quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Efraim e Agaciel sob suspeita


Em 26 de abril de 2006, Paulo Duarte, funcionário da empresa Ipanema, telefonou para Dimitrios Hadjinicolaou, diretor da Secretaria de Compras e Administração do Senado, para tratar de concorrência de R$ 2,4 milhões mensais vencida na Casa. Esse contrato, de número 20060018, havia sido assinado em 24 de março daquele mês, na gestão de Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência da Casa.

Segundo o MP, Duarte enviou naquele dia um e-mail para corrigir informações de preços um mês depois de assinar o contrato. “Cara, tem várias planilhas erradas”, afirmou por telefone ao funcionário do Senado. “Se você quiser deixar do que jeito que tá (sic), por uma questão de lealdade, eu tenho que te falar, tá errado”, disse o funcionário da Ipanema.

Na conversa, Dimitrios reclama e informa que o primeiro-secretário do Senado, Efraim Morais (DEM-PB), já havia assinado o aditivo. “O senador já até assinou o termo aditivo, cara”, diz o servidor do Legislativo.

O contrato recebeu um “aditivo” naquele ano porque essa concorrência se refere à continuação de contratos emergenciais assinados pelo Senado em 2004 com a Ipanema e a Conservo e prorrogados por três vezes até 2005. “Pelo teor da conversa, é possível inferir ainda que a empresa teria participado da concorrência sem sequer ter apresentado tais planilhas, que, como se sabe, são documentos de apresentação obrigatória pelo licitante”, diz o relatório do Ministério Público. Em março deste ano, o Senado prorrogou esse contrato por mais 12 meses.

Problema
Em outro diálogo, em 27 de março de 2006, Paulo Duarte relata ao seu chefe, José Carlos Araújo, que estava resolvendo um problema com Victor Cúgola, da Conservo, e Márcio Fontes, da Brasília Informática. Uma reunião teria sido feita na sede da Ipanema entre todos eles para discutir os contratos com o Senado.

Segundo os diálogos, Duarte informou a Cúgola e Fontes que seu patrão estava tentando um contato com o diretor-geral do Senado, Agaciel Maia. “Estava tentando falar com Agaciel, falei que você estava tentando falar com a autoridade, né?”, disse Duarte ao chefe.

No relatório do MP, Agaciel é descrito como alguém que teria “ciência” do “acordo entre as empresas”. O documento, no entanto, diz que ele não poderia ser denunciado agora em 2008 porque as investigações foram prejudicadas durante a Operação Mão-de-Obra, feita pela Polícia Federal em 26 de julho de 2006.

Na madrugada daquele dia, precisamente à 1h, o delegado federal Bergson Toledo Silva informou ao então presidente do Senado, Renan Calheiros, sobre a ação policial em gabinetes da Casa. “As apurações restaram prejudicadas em virtude do ocorrido às vésperas da busca e apreensão”, diz o MP. Segundo o texto, Renan passou a informação a Agaciel, que, de acordo com o relatório, era um “dos alvos da Operação Mão-de-Obra”.

Em 2006, os procuradores da República pediram a realização de buscas nas “salas” de Dimitrios, Aloysio Brito Vieira e Agaciel, “haja vista existência de fundados indícios de participação deles nas práticas criminosas examinadas”, descreve o texto daquela época obtido pelo Correio.

O código referente ao vinho aparece num diálogo entre Victor Cúgola, da Conservo, e Paulo Duarte, da Ipanema, em 20 de março de 2006. “Você tomou vinho este fim de semana?”, pergunta o dono da Conservo. “Tá ok”, respondeu Duarte. Segundo o MP, “vinho” seria o “acerto intermediado” por Eduardo Bonifácio Ferreira, ex-assessor comissionado do Senado, sobre a concorrência de R$ 456 mil mensais vencida pela Conservo em 5 de maio seguinte.

Os personagens

Confira quais são os agentes públicos e os empresários ligados à denúncia do Ministério Público Federal:

Efraim Morais
O primeiro-secretário do Senado (DEM-PB), que ocupa o cargo desde 2005, é o responsável pela área de contratos. Nos diálogos entre os acusados, há uma referência que seria a ele


Renan Calheiros
O ex-presidente do Senado (PMDB-AL) estava à frente da Mesa Diretora quando a Casa decidiu fazer os contratos de emergência com as três empresas investigadas

Agaciel Maia
O diretor-geral do Senado é mencionado nas conversas entre os suspeitos e, de acordo com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, saberia do acordo entre as empresas

Dimitrios Hadjinicolaou
O diretor da Secretaria de Compras do Senado é acusado pelo MPF de improbidade administrativa, por supostamente repassar informações privilegiadas ao grupo criminoso. Foi flagrado em grampo da Operação Mão-de-Obra conversando com um dos empresários

Aloysio Vieira Brito
O ex-diretor de compras do Senado, hoje lotado na Secretaria de Fiscalização e Controle, também é alvo de ação de improbidade administrativa

Victor Cúgola
O dono da empresa Conservo é acusado pelo MPF de ser um dos articuladores das supostas fraudes. É alvo de ação penal que tramita na Justiça Federal de Brasília

José Carlos Araújo
A exemplo de Cúgola, o dono da Ipanema é apontado pelo MPF como um dos chefes do esquema criminoso. Ele responde ação penal na Justiça Federal de Brasília

Diretor-geral do Senado nega envolvimento
O diretor-geral do Senado, Agaciel Maria, afirmou ontem que não há nada que aponte seu envolvimento no esquema investigado pela Operação Mão-de-Obra. “Na (ação) inicial promovida pelo MPF fica claro não existir indícios de participação, direta ou indireta, do diretor-geral do Senado em quaisquer dos eventos ali descritos”, sustentou ele, a respeito da ação de improbidade administrativa proposta pelo MPF.

“Eu fui convocado a prestar esclarecimentos na condição de testemunha. Não tive qualquer contato telefônico ou pessoal com os empresários investigados. Não existe qualquer referência ao meu nome nas conversas telefônicas gravadas e reproduzidas pelo MPF na inicia”, afirmou, em nota enviada ao Correio.

Na ação contra os servidores do Senado acusados de participar das fraudes, os procuradores da República dizem que as investigações, no que se refere a Agaciel, foram afetadas porque o servidor soube na véspera da realização de buscas nas dependências da Casa — a ação ocorreu em 26 de julho de 2006. Sobre isso, o diretor afirmou que não ser verdadeira a afirmação. Ele admite ter sido informado pelo então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), mas nada fez para prejudicar a ação policial.

Agaciel destacou ainda que os contratos investigados estão fora de sua alçada orçamentária, que seria de até R$ 80 mil. “O diretor-geral não é competente para nomear comissão de licitação nem assinar quaisquer dos contratos administrativos objeto da investigação ministerial”, afirmou, transferindo a responsabilidade pelas contratações esmiuçadas por policiais e representantes do MPà Primeira-Secretaria do Senado.

A Primeira Secretaria é comandada desde 2005 pelo senador Efraim Morais (DEM-PB), quando Renan Calheiros (PMDB-AL) foi eleito para presidir a Mesa Diretora. Naquele ano, os contratos emergenciais que haviam sido firmados com as empresas Conservo, Ipanema e Brasília Informática foram prorrogados. Calheiros se eximiu de responsabilidade e também a repassou à Primeira-Secretaria, do colega Efraim Morais. Por meio de sua assessoria, o primeiro-secretário disse que recebeu pareceres prontos dos servidores encarregados de realizar as contratações e apenas os assinou.

O Correio procurou os donos das empresas. Segundo funcionários, Victor Cúgola, da Conservo, Márcio Fontes, da Brasília Informática, eles não estavam nas respectivas sedes. A reportagem telefonou para a Ipanema, mas ninguém foi localizado para comentar o assunto.

Não tive qualquer contato telefônico ou pessoal com os empresários investigados

Agaciel Maia, diretor-geral do Senado

O esquema
As licitações sob suspeita foram feitas justamente para substituir contratos emergências estabelecidos com essas empresas em 2004, depois que o Tribunal de Contas da União (TCU) considerou irregular contratos firmados com a empresa Infocoop.

Pelo acordo, segundo o MP, Conservo, Ipanema e Brasília Informática tentariam se perpetuar dentro do Senado com o esquema criado. A Ipanema recebe hoje mais de R$ 2,5 milhões por mês do Senado pelos serviços ligados às concorrências que estão sob suspeita de fraude. Já a Conservo recebe R$ 456 mil mensais da Casa. As investigações começaram em 2005, depois que dois ex-funcionários da Conservo denunciam a existência de fraudes nas licitações vencidas pela empresa. Segundo o MP, os empresários “fraudaram o caráter competitivo das concorrências”. Os procuradores pedem a devolução aos cofres públicos de R$ 36 milhões pagos pelo Senado. Segundo o documento, a Ipanema obteve um lucro de R$ 1.244.768,08 com os contratos.

fogo no trem para poder ‘merdalhar’ tudo”.

Zé (José Araújo): Hum, hum.

Paulo: Aê eu falei: não! Mas não é por aí. Não porque, inclusive, da outra vez do edital, ele (José Eduardo, dono da Ipanema) não estava presente, o Manoel é quem ficou, hoje também. Aí eu falei que tem nada a ver, inclusive, ele que mandou marcar, mas ele está com um problema aí, estava tentando falar com Agaciel (Agaciel da Silva Maia, diretor do Senado Federal), falei que você estava tentanto falar com a autoridade, né?

Zé (José Araújo): Hum, hum.

Diálogo entre Victor João Cúgola (Conservo) e Aloysio Vieira Brito (então diretor de compras do Senado) no dia 11 de abril de 2006. Victor liga para reclamar de que estava sendo tirado de uma concorrência. Segundo o MP, ao citar o termo “contrato”, Aloysio admite que sabia de um contrato informal que haveria entre as empresas para pagamento de propina a quem perdesse. A conversa mostra intimidade entre os dois:

Victor: Alô. Boa Tarde. Gostaria de falar com o seu Aloysio.

Aloysio: Oi, irmãozinho, sou eu.

Victor: Oi, tudo bom!

Aloysio: Bom.

Victor: Tá. É. Tô pra almoçar com você. Cê sabe o que acontece lá, não sabe?

Aloysio: Sei.

Victor: Puxaram meu tapete, mas eu…

Aloysio: Não, não. Não puxaram, não, não puxaram, me disseram que não. (…) Não, mas o Zé (dono da Ipanema) disse que tava tudo certo, que você tinha um contrato com ele, não sei o quê.

Victor: Não, não é, mas é. Ele falou com você pessoalmente.

Aloysio: Tá, pra me explicar, vamos deixar isso para segunda-feira, tá.

Victor: Tá bom.

Aloysio: Um abraço, amigo.

Victor: Falou, um abraço, tchau.


No dia 26 de abril de 2006, Paulo Duarte, da Ipanema, conversa com Dimitrios Hadjinicolaou, diretor da Secretaria de Compras do Senado. Segundo o MP, a conversa mostra que a Ipanema ganhou a concorrência sem apresentar as planilhas de preço, sendo que o aditivo já havia sido assinado por Efraim Morais.

Dimitrios: Alô.

Paulo: Doutor, cê tá bom?

Dimitrios: Diga, mestre, beleza.

Paulo: Eu fui conferir, cara, tem várias planilhas erradas. Eu te mandei no e-mail todas as planilhas com o resumo e fechamento. Vamos ver se você consegue abrir porque o arquivo é muito grande.

Dimitrios: Várias planilhas do que?

Paulo: Várias planilhas de formação de preço, eu acho o seguinte: cê lembra quando mexeu no salário e tava invertido. Tem salário ali que quando você mexe aí o vale transporte lá embaixo dá negativo, porque ele tinha direito a vale, não tem vale mais entendeu? Aí ele dá negativo. Na realidade, na realidade.

Dimitrios: Mas é que o senador já até assinou o termo aditivo, cara.

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