão que a disputa da Câmara provoca na base governista.
No meio da briga entre os governistas, o candidato da oposição, Gustavo Fruet (PSDB-PR) atuou como franco-atirador. Atacou os dois adversários por sua ligação com o Palácio do Planalto e aproveitou todas as chances para alfinetar o governo: “Temos que acabar com essa lógica de que para ser presidente da Câmara é preciso ser líder do governo. Acabar com a idéia de que para ter governabilidade é necessário esperar eleição da Mesa para indicar o novo ministro, a composição ministerial”. Como Aldo e Chinaglia projetam disputar o segundo turno e precisam do apoio dos eleitores de Fruet, o tucano foi poupado no debate.
Há dias o governo tenta um acordo para impedir hostilidades abertas entre Aldo e Chinaglia. Os dois vinham mantendo um tom ameno até o debate de ontem. O programa, transmitido ao vivo pelo rádio e televisão, deixou à mostra a tensão entre os aliados. O primeiro golpe veio de Chinaglia. Uma jornalista perguntou a ele o que achava das críticas de aliados como o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e o deputado Ciro Gomes (CE). Os dois políticos do PSB acusam o PT de não dar espaço aos aliados. Chinaglia respondeu irritado. “O PT não é um partido perfeito. O PT tem erros. E, se é o partido mais votado para a Câmara, é porque o povo quis. Se governa cinco estados e tem o presidente da República é porque o povo quis. O governador e o deputado têm de respeitar isso”. Depois, voltou à carga. “Então, qual é o preconceito contra o PT? Qual é o ódio contra o PT?”
Foi essa resposta que irritou Beto Albuquerque e os outros políticos do PSB. A resposta viria no final do debate, quando Aldo aumentou o tom de voz para criticar a concentração de poder nas mãos do PT. Chinaglia respondeu logo depois. “O Aldo não fez essa avaliação em 2005, quando retirei minha candidatura para apoiá-lo. O PT tinha 80 deputados e apoiou o Aldo, que vinha de uma bancada com 9 parlamentares”. O presidente do PT, Ricardo Berzoini, também atacou as declarações de Aldo. “Não foi um ato elegante”, disse. “Ele tentou criar um ambiente de rejeição ao PT.”
Mensaleiros
Chinaglia ainda enfrentou outra frente de ataques. Gustavo Fruet criticou o apoio que o petista recebeu de legendas envolvidas em escândalos. “Sua candidatura é apoiada pelos partidos que mais geraram mensaleiros e sanguessugas”, disse. Fruet lembrou mais de uma vez a adesão do ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti à campanha de Chinaglia. Obrigado a renunciar depois de ser acusado de cobrar propina do concessionário do restaurante da Câmara, Severino transformou-se em símbolo da crise ética do Congresso. “Sua candidatura tem a simbologia de todas aquelas forças que marcaram a crise. É combustível para uma fogueira que estava apagando”, destacou o tucano.
O petista bateu duro na resposta. “Ao dizer que as forças que me apóiam representam o escândalo, o deputado Fruet não deve ter incluído o PSDB, que anunciou seu apoio à minha candidatura, antes que ele se lançasse. Ao respeitar o PSDB, espero que respeite os outros partidos”. E completou: “Por causa de um pecado de um dos seguidores, não significa que alguém deva abandonar sua fé. Discordo de que haja partidos de mensaleiros. Até porque houve renovação. Deputados que erraram foram condenados”.
Estilos diferentes
Mais que propostas políticas, o debate deixou claro o estilo e o público-alvo de cada candidato. Arlindo Chinaglia é o mais esquentado. Não leva desaforo para casa. Chegou a pedir direito de resposta contra a jornalista que fazia uma pergunta para Aldo Rebelo. Não gostou da interpretação que ela dera à sua resposta anterior. Acabou debatendo com a repórter.
Gustavo Fruet parecia estar em um programa diferente. Enquanto Chinaglia e Aldo mediam cada palavra em questões polêmicas como o aumento de salário, preocupados em não perder o voto dos deputados, Fruet falava para os telespectadores. Abusou das frases de efeito: “Não sou candidato a delegado de polícia, mas não vou ficar defendendo aumento de salário”, disse.
Se Fruet fazia campanha pensando na opinião pública, Aldo fazia pensando em Fruet. Ele avalia que o apoio do tucano será decisivo num eventual segundo turno. Evitou atacá-lo.
Como todo debate, houve tentativas de pegadinhas. Aldo pediu a Chinaglia que listasse duas propostas para os deputados “do Acre, Amapá e Roraima”. Desconfortável, o petista respondeu: “Não sou candidato a governador”.
A DISPUTA NA CASA
O PODEROSO
A presidência da Câmara é um dos cargos mais cobiçados da República.
Veja abaixo o que ficará nas mãos do próximo presidente da Câmara:
Total controle sobre a pauta de votações da Casa. É o presidente da Câmara quem dá a palavra final e determina quais serão os projetos apreciados pelos 513 deputados
É o segundo na linha de sucessão à Presidência da República
Decide sobre a abertura de processo de impeachment contra o presidente da República
Administra um orçamento de R$ 3 bilhões. A maior parte desse valor destina-se ao pagamento de salário de parlamentares, servidores, aposentados e pensionistas
Tem direito a casa oficial, carro oficial e motorista particular. Conta também com um jatinho da Força Aérea Brasileira (FAB)
à sua disposição
Responsabilidade pela indicação dos relatores de medidas provisórias em tramitação e pela criação de comissões especiais para analisar as propostas de emenda à Constituição
Decide o dia da votação de processos de cassação em plenário