Depois de duas semanas mandando recados indiretos, Executivo e Legislativo acertaram os ponteiros. Em um encontro ocorrido ontem, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva discutiram as prioridades de cada Poder, mas concordaram que o impasse em torno do aumento de salários do funcionalismo precisa ser superado. Chinaglia disse a Lula que a Câmara não criará obstáculos para as medidas provisórias que vão beneficiar cerca de 300 mil servidores federais. Lula gostou da conversa e sinalizou que a solução virá nos próximos dias.
Arlindo Chinaglia fez um resumo de como está o clima entre os partidos e explicou ao presidente que as obstruções atrapalharam bastante o rendimento da Casa. O deputado aproveitou para entregar a Lula um calendário detalhado de temas pendentes que passarão a trancar a pauta. Em relação aos servidores, Chinaglia confidenciou ao presidente da República que obteve sinais positivos tanto da base governista como da oposição para votar as MPs assim que os textos chegarem ao Congresso Nacional. “Apesar de todo o meu posicionamento, quando medida provisória tem as características de urgência e relevância, como é o caso de reposição de perdas do funcionalismo, acho que se justifica”, resumiu Arlindo Chinaglia.
Na avaliação dos sindicatos, nada mais impede que o Palácio do Planalto envie as propostas. “Com o caminho político livre, não tem mais desculpa”, resumiu um representante de classe que esteve com Chinaglia. Do ponto de vista técnico, no entanto, restam ajustar pequenos detalhes. Isso porque, até ontem, a Casa Civil não havia concluído o processo de checagem e análise dos termos de acordo fechados com as 54 categorias contempladas. O pente-fino, iniciado há 10 dias, está quase pronto.
Tempo
Os problemas estão concentrados na MP que aumentará os salários de cerca de 220 mil pessoas de 40 setores. O texto tem mais de 340 artigos e 400 páginas. Índices de aumento não serão modificados, segundo o governo, mas percentuais de gratificação para aposentados, por exemplo, podem ser alterados. Na outra medida provisória estarão agrupadas as chamadas carreiras típicas de Estado (91 mil servidores) — ciclo de gestão, Banco Central, grupo Fisco, advocacia pública — que deixarão de receber vencimento básico e gratificações para passar a subsídio (fusão de todos os penduricalhos do contracheque).
Diferentemente de outras ocasiões, o governo agora trabalha sob pressão. É que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2009 define que o reajuste de servidores da União só poderá ser autorizado se o instrumento legal utilizado pelo Planalto estiver em tramitação no Legislativo até o dia 31 de agosto de 2008. A data-limite, portanto, é a próxima sexta-feira, dia 29. A segunda rodada de aumentos para o funcionalismo deveria ter sido encerrada há cerca de dois meses, mas a maior parte dos acordos com as categorias não foi finalizada a tempo.
Sindicatos ligados a setores estratégicos da burocracia federal estiveram ontem à tarde com o presidente da Câmara. As entidades receberam a confirmação de Arlindo Chinaglia de que o Ministério do Planejamento não cogita mexer nas tabelas salariais ou nos acordos firmados — ao ponto de prejudicar os funcionários. Embora convencidos, os representantes dos servidores informaram que continuam com as bases mobilizadas. “A pressão sobre o Planejamento está muito grande. Não acredito em mais um descumprimento de prazo”, completou um presidente de sindicato.
Apesar do meu posicionamento, quando mp tem as características de urgência e relevância, como é o caso da reposição de perdas do funcionalismo, acho que se justifica
Arlindo Chinaglia, presidente da Câmara
Servidores fazem nova ameaça
No mesmo dia em que intensificaram o lobby político no Congresso Nacional, as entidades representativas das carreiras de Estado organizaram ontem um ato conjunto que incluiu paralisações de advertência e redução da jornada de trabalho em determinados órgãos. O protesto ocorreu no Distrito Federal e em outras partes do país, como Rio de Janeiro e São Paulo. Auditores-fiscais da Receita Federal e funcionários do Banco Central (BC), entre outros, aderiram.
Com o movimento, os sindicatos tentaram dar uma demonstração de força. Desde o início da semana, as entidades vinham sendo criticadas pelo imobilismo e falta de coordenação. O movimento conjunto amenizou, em parte, os ataques dos servidores filiados. Aos olhos do governo, o protesto não chegou a incomodar, pois se concentrou em nichos da máquina pública e não prejudicou o funcionamento dos órgãos.
Em Brasília, servidores do BC fizeram uma paralisação de 24 horas. Os que participaram do ato desligaram computadores e não atenderam telefones. Os funcionários do banco na capital paulista foram mais longe. A categoria decidiu em assembléia que se até a próxima quarta-feira as medidas provisórias não forem publicadas todos vão parar por tempo indeterminado a partir do dia seguinte.