O consumo das famílias deve ter mais um ano positivo em 2008, favorecido pela expectativa de continuidade da trajetória de alta do emprego e da renda e da ampla oferta de crédito. Acredita-se em uma expansão superior a 6% para o consumo privado, o mais importante componente da demanda, que responde por 60% do Produto Interno Bruto (PIB). Nem todos os setores, porém, deverão se beneficiar igualmente desse movimento: um estudo do Credit Suisse aponta perspectivas melhores para os segmentos da economia que vão ganhar com a expansão do crédito - como imóveis, veículos e motos, serviços financeiros, celulares e computadores - e com a mudança de hábitos dos consumidores.
A expansão da renda, a maior participação da mulher no mercado de trabalho e o envelhecimento da população deverão alterar os hábitos de consumo, segundo os economistas do banco. "Esperamos que a demanda por educação, saúde e transporte cresça proporcionalmente mais do que a renda, enquanto a demanda por alimentos e vestuário deve crescer proporcionalmente menos", diz o economista-chefe do Credit Suisse, Nílson Teixeira.
Em 2007, o consumo das famílias foi um dos principais motores da demanda doméstica, ao lado do investimento. O economista-chefe do HSBC, Alexandre Bassoli, diz que o bom desempenho do principal componente da demanda se deve à situação favorável do mercado de trabalho e à expansão robusta do crédito. "Esses dois pilares devem continuar favorecendo o consumo das famílias em 2008."
Teixeira também é otimista quanto à expansão do consumo das famílias por conta desses dois fatores. "Nós prevemos expansão entre 6,5% e 7% ao ano da massa real de rendimentos em 2008 e 2009." Para 2007, a estimativa é que a alta tenha ficado em 6%. Teixeira acredita também na continuidade da elevação do crédito a taxas elevadas. Entre julho de 2003 e outubro de 2007, os financiamentos bancários para as pessoas físicas aumentaram de 5,5% do PIB para 11,6% do PIB.
Nesse cenário, Teixeira aposta numa expansão do consumo das famílias de 6,4% em 2008 e de 6,9% em 2009, numa trajetória de aceleração em relação aos 6,1% previstos para 2007. Bassoli é um pouco mais cauteloso, prevendo alta de 6% este ano. Ele acha que o país ainda tem restrições de oferta que dificultam um crescimento mais acelerado. Além disso, o efeito defasado dos cortes de juros ocorrido nos últimos meses deve ter impacto sobre a atividade econômica no primeiro semestre. Com a perspectiva de juros estáveis por um bom período, o consumo tende a desacelerar na segunda metade deste ano, acredita Bassoli, que prevê taxa Selic inalterada em 11,25% até o fim deste ano, enquanto Teixeira aposta em juros de 10,25% para o mesmo período.
Para o Credit Suisse, os setores que mais devem se beneficiar em 2008 e 2009 são os dependentes do crédito. A venda de veículos leves e motos tende a continuar firme, acredita Teixeira. "A demanda por esses bens duráveis tem reagido significativamente ao aumento da renda, da confiança e da disponibilidade de crédito."
De janeiro a outubro de 2007, as vendas de veículos e motos, partes e peças cresceram 29,9% em relação ao mesmo período de 2006. Teixeira acrescenta ainda que "o aumento do crédito e da confiança dos consumidores está impulsionando a demanda por outros bens duráveis, como os equipamentos de informática, móveis, eletrodomésticos e celulares". De janeiro a outubro de 2007, a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE mostrou expansão de 13,5% na venda de móveis e eletrodomésticos.
Bassoli também acredita que o setor de bens duráveis é que deve ser o mais beneficiado pelo aumento do consumo das famílias. "O efeito do crédito é muito poderoso e não vejo sinal de que ele vá arrefecer no curto prazo."
Além da aposta nos bens duráveis, o estudo do Credit Suisse indica que haverá uma expansão de serviços relacionados ao mercado de automóveis, como os de reparação. O segmento de álcool combustível também deve ir bem. "A participação de automóveis e comerciais leves do tipo flex fuel nas vendas domésticas aumentou de 3,7% em 2003 para 85,4% no acumulado de 2007 até novembro", nota Teixeira.
Ele também vê com otimismo o cenário para o transporte aéreo. Depois de registrar um mau desempenho no terceiro trimestre de 2007, especialmente em agosto, o número de passageiros transportados por via aérea aumentou em setembro - 7,6% sobre o mesmo mês do ano anterior. O crédito ajuda o segmento, já que hoje uma parte significativa das vendas de bilhetes aéreos é feita a prazo.
O economista Bráulio Borges, da LCA Consultores, é um pouco menos otimista do que Teixeira e Bassoli quanto às perspectivas para o consumo das famílias em 2008. Ele prevê uma alta de 5,4%, ainda expressiva, mas menor que os pouco mais de 6% registrados em 2007. Borges diz que o salário mínimo deve subir menos do que nos últimos anos, e diz que a alta dos preços dos alimentos acaba por reduzir a renda disponível dos consumidores para comprar outros produtos.
Além disso, ele acredita que os prazos das operações de crédito não devem mais aumentar significativamente e tampouco há espaço para grandes avanços da confiança do consumidor, dois fatores que impulsionaram financiamentos e empréstimos em 2007. Isso não quer dizer, porém, que Borges veja um quadro ruim para o consumo. "O crescimento deve continuar forte, mas a taxas menores do que em 2007". No caso das vendas de automóveis, por exemplo, ele prevê uma alta de 15% em 2008, um número robusto, mas bem menor que os cerca de 30% registrados no ano passado.