sexta-feira, 3 de novembro de 2006

Disputa política



Tumulto esconde a briga pelo controle do espaço aéreo entre órgãos civil e militar

A confusão nos aeroportos brasileiros é resultado de duas brigas internas no governo. A primeira é prosaica. Parte dos controladores de vôo é militar, parte é civil. Os civis têm salários e condições de trabalho muito melhores que os colegas de farda. Obviamente, os militares querem passar para o regime civil. Aí entra a segunda briga, travada em escalões bem mais altos. O comando da Aeronáutica não aceita nem pensar em discutir a transferência do controle de tráfego aéreo para a Infraero, estatal que cuida dos aeroportos.

Nos últimos dias, desde que a crise estourou nos aeroportos, o Palácio do Planalto está sendo pressionado a decidir a questão com um gesto de força e editar uma medida provisória transferindo o sistema de controle aéreo para o regime civil. Para resistir a essa pressão a Aeronáutica adotou medidas como a convocação dos controladores militares.

O governo voltou a pensar em uma mudança depois da crise. Há uma forte pressão para que o Palácio do Planalto mude a estrutura de controle de vôo por medida provisória. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não decidiu o que fazer, mas ficou muito irritado com a crise.

Na reunião de emergência que promoveu sobre o assunto esta semana, reclamou de ter de administrar um problema como esse na semana em que deveria estar comemorando a reeleição. Lula ficou muito nervoso com as imagens dos salões de aeroportos lotados, transmitidas nos telejornais. Avalia que isso passa uma imagem de ineficiência do governo.

Questão de tempo
Uma fonte do governo conta que a crise era latente há muito tempo. “Controladores militares e civis fazem o mesmo trabalho. Mas, enquanto os civis ganham R$ 3 mil por mês e trabalham de jeans e camiseta, os da Aeronáutica trabalham de uniforme e coturno, ganham R$ 1,6 mil e ainda têm de bater continência quando o chefe entra na sala”, explica.

Há anos os militares tentam equiparação salarial com os outros controladores, mas esbarram na lei. Não é possível aumentar os salários sem dar reajuste às Forças Armadas. O clima de tensão interno foi aumentando e explodiu depois do acidente com o avião da Gol, que expôs as condições de trabalho dos controladores. Não por acaso, os focos mais agudos da crise são os aeroportos de Brasília e Congonhas, onde o controle de vôo é feito também por militares.

Há um bom tempo circula dentro do governo a proposta de transferir todos os controladores para o regime civil ou de criar uma nova estrutura, bancada pelas empresas aéreas e fora do controle militar. A idéia embarra invariavelmente na Aeronáutica, que não quer correr o risco de perder o poder sobre a área.

O argumento oficial é segurança nacional. Na verdade, é uma disputa por poder. A Aeronáutica resistiu o quanto pode à criação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que lhe tomou parte das atribuições e do orçamento. O que ela conseguiu manter foi o controle do tráfego aéreo. Perdê-lo significaria menos poder e menos verbas.


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