quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Mãe de Betancourt "suplica" ajuda de Lula


Yolanda Betancourt diz suspeitar que o governo colombiano segurou as provas de vida de Ingrid para boicotar Chávez

Ela diz odiar Uribe, que chama de "arrogante", e diz que tentativa de libertar reféns das Farc por meios militares será fracassada

Yolanda Pulecio Betancourt usa um verbo forte para se dirigir ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Eu suplico a ajuda de Lula e do governo brasileiro para libertar minha filha".

Yolanda é mãe de Ingrid Betancourt, 45, ex-presidenciável colombiana que foi seqüestrada há cinco anos e nove meses pelas Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), guerrilha que controla quase um terço do país. Ela fez questão de viajar de Bogotá a Caracas no último sábado, com um grupo de familiares de seqüestrados, para discutir a situação do acordo humanitário, de troca de reféns por prisioneiros das Farc, que vinha sendo negociado entre a guerrilha e o governo, com a intermediação do presidente venezuelano Hugo Chávez e o apoio de seu colega francês, Nicolas Sarkozy (Ingrid é franco-colombiana).

No dia 21 de novembro, Uribe suspendeu as negociações [ele anunciou ontem um plano para retomá-las] e descartou a ajuda de Chávez, alegando ingerências do venezuelano em assuntos internos da Colômbia. Os dois atos afligiram os familiares dos seqüestrados, que acalentavam a esperança de conseguir passar o Natal com seus parentes.

"Devido à crueldade, arrogância e insensibilidade de Uribe, voltamos à estaca zero", disse Yolanda, os olhos enchendo-se de lágrimas, no lobby do hotel Meliá, Caracas, onde se hospedou. Durante toda a conversa, ela acariciou uma pasta que continha a carta de 12 páginas escrita por Ingrid e enviada pelas Farc como prova de vida da seqüestrada. Abaixo, trechos da entrevista que deu à Folha.


PROVAS DE VIDA

No dia 30 de novembro, os familiares recebemos cartas e fotos de 16 dos seqüestrados -as de Ingrid estavam entre elas. Cúmulo do absurdo, recebi só uma xerox da carta de minha filha. Eles [as autoridades colombianas] ficaram com os originais e ainda distribuíram o texto à imprensa. Eram 12 páginas manuscritas endereçadas a mim e eles, num completo desrespeito, divulgaram-nas. Eu nunca duvidei de que minha filha estivesse viva. Uma mãe sabe o que está acontecendo com suas crianças, mesmo que estejam longe. E eu não queria as provas porque Uribe, para fazer seu show e justificar a guerra estúpida contra a guerrilha, poderia pôr em risco a vida dos nossos entes queridos.

É que, para fazer com que essas provas cheguem ao seu destino, os militantes das Farc têm de se expor muito. E o governo poderia usar o emissário para obter informações que subsidiassem eventual tentativa de resgate militar. A história colombiana recente tem inúmeros cadáveres de seqüestrados que perderam suas vidas porque ficaram no meio do fogo.

SUSPEITA

A carta de Ingrid foi escrita entre 23 e 24 de outubro deste ano. Devia ter chegado antes da reunião de Chávez com Sarkozy, marcada para o dia 20 de novembro. Mas só foi entregue a mim depois do encontro dos chefes de Estado e depois que Uribe já havia dispensado o auxílio de Chávez na negociação.
Começamos a sentir interesses estranhos. Cada vez que avançamos, o presidente Uribe faz qualquer coisa para nos deter. Faz um ano que é assim. Agora, estávamos com esperança de, pela primeira vez em seis anos, passarmos o Natal todos juntos. O dia 25 de dezembro é também o aniversário da Ingrid. Ela tinha 40 anos... É muito cruel. Já vão seis anos.

Eu suspeito de que agentes do governo interceptaram as provas de vida antes da reunião e que as retiveram até depois que ela ocorresse, para demonstrar que nada estava avançando e, assim, justificar a dispensa da ajuda do governo venezuelano. Estou certa de que Uribe não tem nenhuma consideração humana. Ele coloca seus interesses políticos acima da vida das pessoas. É um homem sem alma.

CONVERSA COM URIBE

Há dois anos e meio Uribe se recusa a falar comigo. Da última vez que nos encontramos, discutimos. Ele não gosta de mim e eu menos ainda dele. Ele é falso. Chávez, ao contrário, fala olhando nos olhos. Assim que anunciou o resultado do referendo, adverso para ele, disse-me: "Estou falando com o coração, se o povo assim quis, assim será".

RESSENTIMENTO
Antes do seqüestro de Ingrid, eu achava que nunca conseguiria odiar alguém. Hoje sei que consigo. Mas não são os guerrilheiros -até dizem que estou sofrendo de síndrome de Estocolmo, mas eu nunca falo mal da guerrilha porque, afinal, eles estão com a minha filha.

Meu ódio dirige-se a Uribe, com sua arrogância, insensibilidade e irresponsabilidade com a vida humana. Todos os dias vou à igreja para me confessar e pedir perdão pelos maus sentimentos que tenho em relação a ele. Mas não passa. As ruas de Bogotá estão cheias de gente, de camponeses deslocados, que saíram de suas terras para salvar suas vidas, que não estão preparados para viver em uma cidade grande. Vieram fugindo da guerra.

SÚPLICA

Eu peço que todos os políticos, artistas, escritores se mobilizem em toda a América Latina para nos ajudar a libertar Ingrid e demais seqüestrados. Isso que está acontecendo na Colômbia pode acontecer em qualquer país. E suplico ao presidente Lula e ao governo brasileiro que intervenham para fazermos o acordo humanitário, que trará o caminho da paz.

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