domingo, 18 de março de 2007

Dirceu e Jefferson, anistia difícil


Ao vencer, por estreita margem de votos, a eleição para a presidência da Câmara, Arlindo Chinaglia afirmou que é preciso esquecer o passado, nitidamente referindo-se aos envolvidos nos escândalos do mensalão e das ambulâncias, além de na elaboração do dossier Pelicano, manobra fracassada para prejudicar a vitória de José Serra em São Paulo. Claro que os processos abertos na esfera parlamentar, com estas palavras, não vão ter curso na legislatura que se inicia, cujos dois primeiros anos vão tê-lo na presidência.

O Ministério Público continua agindo, mas ficou ugualmente claro que não serão concedidas licenças para a Justiça processar os acusados que foram eleitos. Mas apesar das aparências, sobretudo as que sinalizavam a aprovação de uma lei de anistia para o ex-deputado José Dirceu, a postura de não revolver o passado, como na canção de Herivelto Martins, estende-se negativamente tanto ao ex-chefe da Casa Civil quanto ao ex-deputado Roberto Jefferson. Está implícito.

Eles tiveram seus mandatos cassados e decretada a perda por oito anos de seus direitos políticos no passado recente. Portanto, não tocar no que passou é algo excludente para os dois parlamentares atingidos por decisões quase simultâneas da Câmara dos Deputados. Não voltar ao passado, analisando-se o conteúdo da afirmação, significa concretamente não rever as punições aos representantes do PT e do PTB.

Não importa que Chinaglia tenha obtido o apoio de Dirceu, tampouco que Jefferson tenha estado presente à posse dos novos deputados. Importa é que uma revisão de seus processos ou a concessão de anistia a ambos é extremamente difícil. Praticamente impossível até.

Sob o ângulo jurídico, provavelmente a anistia não exige aprovação de emenda constitucional, já que a lei de 79, originária de mensagem do presidente João Figueiredo e sancionada pelo último presidente do ciclo militar de poder, antecede em nove anos a promulgação da Carta Constitucional de 88. Mas depende de maioria absoluta, pois Dirceu e Roberto Jefferson foram cassados por este quorum especial.

Assim, para devolução de seus direitos, a partir das eleições de 2010, teria que ser adotado o mesmo sistema. A questão porém não é jurídica, é essencialmente política. Admitindo-se, apenas para raciocinar, que a disposição de Arlindo Chinaglia fosse a de reabilitar o ex-primeiro ministro do governo Lula, tal reabilitação teria forçosamente que se estender ao ex-presidente nacional do PTB. Sobretudo porque a cassação de José Dirceu decorreu de uma autodenúncia por parte de Jefferson, atitude inédita e singular na história política brasileira, pelo menos de 1945 até hoje.

Roberto Jefferson confessou ter recebido proposta de cooptação por parte de José Dirceu, não a repelindo. Pelo contrário, por linhas oblíquas, recebeu 4 milhões de reais para a campanha eleitoral do Partido Trabalhista Brasileiro e não revelou a que pessoa ou pessoas efetuou o repasse, ainda que parcial. Pode-se presumir assim que depositou em sua própria conta. Talvez, admito, nela a quantia se encontre até hoje. Isso ele não explicou. Pode ser que explique ainda. Não é provável, mas é possível.

José Dirceu, acusado de articular o mensalão, não se defendeu de forma capaz de convencer a maioria absoluta da Câmara. Tanto assim que teve o mandato casado. Dirceu e Jefferson, pela lei, só podem ser candidatos em 2014. A menos que decidam concorrer às eleições municipais de 2012. Mas esta é outra questão.

Além de todos estes obstáculos a uma revisão, outros fatos podem ser adicionados na estrada da impossibilidade. Em primeiro lugar, o presidente Lula não tem o menor interesse no retorno de Dirceu, no estilo do Conde de Monte Cristo, romance imortal de Alexandre Dumas. Por que teria? José Dirceu criou um problema enorme para ele, do qual conseguiu se desvencilhar graças à atuação da ministra Dilma Rousseff. Em segundo lugar, a concessão de anistia fora de situações ditatoriais é algo inédito na história do País.

Em terceiro, não teria sentido voltar atrás no relágio do tempo no sentido Dirceu e não agir da mesma forma na direção Jefferson. Em quarto lugar, o espaço de Dirceu no PT parece ocupado pela ministra-chefe da Casa Civil. Agir para José Dirceu retornar à atividade política legal significaria comprimir o espaço ora ocupado por Dilma Rousseff. A divisão nos quadros petistas tornar-se-ia inevitável. Refletiria na unidade partidária para a próxima sucessão prsidencial. Mas há outra questão.

A vitória de Arlindo Chinaglia abalou em parte a liderança do presidente Lula. Seu candidato era Aldo Rebelo. O êxito do parlamentar paulista representou uma reação de setores partidários ao chefe do Executivo. Demonstraram por essa via insatisfação quanto à pouca presença do partido no governo. Não há dúvida.

Por isso mesmo, Luís Inácio da Silva não pode ser favorável a uma lei de anistia incluindo a devolução dos direitos políticos de Dirceu e Jefferson. Além do mais, por se tratar de uma lei, teria que ser sancionada por ele, Lula. Dificilmente sentir-se-ia confortável no uso da caneta. Seja para sancionar ou vetar, um abacaxi nos dois sentidos. O melhor para Lula, é claro, é que não seja aprovada lei alguma anistiando ninguém. Por tudo isso, a vitória de Chinaglia criou um constrangimento no Planalto. Mas é improvável que produza maremoto.

1 Comentários:

  • domingo, 18 março, 2007
    Anônimo Disse:

    Roberto Jefferson é réu confesso, admitiu que aceitava dinheiro, e ainda retratou-se quanto a José Dirceu.

    Isto a mídia não divulga, mas é aí que a porca torce o rabo.

    delete

Postar um comentário

 

Consciência Política Copyright © 2011 -- Template created by Consciência Política --