segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Candidato "ficha suja": a vez do eleitor


O Supremo Tribunal Federal acaba de decidir que não existe fundamento legal para barrar um candidato a cargo eletivo, tomando por base apenas o fato de que ele tem "ficha suja", expressão que se tornou corrente para identificar o candidato que foi ou está sendo acusado de ter praticado irregularidades no setor público e que, sendo ou não réu em processo judicial, não tem ainda uma condenação definitiva pelo Poder Judiciário, ou seja, condenação que não pode mais ser objeto de um recurso para tentar modificá-la.

Na realidade, o Supremo Tribunal Federal manteve fidelidade às disposições constitucionais, sendo hoje consenso praticamente unânime entre os juristas que o respeito à Constituição, como norma jurídica superior, é indispensável para a existência de uma sociedade democrática, na qual as pessoas e seus direitos fundamentais sejam respeitados. É também oportuno lembrar que, além de outros, há dois princípios jurídicos consagrados, cuja observância é extremamente importante para evitar o uso arbitrário do poder de julgar. Em primeiro lugar, quando existem normas legais específicas sobre determinada matéria não pode o intérprete ir além ou aquém daquilo que consta da legislação. Outro ponto é a advertência de que o intérprete pode fazer, excepcionalmente, a aplicação de uma norma legal por analogia ou por extensão, quando isso levar à maior proteção de direitos, mas nunca poderá usar dessa largueza interpretativa para restringir direitos.

No caso dos candidatos de "ficha suja", é importante lembrar que a Constituição estabelece, no artigo 14, as condições de elegibilidade, enumerando várias exigências e diversos impedimentos, existindo, portanto, disposição constitucional expressa disciplinando a matéria, não podendo o julgador acrescentar novas hipóteses, a seu arbítrio. Pelo parágrafo 9º do mesmo artigo 14, a Constituição deu ao legislador ordinário o poder de acrescentar novas hipóteses de bloqueio legal aos maus candidatos, dispondo expressamente que "lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade". Com base nisso foi elaborada a Lei Complementar número 64, de 18 de maio de 1990, conhecida como Lei da Inelegibilidade, onde ficou estabelecido que quanto aos acusados da prática de algum crime, o que inclui tanto o crime comum quanto o de improbidade, são inelegíveis "os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado", ou seja, condenação definitiva. Além disso, é também de extrema relevância lembrar que a Constituição estabelece, entre os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, o princípio da presunção de inocência, consagrado no artigo 5º, inciso LVII, onde se dispõe que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".

Assim, pois, não me parece que caiba qualquer reparo à decisão do Supremo Tribunal Federal. O que o eleitor deve fazer agora é prestar atenção às informações sobre os antecedentes dos candidatos, repudiando aquele que, numa análise serena dos fatos, tiver agido ilegalmente e contra o interesse público. Mas os Partidos e os eleitores brasileiros também têm responsabilidade na escolha dos candidatos e na votação a eles atribuída, sendo inúmeros os casos de candidatos notoriamente corruptos e que, no entanto, obtêm com facilidade uma legenda partidária. Depois disso conseguem eleger-se facilmente, porque, de alguma forma, o eleitor "vende" o seu voto, em troca de benefícios pessoais ou de favores. O eleitor pode vetar o candidato "ficha suja" e deve mesmo fazer isso, com o cuidado de não se opor a candidatos injustamente acusados, mas orientando-se pelo interesse público, que é também o seu interesse.

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