sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

FHC sai da retaguarda e acena com composição


O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deve ser considerado o ideólogo da derrota do governo na votação da CPMF, mas foi o medo de um novo vexame que levou o PSDB a votar em bloco contra o imposto do cheque, ao contrário da divisão ocorrida em outras situações, sempre em favor do governo.

Havia no mínimo quatro votos prováveis de tucanos pela CPMF - Eduardo Azeredo (MG). João Tenório (AL), Cícero de Lucena (PB) e Lúcia Vânia (GO) -, entre outros menos visíveis. Além disso, os governadores do partido colocaram seu prestígio à prova, ao defender um acordo com o governo para aprovar o tributo. FHC em nenhum momento escondeu suas opiniões sobre qual deveria ser o posicionamento do partido em relação à CPMF. Publicamente e nas conversas com os tucanos, intensificadas nos últimos dias.

Nessas conversas, FHC dizia que a votação da CPMF era uma "questão crucial". Ele afirmava não entender a posição adotada pelos governadores. "Eles não estão enxergando o significado que isso tem?", questionava, nas conversas com os parlamentares. A argumentação do ex-presidente: não havia outro jeito de parar com a "arrogância e irresponsabilidade fiscal dessa gente".

Por mais de uma vez, FHC criticou os governadores estaduais, entre eles José Serra (SP) e Aécio Neves (MG), os dois potenciais candidatos do partido a presidente, nos quais via "insensibilidade" para não compreender a conjuntura. "Eles (o governo Lula, com os R$ 40 bilhões da CPMF), vão continuar com essa irracionalidade", dizia. O protagonismo do ex-presidente no processo de votação do imposto do cheque foi traduzido em nota divulgada por ele ontem.

"Em qualquer democracia digna deste nome, a oposição, ao votar contra uma proposta do governo, não fecha os olhos ao interesse nacional", disse FHC, antecipando-se às críticas do Palácio do Planalto. "A oposição deixou isso claro ao ajudar na aprovação da DRU e manifestar disposição para retomar as negociações com o governo no futuro imediato", argumentou.

Segundo FHC, era evidente, há tempos, "que a cidadania cansou de pagar tributos, ainda mais agora, em um momento em que a conjuntura econômica e a situação das finanças públicas permitem avançar na discussão racional da receita e do gasto dos governos". Para o ex-presidente, quanto mais o país avançar nessa direção, maior poderá ser a queda das taxas de juros. "O governo parece não ter compreendido esse fato", disse.

Em tom menos belicoso que o habitual, nas críticas a Lula, Fernando Henrique acena na direção de uma composição: "É o momento de governo e oposição, pensando no Brasil, deixarem de lado as picuinhas e se concentrarem na análise e deliberação do que é necessário fazer para (...) aliviar a carga tributária (...) e assegurar recursos para a Saúde e as demais áreas sociais, não apenas no nível federal, mas, sobretudo, no nível estadual, como demandam, com razão, os governadores", afirmou.

A atuação de FHC causou algum mal-estar entre tucanos, mas expressões como a de que ele aposta no "quanto pior melhor" são atribuídas no PSDB ao Palácio do Planalto e não ao governador Serra, como noticiado. Serra e FHC sempre mantiveram altos e baixos em suas relações políticas, mas quase sempre o ex-presidente da República, quando tem de arbitrar, fica do lado do amigo governador.

Serra e Aécio atuaram em causa própria - além de recursos da CPMF para a Saúde nos Estados que governam, os dois temiam retaliações do governo federal na hipótese de os tucanos não ajudarem a aprovar o imposto do cheque, como ocorreu. Mas, além do estresse FHC-Serra, a maior indisposição, no momento, é de Aécio Neves com o líder no Senado, Artur Virgílio.

De fato, tendo FHC na retaguarda, Virgílio foi quem segurou a bancada tucana. Quando Lula enviou a proposta de prorrogar a CPMF só até 2009 - apresentada pelo deputado Antonio Palocci (PT-SP) -, os tucanos pró acordo esbarraram na resistência de Virgílio. A pedido de Sérgio Guerra, FHC telefonou para o líder que Mário Covas chamava de "verbo amazônico" para que ele considerasse a hipótese de adiar a votação. Mas antes avisou que dificilmente conseguiria demovê-lo de posição que ele mesmo, ex-presidente, defendia.

No telefonema, segundo testemunhas de uma reunião da bancada na casa do senador Sérgio Guerra, Fernando Henrique teria ponderado com Artur Virgílio que talvez fosse o caso de conhecer melhor a proposta encaminhada por meio de Palocci, até para entender os interesses do governo. Há tucanos que acham que FHC foi absolutamente sincero; outros - o que é também opinião no Palácio do Planalto - , que tudo não passou de um jogo de cena entre o ex-presidente da República e o líder no Senado. E o que ocorreu foi exatamente o que FHC previra a Sérgio Guerra.

Arthur Virgílio recusou-se a aceitar um novo adiamento, radicalizou e chegou a ameaçar que deixaria o partido. Os senadores que pretendiam votar a favor sentiram-se constrangidos a insistir com a proposta e optaram por votar em bloco contra a CPMF. Para evitar a imagem recorrente de desunião, de partido sempre em cima do muro que não sabe exatamente o que quer ou para onde vai, e que não sabe se é ou não oposição.

A primeira avaliação dos tucanos é que a rejeição da CPMF teve aprovação popular. E que o governo não terá como reagir com medidas impopulares - e atribuir ao PSDB a responsabilidade - porque também terá que passar por uma eleição em outubro de 2008.


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