quarta-feira, 18 de abril de 2007

STF prorroga prisão de acusados

Peluso manteve presos envolvidos com a exploração ilegal de jogos depois que a PF alegou que a medida era necessária para impedir interferências no inquérito

Os 25 presos durante a Operação Hurricane continuarão por mais cinco dias na carceragem da Superintendência da Polícia Federal, no Setor Policial Sul. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cezar Peluso, comandante da investigação, decidiu ontem prorrogar a prisão temporária dos detidos a pedido do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. Delegados da PF que conduzem a investigação alegavam que a medida era necessária para impedir interferências no inquérito, como a destruição de provas e combinações de versões.

A ordem judicial que os mantinham na cadeia vencia hoje às 6h. Ontem pela manhã, os delegados da PF conversaram com o procurador-geral da República e argumentaram que, além de possíveis interferências na investigação, não havia sido possível ouvir todos os 25 presos na operação — até ontem à noite faltavam cinco pessoas para depor, entre eles o advogado Virgílio Medina, irmão do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Paulo Medina, citado na investigação em curso no Supremo.

Após o STF liberar a consulta dos autos do processo aos advogados, mais de 10 profissionais foram ontem ao tribunal para conferir o conteúdo. Muitos profissionais conseguiram obter cópias em disquete e em CD do inquérito, que corre em segredo de Justiça, depois de pedir autorização para o ministro Cezar Peluso. E revelaram que assinaram um termo comprometendo-se a não vazar informações. “O que a PF não fez nós faremos. Há sigilo reservado e a abertura de vista ao advogado se deu em contrapartida a um compromisso de não-revelação do conteúdo da documentação examinada”, afirmou o advogado Nélio Machado, que defende o desembargador federal José Ricardo de Siqueira Regueira e outros dois presos pela PF.

Segundo Machado, que disse ter consultado o inquérito rapidamente, seus três clientes respondem a acusações de formação de quadrilha. Além de Regueira, ele defende o presidente da Liga das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa), Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, e o sobrinho, Júlio Guimarães, que também seria citado, de acordo com o advogado, por envolvimento com o crime organizado.

Sindicância
Os advogados também criticaram, em coro, as prisões realizadas pela PF. Para eles, foram ilegais. Até agora, o processo que corre no Supremo já tem 118 petições, entre eles vários pedidos de relaxamento de prisão e também solicitações de acesso aos autos. O ministro Cezar Peluso autorizou a consulta do inquérito aos advogados dos presos depois de insistentes pedidos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Ontem, o corregedor-nacional de Justiça, o ministro do STJ Antônio de Pádua Ribeiro, que havia determinado a abertura de sindicância no Conselho Nacional de Justiça para apurar infrações disciplinares dos juízes envolvidos no caso, se declarou impedido para prosseguir com a investigação. O provável motivo para o pedido de afastamento foi que entre os acusados estaria o ministro do STJ Paulo Medina. Em 2003, a filha de Pádua acusou Medina por assédio sexual no STF. A Corte, porém, não acolheu a queixa por falta de provas.

Bicheiros de São Paulo são próximo alvo

Depois de prender na última sexta-feira a cúpula do jogo do bicho no Rio, e seus tentáculos na polícia, no Judiciário e no Ministério Público, a Polícia Federal pretende alcançar o esquema de exploração de jogos ilegais em outros estados, como São Paulo. Se a primeira etapa da Operação Hurricane (furacão, em inglês) atacou diretamente os bicheiros que dirigem a Liga Independente das Escolas de Samba do Rio (Liesa), com a prisão de seus dois principais dirigentes — o presidente Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, e Anísio Abraão David, integrante do conselho da Liesa —, o novo furacão poderá atingir responsáveis por esses negócios em outros pontos do país.

Um dos alvos seria o banqueiro do jogo do bicho Ivo Noal, que já foi porta-voz da contravenção em São Paulo e esteve detido por crimes contra a ordem tributária. Ele foi preso pela última vez no ano passado, quando a polícia paulista estourou um cassino clandestino no Itaim-Bibi, Zona Sul da cidade. Fontes policiais informam ainda que estão sendo rastreadas ações da Associação Brasileira dos Bingos (Abrabin) e da Febrabingo (Federação Brasileira dos Bingos), conhecidas por fazer um ostensivo lobby pela legalização dos jogos eletrônicos no país. As entidades patrocinam o chamado Movimento Pró-Bingo, que funciona em um conjunto de salas no Edifício Brasil 21, no Setor Hoteleiro Sul, em Brasília.

Ex-secretário Nacional Antidrogas do governo federal, o juiz aposentado Walter Mayerovitch, apoiou a ampliação das investigações da Operação Hurricane. “É fundamental ir além das fronteiras do Rio. Não se trata de extirpação de um cancro, mas de metástase”, afirmou Mayerovitch. “Toda organização criminosa que adquire o formato piramidal, com órgão de cúpula, como o jogo do bicho no Rio, é parasitária, sobrevive grudada ao Estado, corrompendo e criando uma cinta de proteção. Como o negócio se espalhou pelo país (apenas no Paraná o jogo é proibido), é preciso buscar esses parasitas onde eles estiverem e os órgãos onde estão grudados”, definiu o ex-secretário, que não tem dúvida da ligação do setor de máquinas caça-níqueis com cartéis criminosos que lavam dinheiro sujo.

Suspeita
“No Rio, os mafiosos fizeram acordo com a cúpula do jogo do bicho. Em São Paulo, com o Ivo Noal e o Alejandro Ortiz. E por aí afora”, aponta Mayerovitch, lembrando a família suspeita de ter ligações com a máfia italiana no negócio de jogos. Alejandro e seu irmão Johnny negaram essas acusações durante a CPI dos Bingos.

Quem falou ontem pelo setor foi o presidente da Febrabin, Carlos Eduardo Canto, que divulgou a nota “O jogo do bingo é ilegal ou apenas desregulamentado?”, onde lamenta que os bingos sejam novamente apontados como ligados a atividades escusas. Ele diz que a entidade não teme investigações. “Resistimos a uma ano de CPI dos Bingos. Se querem investigar, investiguem. Mas façam isso com o setor regulamentado”, propõe Canto. “Não dá pra dizer que todos os empresários do setor são ligados a uma máfia. Isso é absurdo”, protesta o empresário, que teve seus dois bingos fechados pelo governador do Paraná, Roberto Requião.

Entre os presos na Operação Hurricane estão Paulo Roberto Ferreira Lino e José Renato Granado Ferreira, presidente e ex-presidente da Associação de Bingos do Estado do Rio. Procurado por meio de sua assessoria, o presidente da Abrabin, Olavo Sales da Silveira, não foi localizado. Por meio de sua assessoria, a Liesa informou que a associação não vai se pronunciar, alegando que está em recesso desde o dia 2 de abril, com os funcionários em férias coletivas.

O recesso duraria até o próximo dia 24. Já a Prefeitura do Rio reafirmou que manterá suas relações institucionais com a liga comandada por bicheiros presos, alegando que são apenas patronos. “A Liesa é uma empresa de enorme competência técnica e seus presidentes de honra não são gestores”, afirmou o prefeito. Desde o estouro da Operação Hurricane o prefeito César Maia, que mantém um diário virtual, ainda não tratou do tema em seu comentado espaço. “Quando uma matéria é extensamente tratada nos jornais o ex-blog não precisa tratar, a menos que tenha uma informação nova a dar”, explica.

Nem o site da Liesa, nem o site da Abrabin fazem qualquer menção às prisões da Operação Hurricane. Entre as últimas notícias destacadas no site da Abrabin está uma reunião realizada recentemente no Espaço Fecomércio, em São Paulo, do Movimento Pró-Bingo, do qual participaram 300 empresários do setor no estado, um consultor de jogos da Argentina, Jorge Atílio Cambareri, o ex-secretário da Receita Federal Osiris Lopes Filho, e um vereador de Porto Alegre, Adeli Sell (PT), autor de projeto de lei municipal que regulamenta os bingos em Porto Alegre.

Segundo o site, o ex-xerife da Receita isentou os bingos da principal acusação que recai sobre eles: a de servirem para lavagem de dinheiro sujo. “Cheguei à conclusão da total falta de viabilidade de lavagem de dinheiro em bingos”, teria dito Osiris, apresentado pelo site como uma espécie de consultor da entidade. O site da Abrabin faz questão de destacar várias decisões judiciais a favor da “causa” dos jogos no país. A que ganha maior destaque é a tomada pela juíza Alexandra Fuchs de Araújo, da 7ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, obrigando a Prefeitura de São Paulo a fornecer alvará de funcionamento para uma casa de bingo no bairro do Tatuapé, Zona Leste da capital paulista. E listam outras 40 liminares e mandados de segurança conseguidos em favor do funcionamento de casas de bingo, concedidas por juízes em estados como São Paulo, Pernambuco, Ceará e Santa Catarina e Distrito Federal.

Caçada a doleiros em quatro estados

A Polícia Federal desarticulou ontem, na capital paulista, cinco grupos de doleiros (pessoas que atuam no mercado de moedas estrangeiras sem ter autorização do Banco Central)— ao todo 22 pessoas. Durante a Operação Kaspar, que abrangeu os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Amazonas, 240 policiais federais cumpriram 52 mandados de busca e apreensão, grande parte deles na região metropolitana de São Paulo.

A operação foi deflagrada para desmanchar uma rede de crimes fiscais, financeiros e de lavagem de dinheiro, que, por meio de representantes de um banco suíço, promovia operações de câmbio ilegais para clientes daquele banco. Pelo mercado paralelo, os doleiros enviavam divisas de seus clientes para fora do país ou justificavam a existência de recursos financeiros de origem ilícita (lavagem de dinheiro).

Apesar de independentes entre si, os grupos estavam articulados e movimentavam cerca de US$ 30 milhões por mês no mercado ilegal de câmbio, estima a PF. Foram apreendidos documentos relativos a transferências bancárias; microcomputadores portáteis (notebooks); discos rígidos; 24 carros de luxo; US$ 700 mil e R$ 177 mil em espécie; e uma pistola semi-automática. Ainda estão foragidos três suspeitos de envolvimento com os doleiros. Numa casa de câmbio, os agentes encontraram escondidos numa parede falsa cerca de US$ 550 mil e até num ralo (US$ 177 mil).

As empresas que negociavam com os doleiros foram alvo de mandados de busca, e seus representantes legais serão investigados por suspeita de crimes fiscais, financeiros e de lavagem de dinheiro. Também foram “congeladas” 19 contas bancárias dentro do país usadas pelos grupos, além de outras seis nos Estados Unidos, Portugal e Panamá, pertencentes aos suspeitos.

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