sexta-feira, 20 de abril de 2007

A CPI do Apagão e a credibilidade perdida

Independentemente da solução que seja dada pela oposição à investigação das causas da crise aérea vivida pelo país - uma CPI na Câmara ou uma CPI no Senado; duas CPIs, uma na Câmara e uma no Senado; ou uma CPI Mista - ela terá sido a primeira grande vítima dos espetaculares shows feitos por comissões de inquérito nos dois últimos anos do primeiro mandado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

As comissões de inquérito que marcaram 2005 e 2006, por serem firmadas em justificativas políticas e éticas, foram até levadas a sério de início. Mas, com o passar do tempo, propiciaram pelos canais exclusivos da Câmara e do Senado um reality show tão contaminado por exageros e conveniências político-eleitorais que deram aos brasileiros atentos ao espetáculo a impressão de que, na verdade, assistiam os momentos que antecederiam o final do mundo. Um uso político tão claro dos graves episódios que envolveram a criação daquelas comissões fez com que elas se virassem contra uma oposição que excedia na agressividade do discurso, apresentava indícios inconclusivas e escondia seus próprios culpados.

O principal resultado dessas CPIs foi o desgaste de mecanismos legislativos de acompanhamento e controle das ações de governo. Ao final de tanto barulho, o Congresso reuniu e tem em seu poder sigilos telefônicos e bancários de milhares de pessoas que não tiveram nenhuma relação com os episódios - e não seria um exagero temer pelo destino desses papéis pois, dada a quantidade requerida aos órgãos públicos responsáveis, formam uma montanha de dados de gerenciamento e administração impossíveis. O que escapou para a imprensa foram provas de entendimento mais fácil. No final das contas, pouco do que se produziu nas CPIs vai ser usado agora pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que inicia a abertura das ações contra os denunciados pelo procurador-geral da República.

O desgaste é fato - e certamente este é o maior problema para uma eventual CPI do Apagão Aéreo. No site do PSDB, o próprio deputado Maurício Fruet (PR) reconhece isso: "A comissão não pode dar margem à saturação. Precisamos de uma CPI de resultados, diferente das outras já realizadas. Não é uma comissão que deve se apoiar somente em quebras de sigilo bancário, fiscal e telefônico. Os trabalhos devem ser bem mais estruturados tecnicamente e capazes de apontar o diagnóstico e indicar soluções".

Uma CPI do Apagão, de fato, só teria o dom de resgatar a credibilidade de uma investigação legislativa se for mais técnica do que política. A CPI envolverá, afinal, uma força militar, a Aeronáutica, um intrincado e mal-resolvido relacionamento com o Ministério da Defesa e relações que ora são de competência civil, ora de competência militar. Isso é muito mais delicado do que simplesmente achar corruptos. Aliás, se a intenção da oposição for apenas essa, e se agir com a incompetência das CPIs passadas, ela ainda corre o risco de comprometer o trabalho já feito pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que já resultou no afastamento de diretores e funcionários da Infraero, e também do Ministério Público Federal que, a pedido do próprio ex-PFL, está investigando o assunto.

O país está vivendo uma crise aérea séria que envolve questões de alto grau de complexidade e, se os parlamentares passarem ao largo delas, poderão inibir não apenas a a atribuição de responsabilidade de fato dos corruptos, mas adiar decisões que são urgentes - como desmilitarizar, ou não, o controle aéreo.

Uma comissão eficiente, neste momento, deve se envolver a fundo em questões que os parlamentares evitaram e evitam desde o final da ditadura. Apesar de o presidente Fernando Henrique Cardoso ter criado o Ministério da Defesa, ele efetivamente nunca existiu - e jamais o poder civil teve a coragem de se envolver, junto com os militares, numa discussão séria do que seria uma Doutrina de Segurança Nacional num país democrático. Sem doutrina e sem articulação, as três forças militares carregam funções cumulativas que lhes foram sendo atribuídas ao longo da história e que, dado o Estado democrático e, principalmente, o grande salto tecnológico ocorrido nas últimas décadas, podem ter resultado em inoperância.

0 Comentários em “A CPI do Apagão e a credibilidade perdida”

Postar um comentário

 

Consciência Política Copyright © 2011 -- Template created by Consciência Política --