segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Em nome dos pedetistas


Documentos obtidos pelo Correio Braziliense revelam que, tal qual previsto pela Comissão de Ética Pública, há indícios consistentes de favorecimento aos interesses do PDT em atos de ofício do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Presidente nacional do partido ao mesmo tempo em que comanda a pasta, Lupi estaria distribuindo irregularmente registros para sindicatos ligados à Força Sindical, central trabalhista hoje atrelada ao PDT.

O exemplo mais bem acabado do que vem acontecendo nos bastidores do Ministério do Trabalho diz respeito aos sindicatos de frentistas de todo o país. Trata-se de uma categoria profissional rachada, sob disputa de dois ramos do sindicalismo, um ligado ao PT e à Central Única dos Trabalhadores (CUT), outro alinhado ao PDT e à Força Sindical. Os sindicatos mais antigos, nos quais estão associados todos os funcionários de postos de gasolina, do gerente ao borracheiro, estão unidos na Federação Nacional dos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo, filiada à CUT.

Outros sindicatos mais novos, abrangendo a mesma base trabalhista, aninharam-se na Federação Nacional dos Empregados em Postos de Serviço de Combustíveis e Derivados de Petróleo, também chamada de Federação Nacional dos Frentistas, filiada à Força Sindical.

Há exatos dois meses, Lupi envolveu-se na pendenga dos frentistas exatamente no Rio de Janeiro, estado onde mora e faz política. Foi lá onde, conforme atesta dossiê ao qual a reportagem teve acesso, o ministro e o dirigente partidário se enroscaram de forma tal que até mesmo uma liminar da Justiça do Trabalho acabou olimpicamente ignorada. No fim das contas, um registro sindical novinho em folha foi entregue com solenidade e tudo ao pessoal da Força. E o caso, provavelmente, vai parar na Justiça.

“Estamos tentando marcar uma reunião com o ministro desde dezembro. Se ele não nos receber, seremos obrigados a entrar com um mandado de segurança contra o ministério”, ameaça Sérgio Vieira, presidente do sindicato ligado à CUT, que está a ver navios desde o dia 5 de novembro do ano passado. Naquela data, Lupi foi pessoalmente à Delegacia Regional do Trabalho do Rio entregar o registro sindical ao Sindicato dos Empregados em Postos de Serviços de Combustíveis e Derivados de Petróleo do Estado do Rio de Janeiro (Sinpospetro), filiado à federação ligada à Força Sindical e, indiretamente, ao próprio PDT.

O pedido de registro desse sindicato havia sido feito em 2005 e impugnado pelo pessoal da CUT. O argumento era o de que a classe trabalhista organizada no novo sindicato — os empregados de postos de gasolina — já estava representada no antigo. Sendo assim, o princípio constitucional da unicidade sindical seria desrespeitado se o ministério chancelasse a criação da entidade mais nova.

A impugnação do sindicato fluminense ligado à Força, porém, sucumbiu ao velho jeitinho brasileiro. Em 2004, a pendenga entre os sindicalistas chegou ao Supremo Tribunal Federal. A corte estudou a Carta e decidiu o óbvio: se os frentistas quisessem se desprender do sindicato generalista, onde até os gerentes se faziam representar, para fundar um outro só para eles, nenhum problema.

Os sindicalistas da Força entraram com um pedido de reconsideração no Ministério do Trabalho. A Consultoria Jurídica foi chamada e respondeu positivamente. Usou o argumento vencedor do Supremo, de que os frentistas podiam se desprender do antigo sindicato e formar um novo, exclusivo para eles.

A impugnação foi levantada num processo rápido, entre os dias 2 de outubro e 5 de novembro. O despacho de Lupi concedendo o registro sindical saiu no Diário Oficial da União do dia 6 de novembro — um dia depois da solenidade na DRT do Rio.

Frentistas
A malandragem, porém, apareceu no texto do próprio despacho. Nele, o ministro do Trabalho e Emprego, no uso de suas devidas atribuições legais, concede o registro para que o novo sindicato represente “a categoria profissional dos empregados em postos de serviços de combustíveis (...) que exerçam a função de: frentista diurno e noturno, gerente, caixa, pessoal de escritório, lavador, valeteiro, enxugador, lubrificador, encarregado, chefe de pista, borracheiro, recepcionista, vendedor de loja de conveniência, promotor de vendas, faxineiro e todos os que prestam qualquer tipo de serviços em postos de serviços de combustíveis e derivados de petróleo no Estado do Rio de Janeiro”. Ou seja, fica claro que não se tratava apenas dos frentistas, como são conhecidos os atendentes dos postos. Há mais.

No mesmo despacho, Lupi manda que toda essa gama de classes trabalhistas sejam excluídas da representação do outro sindicato, Sitramico-RJ, mais antigo, filiado à CUT. Não sabia ele que este sindicato cutista, desde agosto de 2005, representava os funcionários dos postos amparados por uma liminar expedida pelo juiz Ávaro Borges de Faria, da 37ª Vara da Justiça do Trabalho do Rio. Na época, a Justiça foi provocada justamente porque o pessoal da Força tentava abrir negociações salariais com os patrões passando por cima do Sitramico. Até o fechamento desta edição, a liminar vigorava sem qualquer restrição.

6 DE NOVEMBRO DE 2007
Foi a data em que foi publicado, no Diário Oficial, o registro do Sindicato dos Empregados em Postos de Serviços de Combustíveis e Derivados de Petróleo do Estado do Rio de Janeiro (Sinpospetro)

No primeiro documento, o registro sindical concedido pelo ministério do Trabalho ao sinpospetro, ligado à força sindical. No outro, liminar favorável a sindicato atrelado à cut

O Lupi (Carlos Lupi, ministro do Trabalho) nem sabe dessas coisas. Quem faz tudo é o Medeiros

Paulo Pereira da Silva, deputado, referindo-se ao secretário de Relações do Trabalho, Luiz Antônio Medeiros

Princípio da liberdade
O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, disse, em comunicado, que jamais teve conhecimento da liminar que amparava a representatividade do outro sindicato e repetiu o argumento de que apenas seguiu o entendimento do Supremo e o princípio da liberdade sindical, estabelecido pela Constituição. E negou ter praticado qualquer ação que tenha favorecido a Força Sindical.

O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, deputado pelo PDT-SP, creditou as denúncias a “brigas de base”. “O Lupi nem sabe dessas coisas. Quem faz tudo é o Medeiros”, disse, referindo-se ao secretário de Relações do Trabalho, Luiz Antônio Medeiros, ex-presidente da Força Sindical.

Presidente da Federação Nacional dos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo, o cutista Raimundo Miquilino diz ter mandado ofícios sobre os acontecimentos à Casa Civil. O presidente da Federação Nacional dos Frentistas, Antônio Sobrinho, não respondeu aos chamados. O presidente do Sinpospetro, Eusébio Luiz Neto, não foi encontrado.

Há 15 dias, a Comissão de Ética Pública da Presidência recomendou a demissão de Lupi por considerar que o acúmulo de cargo de ministro com o de presidente do PDT fere a prevalência dos interesses públicos.

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